Primeira Seção revisa tese sobre tarifa de água e esgoto em condomínios com hidrômetro único

A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) revisou a tese fixada em 2010 no Tema 414 dos recursos repetitivos, relativa à forma de cálculo da tarifa de água e esgoto em condomínios com hidrômetro único.

Foram estabelecidas as seguintes teses:

1. Nos condomínios formados por múltiplas unidades de consumo (economias) e um único hidrômetro, é lícita a adoção de metodologia de cálculo da tarifa devida pela prestação dos serviços de saneamento por meio da exigência de uma parcela fixa (“tarifa mínima”), concebida sob a forma de franquia de consumo devida por cada uma das unidades consumidoras (economias); bem como por meio de uma segunda parcela, variável e eventual, exigida apenas se o consumo real aferido pelo medidor único do condomínio exceder a franquia de consumo de todas as unidades conjuntamente consideradas.

2. Nos condomínios formados por múltiplas unidades de consumo (economias) e um único hidrômetro, é ilegal a adoção de metodologia de cálculo da tarifa devida pela prestação dos serviços de saneamento que, utilizando-se apenas do consumo real global, considere o condomínio como uma única unidade de consumo (uma única economia).

3. Nos condomínios formados por múltiplas unidades de consumo (economias) e um único hidrômetro, é ilegal a adoção de metodologia de cálculo da tarifa devida pela prestação dos serviços de saneamento que, a partir de um hibridismo de regras e conceitos, dispense cada unidade de consumo do condomínio da tarifa mínima exigida a título de franquia de consumo.

Tese anterior não estabilizou relação entre concessionárias e condomínios

Em 2010, ao julgar o Tema 414, o STJ definiu que não seria lícita a cobrança de tarifa no valor do consumo mínimo multiplicado pelo número de economias existentes no imóvel, devendo a cobrança ser feita pelo consumo real aferido. O relator, ministro Paulo Sérgio Domingues, comentou que essa tese não foi suficiente para estabilizar as relações entre as concessionárias e os condomínios, o que motivou o tribunal a revisar o assunto, inclusive convocando uma audiência pública.

Segundo o ministro, o modelo de prestação do serviço foi legalmente estruturado para que a tarifa tenha uma parcela fixa, concebida como uma franquia de consumo e que remunera a prestadora pelo serviço essencial colocado à disposição do consumidor; e uma parcela variável, cobrada de acordo com o consumo real aferido pelo medidor que exceda à franquia legalmente estabelecida.

Para Paulo Sérgio Domingues, a metodologia do consumo real global – na qual o condomínio é considerado uma única unidade de consumo – e a do consumo real fracionado – modelo híbrido – não atendem aos fatores e às diretrizes de estruturação da tarifa previstos nos artigos 29 e 30 da Lei 11.445/2007, criando assimetrias no modelo legal de regulação da prestação dos serviços.

Na avaliação do ministro, devem ser superados os fundamentos anteriormente adotados no Tema 414, contrários à metodologia do consumo individual franqueado, a qual encontra forte amparo legal.

“Esse modelo de tarifação coloca em plano de igualdade todos os usuários dos serviços de saneamento, sejam eles consumidores individuais, condomínios dotados de múltiplos medidores de consumo, ou condomínios equipados com um único hidrômetro, cobrando-se de todos, pelos custos de disponibilização dos serviços, uma mesma contraprestação (a parcela fixa da tarifa, equivalente a uma franquia de consumo), a fim de assegurar às prestadoras receitas recorrentes necessárias aos ganhos de qualidade e eficiência que, ao fim e ao cabo, repercutirão em termos de menores acréscimos tarifários para todos os usuários”, concluiu.

Modulação dos efeitos da decisão

O colegiado acompanhou a modulação dos efeitos do julgamento proposta pelo relator, de modo a considerar lícito às concessionárias modificar o método de cálculo da tarifa nos casos em que, por conta de ação revisional ajuizada por condomínio, esteja sendo adotado o “modelo híbrido”. No entanto, não poderão ser cobradas dos condomínios quaisquer diferenças decorrentes da adoção do “modelo híbrido”.

