TSE discute se faz sentido fraude à cota de gênero eliminar eleição de mulheres

O Tribunal Superior Eleitoral vai decidir se, em casos excepcionais, é possível manter a eleição de mulheres para cargos proporcionais mesmo quando a chapa composta por elas teve candidaturas femininas fictícias.

A proposta foi feita pelo ministro Floriano de Azevedo Marques, em voto-vista sobre um caso registrado na cidade de Granjeiro (CE). O julgamento foi interrompido por novo pedido de vista, desta vez da ministra Cármen Lúcia.

A ideia apresentada vai de encontro à jurisprudência pacífica do TSE, no sentido de que a ocorrência da fraude à cota de gênero deve levar à cassação de toda a chapa, com a anulação dos votos das legendas envolvidas e recálculo do quociente eleitoral.

Como mostrou a revista eletrônica Consultor Jurídico, essa orientação prevaleceu inclusive nos casos em que a cassação da chapa teve com consequência a perda de mandato de mulheres muito bem votadas.

Relator, o ministro Andre Ramos Tavares votou de acordo com a jurisprudência. O distinguishing (distinção) proposto decorre do fato de que, em Granjeiro, isso vai derrubar a única mulher eleita para a Câmara de Vereadores. E ela será substituída por um homem.

Uma eleita

Em Granjeiro, apenas dois partidos tiveram candidatos para vereador em 2020. O PSDB cumpriu a cota de gênero e destinou 30% de sua lista para mulheres, mas não elegeu nenhuma.

Já o Republicanos usou duas candidatas-laranja, que tiveram votação zerada. Por outro lado, elegeu uma mulher: a segunda mais bem votada, a única a integrar a Câmara dos Vereadores, Renagila Viana.

Sozinha, ela recebeu 400 votos, que representam 64,6% de todos os votos dados a mulheres na pequena cidade cearense em 2020. Desde então, ela vem atuando ao lado de oito outros homens eleitos.

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No voto-vista, o ministro Floriano de Azevedo Marques observou que não há qualquer indício de que Renagila tenha se envolvido na fraude à cota de gênero. Para ele, não faz sentido ela perder o mandato.

Assim, cassar o registro de sua candidatura significará decidir contra o objetivo da cota de gênero instituída na lei eleitoral. “Em suma, se estará incrementando um maior desequilíbrio na representação feminina”, disse.

Modulação

A proposta do ministro Floriano é de modular os efeitos do julgamento do TSE, de modo a anular apenas parcialmente os votos da legenda.

Nesse caso, os votos destinados aos homens do Republicanos são anulados. Já os votos das mulheres seguem válidos. Isso é possível porque nenhuma das candidatas laranjas obteve sequer um voto — nem delas próprias.

Com a anulação parcial, o quociente eleitoral precisará ser recalculado, o que não será suficiente para afastar a eleição de Renaglia Viana.

Reflexão

A ministra Cármen Lúcia pediu vista, já destacando que, em outros casos, foi absolutamente contra relativizar a aplicação da lei. O ministro Alexandre de Moraes pediu a palavra para sugerir uma reflexão dos colegas.

Para ele, não há por que se falar em cota de gênero se o TSE vai permitir qualquer tipo de relativização das fraudes que acabam deturpando e prejudicando o entendimento global que existe sobre cota de gênero.

“Se nós formos permitir que os fins justifiquem os meios, vamos retornar ao que era antes, em que tínhamos 30% de mulheres, mas só 5% do fundo partidário destinado para uma única mulher, geralmente parente do dirigente, mulher do deputado, filha do senador”, disse.

“Não podemos dar o recado de que basta apostar em uma mulher: se ela for eleita, todas as outras podem nem participar da eleição”, continuou. E deu o exemplo de São Paulo, onde os partidos podem lançar até 71 candidatos para a Câmara.

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Assim, para cumprir a cota, seriam preciso 22 mulheres. Se essa posição prevalecer, bastará escolher uma e despejar nela todo o dinheiro destinado às mulheres. Ela vai se eleger. As outras 21 candidaturas poderão ser fictícias, sem consequências. “Aí não precisa respeitar a cota nunca mais.”

Respe 0600003-05.2021.6.06.0062

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