Abordagens inovadoras de mediação indoor e outdoor na administração pública

A administração pública cada vez mais tem se comportado como destinatária das políticas públicas que incentivam a promoção da cultura de mediação, por meio do exercício da consensualidade nas práticas administrativas.

Os gestores vêm entendendo que a administração pública pode adotar metodologias dialógicas, tanto internamente (indoor) quanto externamente (outdoor). Isso mostra uma visão alinhada com abordagens mais atualizadas de gestão pública, que buscam resolver conflitos enfrentados na atividade administrativa de forma colaborativa e eficiente.

A aplicação da cultura de mediação indoor [1] é aquela entendida como realizada dentro da administração pública, ou seja, visa a resolver conflitos internos e promover o diálogo entre órgãos e agentes em busca de soluções, incentivando a participação dos envolvidos nesse percurso.

Um exemplo de mediação indoor seria de um conflito entre duas secretarias de Estado que divergem sobre as competências internas para a elaboração de um determinado projeto. Em vez de se ressentirem com o conflito interno com escaladas hierárquicas que poderiam culminar no abandono do projeto, os envolvidos optam por uma abordagem indoor.

Já a cultura de mediação outdoor é a que busca promover a consensualidade nas relações com o cidadão, ou seja, na perspectiva das relações externas.

Sugestões do cidadão ao poder público

Um caso bastante promissor seria aquele em que o cidadão pode levar suas sugestões e pleitos diretamente ao poder público, participando da proposição de soluções potenciais para os desafios enfrentados. Ao invés de negar o pedido ou deixar o cidadão sem uma resposta, o gestor vai além, convidando o proponente para auxiliar na construção de soluções que atendam a demanda apresentada, dando vida aos direitos e não simplesmente reproduzindo a cultura que obstrui o diálogo e incentiva a judicialização.

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A prática da cultura de mediação dentro da administração (indoor) pode favorecer a cultura de mediação fora da administração (outdoor), trazendo vantagens qualitativas no trato com o cidadão, uma abordagem diferente de negar direitos. As duas perspectivas trazem diversas vantagens, se comparadas com a metodologia tradicional de resolver conflitos, representada pelo processo judicial: desde economicidade até a harmonização das relações.

A implementação da cultura de mediação indoor e outdoor no poder público pode contribuir para uma mudança estrutural nas rotinas administrativas, revisitando as relações internas e externas e promovendo valores como empatia, transparência, colaboração e responsabilidade e promovendo, portanto, o diálogo e participação ativa dos envolvidos.

Aumentar a capacidade da administração pública de se beneficiar dessa cultura envolve treinamento e capacitação. Mas não só. É preciso um trabalho interno e externo de escuta ativa, de revisão crítica e reflexiva de práticas, desde as relações entre seus próprios agentes até o trato com o cidadão. É preciso, portanto, ir além da mera atualização da legislação.

Explorar essa cultura é um desafio e enfrenta diversas resistências, mas é essencial para promover uma sociedade mais harmoniosa e participativa, em que os cidadãos não se sintam meros “administrados” [2] pelo poder público, mas sujeitos ativos com voz, que têm seus problemas e desafios reconhecidos.

O enfoque permite que as pessoas expressem suas preocupações e interesses de forma a chegar a consensos dialogados, evitando-se, assim, disputas desnecessárias e promovendo um ambiente público mais harmonioso e participativo.

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Referências

BUCCI, Maria Paula Dallari. Direito Administrativo e Políticas Públicas. São Paulo: Saraiva, 2002.

GOULART, Juliana Ribeiro. Cultura de mediação na Administração Pública: uma abordagem para o apoio a gestantes e lactantes no serviço público. Tese (Doutorado) – Universidade Federal de Santa Catarina, Centro de Ciências Jurídicas, Programa de Pós-Graduação em Direito. Florianópolis, 2023.

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TORREMORELL, Maria Carme Boqué. Cultura de Mediação e Mudança Social. Porto: Porto Editora. 2008.


[1] Expressão sugerida por Alexandre Morais da Rosa ao se referir à cultura interna e externa da Administração Pública, a qual desenvolvi em minha tese de doutorado (Goulart, 2023).

[2] O termo “administrado” pode transmitir a equivocada ideia de um sujeito guiado pela vontade estatal, sugerindo uma relação de submissão. Maria Paula Dallari Bucci afirma que não há dificuldade em nomear a autoridade, utilizando os termos “Administração Pública” ou “Estado” no sentido de governo. Contudo, para designar o outro polo, os termos “administrados” ou “particulares” são mais frequentemente empregados. Nas palavras da autora: “o primeiro denota sujeição, a condição de passividade de quem não está inscrito no círculo de autoridade, e o segundo enfatiza o aspecto patrimonial, pois é público ou particular o patrimônio de alguém, aqui amplamente considerado no sentido dado por Locke, da propriedade como englobando a liberdade, os direitos e bens de alguém” (Bucci, 2002, p. 114-115).

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