O relator observou que, nos casos em que a prestadora tenha calculado a tarifa devida pelos condomínios com medidor único tomando-os como um único usuário (uma economia apenas), há o dever de modificar o método de cálculo da tarifa. Para o ministro, entretanto, mantém-se o direito de o condomínio ser ressarcido pelos valores pagos a mais, podendo essa restituição ser feita por meio de compensação nas parcelas vincendas da própria tarifa devida.

Nessa hipótese, ponderou Domingues, deve ser afastado o pagamento em dobro previsto no artigo 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor (CDC), em razão da dinâmica da evolução jurisprudencial.

Leia o acórdão no REsp 1.937.887.

Fonte: STJ

Relator do repetitivo que discute penhora de bem de família dado em garantia abre prazo para amici curiae

O ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Antonio Carlos Ferreira determinou a abertura de prazo de 15 dias úteis (a contar da publicação desta notícia) para a manifestação de eventuais amici curiae no Tema 1.261 dos recursos repetitivos.

Nesse tema, discute-se a necessidade de comprovação de que o proveito se reverteu em benefício da família, na hipótese de penhora de imóvel residencial oferecido como garantia real, em favor de terceiros, pelo casal ou pela entidade familiar, nos termos do artigo 3º, V, da Lei 8.009/1990. Discute-se ainda a distribuição do ônus da prova nas hipóteses de garantias prestadas em favor de sociedade na qual os proprietários do imóvel têm participação.

Antonio Carlos Ferreira determinou que a Defensoria Pública da União (DPU) e o Grupo de Atuação Estratégica da DPU nos Tribunais Superiores (GAET) sejam intimados da abertura de prazo para a manifestação de amici curiae.

A sessão virtual da Segunda Seção que afetou o tema repetitivo foi iniciada em 15/5/2024 e finalizada em 21/5/2024. No acórdão de afetação, o ministro lembrou que o STJ já fixou orientação uniforme sobre a matéria (EAREsp 848.498), mas os tribunais ordinários seguem adotando interpretações distintas, o que vem causando o aumento de recursos direcionados à corte.

“Para a racionalização da tramitação dos recursos afetados, a instrução do presente tema será concentrada nos presentes autos, permanecendo suspenso o REsp 2.093.929, nada obstando, contudo, que os amici curiae, em suas manifestações, abordem as circunstâncias específicas de cada um dos demais recursos afetados”, registrou Antonio Carlos Ferreira no despacho.

Recursos repetitivos geram economia de tempo e segurança jurídica

O Código de Processo Civil regula, nos artigos 1.036 e seguintes, o julgamento por amostragem, mediante a seleção de recursos especiais que tenham controvérsias idênticas. Ao afetar um processo, ou seja, encaminhá-lo para julgamento sob o rito dos repetitivos, os ministros facilitam a solução de demandas que se repetem nos tribunais brasileiros.

A possibilidade de aplicar o mesmo entendimento jurídico a diversos processos gera economia de tempo e segurança jurídica. No site do STJ, é possível acessar todos os temas afetados, bem como saber a abrangência das decisões de sobrestamento e as teses jurídicas firmadas nos julgamentos, entre outras informações.

Fonte: STJ

Processo na ARP: conheça a função da Assessoria de Admissibilidade, Recursos Repetitivos e Relevância do STJ

Depois de verem seu processo chegar ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), muitos advogados podem estranhar que os autos não sejam distribuídos diretamente ao ministro relator, mas, em vez disso, sejam encaminhados à Assessoria de Admissibilidade, Recursos Repetitivos e Relevância (ARP). Afinal, o que faz esse departamento que vez ou outra aparece no andamento processual?

