Estabilidade econômica, inflação controlada, melhora no ambiente de negócios e retomada do crescimento do Produto Interno Bruto. Esses são alguns dos fatores que contribuíram para o aumento das operações de fusões e aquisições no Brasil em 2024, criando um cenário favorável para investimentos, de acordo com os resultados da pesquisa Fusões e Aquisições 2024, conduzida pela KPMG, uma das quatro maiores empresas de auditoria do mundo.
Depois de dois anos consecutivos em queda, o mercado apresentou aumento de 5% na quantidade de fusões e aquisições. Em números absolutos, foram 1.582 operações em 2024, contra 1.505 em 2023. “Os dados evidenciam uma retomada importante no mercado de fusões e aquisições. O número de 2024 superou 2023 e, apesar de ser inferior ao de 2022 e 2021, já é superior aos totais registrados em 2000 e demais anos anteriores de nossa série histórica”, explicou, no documento da pesquisa, Gustavo Vilela, sócio-líder de Fusões e Aquisições da KPMG no Brasil.
Das operações de 2024, 981 foram domésticas e 601 envolveram estrangeiros. Entidades dos Estados Unidos responderam por 259 operações, atingindo 43% do total com estrangeiros. Outros 30% estão divididos entre organizações do Canadá, Reino Unido, Espanha, Argentina, México, Alemanha e Colômbia. Tecnologia da informação figura no primeiro lugar do ranking, seguida por instituições financeiras, companhias energéticas e imobiliárias.
Paulo Guilherme Coimbra, sócio da área de Fusões e Aquisições da KPMG, entende que a tendência de crescimento se deve, em parte, à estabilidade econômica observada no primeiro semestre de 2024. “A digitalização e a inovação tecnológica continuaram a ser grandes impulsionadoras dessas transações, e o setor de energia renovável atraiu consideráveis investimentos, confirmando a relevância do setor”, explica no documento. “Embora os números sejam positivos, o aumento da taxa de juros e incertezas fiscais e políticas podem ter reduzido os resultados alcançados no segundo semestre”, destacou.

De acordo com o advogado Marco Antonio Fonseca, do Demarest Advogados, o mercado tem refletido os movimentos típicos de ciclos econômicos e de confiança empresarial, que oscilam a depender do cenário geopolítico. “O crescimento observado em 2024 foi resultado de fatores, como maior estabilidade econômica, redução de incertezas regulatórias e retomada de investimentos em setores estratégicos”, disse em entrevista ao Anuário da Justiça.
Em 2025, a Pesquisa Fusões e Aquisições da KPMG mostrou uma queda de 5% na quantidade de operações no primeiro semestre do ano, se comparado com o mesmo período de 2024. Foram 739 operações em 2025 contra 776 em 2024. “A retração no primeiro semestre de 2025 parece estar ligada a uma conjuntura mais cautelosa, marcada por juros ainda elevados, volatilidade cambial e desenvolvimento em política nacional e internacional que afetam diretamente o ambiente de negócios”, explica Fonseca. “Essa oscilação não é incomum em mercados emergentes, especialmente em períodos de transição econômica. A expectativa para o segundo semestre é de uma retomada gradual, impulsionada por operações estratégicas em setores como tecnologia, energia e saúde, além do interesse contínuo de investidores estrangeiros em ativos brasileiros”, avaliou.
O advogado Rodrigo Figueiredo Nascimento, sócio de Societário do escritório Mattos Filho, destacou, em entrevista ao Anuário, que “apesar de 2025 ser um ano delicado para previsões, o mercado de F&A parece estar mais parecido com 2022, do que com 2023 ou 2024, e estamos conservadoramente otimistas com a expectativa de que o mercado se mantenha razoavelmente aquecido até o final de 2025”. Entre os impactos e riscos desse mercado em 2025, listou, “de maneira geral, imprevisibilidade e insegurança jurídica são fatores que sempre pesam no nível de atividade das operações de F&A”.
O crescente número de fusões e aquisições também se refletiu no Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), autarquia responsável por garantir a livre concorrência no Brasil. De acordo com a Lei 12.529/2011, é obrigatória a notificação ao Cade quando uma empresa tem faturamento de R$ 750 milhões ou mais e a outra de, no mínimo, R$ 75 milhões para efetivar o ato de concentração. Em 2024, foram 712 operações notificadas, um aumento de quase 20% se comparado com 2023 (594 operações).
Segundo o presidente interino do Cade, Gustavo Augusto Freitas de Lima, uma das vantagens de uma fusão é que as empresas, quando se juntam, conseguem reduzir o preço continuamente, além de obter uma estrutura mais eficiente, com mais escala e mais consumidor. “Normalmente, as empresas somam o que é forte em uma com o que é forte em outra e conseguem ter um negócio melhor”, explicou. “Porque, então, não juntam todas as empresas de uma vez? Porque quanto mais concentração se tem, menor o incentivo de ser competitiva. Então, ela se torna mais eficiente quando junta, mas quando ela passa a não ter concorrentes tão fortes, ela tem menos incentivo para cobrar mais barato”, ressaltou.
O presidente do Cade explicou ainda que ter muitos atos de concentração é um movimento saudável, pois revela dinamismo na economia. “O ideal é que se tenha, acontecendo ao mesmo tempo, muitos atos de concentração, muitas entradas e muitas saídas. Se isso acontece é sinal que o mercado é dinâmico”.
Freitas de Lima diz que o mercado brasileiro ainda é muito concentrado, com poucas empresas com grande participação e uma grande informalidade. “A nossa informalidade é a maior do mundo. Isso às vezes dificulta medir realmente quanto que é a nossa concentração, porque a informalidade dificulta obter dados mais precisos. Nós usamos muitas pesquisas de mercado, que não consideram e não tem como considerar um mercado informal”, diz.

Sobre o tarifaço imposto pelo presidente Trump, dos Estados Unidos, o presidente explicou que o Cade ainda está avaliando as consequências totais sobre como isso pode afetar a concorrência no Brasil. “Ainda está cedo para a gente dimensionar. Algum nível de tarifa, algum nível de fechamento, sempre tem. Se não, estamos falando de uma zona economicamente integrada. Ainda estamos tentando entender como será o mundo após o rearranjo comercial dos Estados Unidos”, explicou.
Para o advogado Marco Antonio Fonseca, do Demarest Advogados, o ambiente concorrencial brasileiro está em constante evolução. “A digitalização dos mercados e o crescimento de plataformas digitais tem alterado profundamente as dinâmicas competitivas. O país ainda enfrenta desafios estruturais, como concentração em setores estratégicos e barreiras à entrada, mas há avanços importantes na promoção da livre concorrência”, disse.
A advogada Renata Zuccolo, sócia de Direito Concorrencial do Mattos Filho, entende que o Cade tem exercido um papel importante nas discussões sobre regulação de plataformas digitais: “A grande discussão tem sido em como equilibrar medidas que possam ser implementadas por eventual regulação com a função do Cade de analisar condutas ex-post”, disse ao Anuário. Além disso, destacou que “a grande preocupação é como combater eventuais abusos, sem, contudo, inviabilizar modelos de negócios inovadores”.
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