Os recursos especiais (REsps) e os agravos em recurso especial (AREsps) somados representam cerca de 70% dos processos do Superior Tribunal de Justiça. Numa total inversão de valores, para cada REsp julgado, são apreciados de quatro a cinco AREsps.
Por outras palavras, é quantitativamente mais relevante julgar a admissibilidade do REsp, pela via do AREsp, que julgar o próprio REsp.
O curioso é que, apesar de numerosos, cerca de míseros 4% dos AREsps julgados são exitosos, ou seja, o STJ julga o mérito de cerca de 4% dos REsps inadmitidos na origem — que foram objeto de AREsps.
O AREsp, do artigo 1.042 do CPC, é o recurso cabível contra a decisão do presidente ou do vice-presidente do tribunal de origem, que inadmite o recurso especial, em razão da ausência de um pressuposto recursal, vale dizer, por razões formais.
Apesar de ser interposto no órgão a quo, este não realiza o juízo de admissibilidade do AREsp, razão pela qual o recurso deve ser remetido ao STJ (Súmula 727 do STF, normalmente seguida pelo STJ e algumas vezes mitigada).
No entanto, quando o presidente ou o vice-presidente do tribunal de origem nega seguimento ao REsp em razão da conformidade do acórdão recorrido com entendimento firmado pelo STJ em recursos repetitivos, o recurso cabível é o Agravo Interno (AgInt), do artigo 1.021 do CPC, julgado pelo próprio tribunal a quo, sem que dessa decisão caiba qualquer medida destrancadora do REsp, conforme entendimento majoritário do STJ.
Resumo da ópera: cada vez mais recursos repetitivos são apreciados pelo STJ.
Para que se tenha uma ideia, em 2024 o número de repetitivos julgados foi 34% maior que no ano anterior.
Muitas vezes uma matéria é julgada pela Corte Especial em embargos de divergência, e torna a ser julgada sob o regime dos repetitivos, exclusivamente para que, em situações similares, obstada a subida do REsp, o agravo cabível seja o AgInt (que não sobe), e não o AREsp (que sobe).
Seguindo essa linha, e assumindo posição inovadora, a 1ª Seção do STJ, sob o regime dos repetitivos, aplicou a Súmula 7 a determinada situação (Tema Repetitivo 1.246), criando uma espécie de inadmissibilidade vinculante ou obstativa de recursos especiais, ou, na feliz expressão do amigo Vinicius Lemos, “tema obstativo de recurso”.
A decisão é reveladora do esforço do STJ para diminuir o número de AREsps.
Qual STJ queremos?
As consequências do excessivo número de recursos, especialmente de AREsps, são variadas:
priorização da gestão do acervo à adequada formação de precedentes vinculantes — prova disso é o entendimento de que não cabe reclamação para garantir a observância de entendimento firmado em repetitivos; desproporcional número de decisões monocráticas; chama que não se apaga da jurisprudência defensiva; além da contribuição para a falta de padrões decisórios.
E de quem é a culpa? De ninguém. A raiz do problema está no bem intencionado transporte do writ of error americano para uma federação que nasceu estado unitário, cuja legislação federal disciplina quase tudo e cresce a cada ano, especialmente depois da CF de 1988.
Cabe ao Congresso Nacional regulamentar a relevância da questão federal, criada pela EC 125. Portanto, é a sociedade, legitimamente representada pelo processo político majoritário, que precisa fazer uma escolha: qual STJ ela quer?
Uma coisa é certa: there is no free lunch.
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