Criada em 2007 com o nome de Núcleo de Agravos da Presidência (Napre), a ARP é o órgão vinculado à Presidência do STJ que, na função de assessoramento, elabora minutas de decisões e despachos nos processos originários e recursais ainda não distribuídos.

Antes mesmo da distribuição do processo ao relator, a ARP auxilia a Presidência no cumprimento de uma série de atribuições previstas no artigo 21-E do Regimento Interno do STJ, entre elas:

a) analisar pedidos de desistência, autocomposição e habilitação em razão de falecimento de uma das partes;

b) decidir pedido de gratuidade de justiça;

c) determinar o cancelamento do registro do feito se a parte, após intimação, não realizar o pagamento das custas e despesas processuais;

d) apreciar habeas corpus e revisões criminais inadmissíveis por incompetência manifesta, enviando os autos ao juízo competente; e

e) não conhecer de recurso inadmissível, prejudicado ou que não apresentar impugnação específica aos fundamentos da decisão recorrida.

ARP não analisa mérito de processos

No âmbito da ARP, não há análise de mérito dos processos: a função principal da unidade é verificar a admissibilidade dos casos que aportam no STJ. 

Conforme explica o assessor-chefe da ARP, Rodrigo Duarte Campos, essa análise de admissibilidade, na verdade, tem início na Seção de Triagem de Pressupostos Recursais, vinculada à Secretaria Judiciária. Nessa fase, os recursos especiais que cumpram os requisitos de admissibilidade (como tempestividade, existência de procuração, exaurimento da instância anterior e preparo recursal) são distribuídos aos relatores. Já os agravos em recurso especial, ainda que preencham esses requisitos, são registrados à Presidência e remetidos à ARP para verificação.

Ainda de acordo com Rodrigo Campos, uma dúvida recorrente entre os operadores do direito é sobre o envio à Presidência (e, por consequência, à ARP) de um processo que, devido ao instituto da prevenção, deveria ser atribuído ao ministro do STJ que já tomou conhecimento daquela causa. Contudo, o assessor-chefe da ARP explica que a prevenção é analisada apenas se o processo supera a fase de admissibilidade.

Rodrigo Campos informa que os agravos em recurso especial (AREsps) constituem a classe processual mais analisada pela ARP, porém outras classes também podem ser objeto de exame na unidade, como recursos especiais (REsps), embargos de divergência em recurso especial (EREsps) e em agravo em recurso especial (EAREsp), recursos em mandado de segurança (RMSs) e habeas corpus (HCs). No caso dos HCs, explica Campos, a análise da ARP é restrita às hipóteses de aplicação da Súmula 691 do Supremo Tribunal Federal (STF) e de algumas matérias específicas de execução penal.

Pressupostos, admissibilidade cotejada e suficiência: os filtros da ARP

Para análise dos REsps e AREsps que chegam via Presidência, a ARP desenvolveu uma série de filtros e protocolos, baseados principalmente na legislação e na jurisprudência.

Em relação aos filtros, os AREsps submetidos à unidade passam, conforme o caso, por três fases: a) pressupostos objetivos; b) admissibilidade cotejada; c) suficiência. São filtros sucessivos, ou seja, o processo só é examinado sob o filtro seguinte se ultrapassar a etapa anterior.

Caso o processo ultrapasse essas três etapas, a Presidência do STJ determina a sua distribuição. O regimento interno também prevê a distribuição quando a parte apresenta recurso (agravo interno) contra a decisão da Presidência nas hipóteses do artigo 21-E e não há retratação.

Conforme ressalta o assessor-chefe da ARP, os filtros se destinam apenas às classes processuais REsp e AREsp. As demais classes analisadas na ARP não passam por esses três filtros porque têm critérios próprios de admissibilidade.

Mais de 95% das decisões da Presidência com origem na ARP são mantidas

A efetividade dos procedimentos adotados pela ARP é demonstrada pelas estatísticas mais recentes da unidade: entre janeiro e dezembro de 2023, nos casos em que houve recurso contra decisão da Presidência baseada em análise da ARP, a taxa de provimento foi de apenas 4,54%, ou seja, mais de 95% dos julgados da Presidência foram mantidos.

Saiba o significado de termos publicados nesta notícia:

  • 1º termo – Repetitivos: Recurso repetitivo é um recurso escolhido para ser julgado como representativo de uma questão jurídica presente em muitos outros processos, para que a tese fixada pelo tribunal seja aplicada na solução dos casos semelhantes em todo o país.
  • 2º termo – Intimação: A comunicação escrita para dar ciência de atos e termos de um processo.
  • 3º termo – Habeas Corpus: Habeas corpus (sigla HC) é uma ação para assegurar a liberdade de locomoção, quando violada ou ameaçada de violação por ilegalidade ou abuso de poder. Também é o nome da ordem dada pela Justiça para corrigir a ilegalidade.
  • 4º termo – Incompetência: Falta de capacidade legal para julgar um processo ou tomar uma decisão.
  • 5º termo – Não conhecer: Ao “não conhecer” do recurso (ou de qualquer pedido), o tribunal está decidindo, por alguma razão preliminar, que ele não será admitido para o exame do mérito. Assim, o tribunal deixa de analisar os argumentos do recorrente, sem acolher nem rejeitá-los.
  • 6º termo – Prejudicado: Recurso que perdeu seu objeto, que não é mais julgado.
  • 7º termo – Mérito: A questão principal (ou o conjunto das questões principais) do processo, na qual se baseia o pedido do autor.
  • 8º termo – recursos especiais: O recurso especial (sigla REsp) é dirigido ao STJ para contestar possível má aplicação da lei federal por um tribunal de segundo grau. Assim, o REsp serve para que o STJ uniformize a interpretação da legislação federal em todo o país.
  • 9º termo – Preparo: Despesas que compreendem custas processuais e gastos com o envio do processo pelo correio (no caso de processo físico).
  • 10º termo – agravos em recurso especial: Agravo em recurso especial (sigla AREsp) é o recurso contra decisão do presidente ou do vice-presidente do tribunal de origem que não admitiu a subida do recurso especial para o STJ. Seu objetivo é convencer o STJ a aceitar o recurso especial para julgamento do mérito.
  • 11º termo – Prevenção: Concorrendo dois juízes igualmente competentes para um caso, fica prevento, ou seja, responsável pelo caso o primeiro a decidir sobre a matéria.
  • 12º termo – Embargos de divergência: Embargos de divergência são um recurso contra decisão de órgão fracionário que divergiu do entendimento de outro órgão fracionário do mesmo tribunal. No STJ, as siglas são EREsp (embargos de divergência em recurso especial) e EAREsp (embargos de divergência em agravo em recurso especial).
  • 13º termo – Mandado de Segurança: Ação prevista constitucionalmente para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas-corpus ou habeas-data, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do poder público.
  • 14º termo – Agravo interno: Agravo interno (sigla AgInt) é o recurso contra decisão individual do relator no processo civil.
  • 15º termo – Provimento: Ato de prover. Dar provimento a recurso significa acolher o pedido para reformar ou anular decisão judicial anterior. No direito administrativo, é o ato de preencher vaga no serviço público.

Fonte: STJ

Dano moral coletivo: como o STJ interpreta a ofensa que atinge valores de toda a comunidade

Em algumas situações, o ato com potencial de deixar um indivíduo moralmente abalado vai além e atinge a coletividade como um todo. Nesse tipo de violação, pode haver a condenação pelo dano moral coletivo – que é considerado uma categoria autônoma de ressarcimento extrapatrimonial, ou seja, não representa a soma dos danos morais individuais em determinado contexto. O dano coletivo é devido quando há lesão extrapatrimonial à integridade da coletividade, de natureza transindividual.  

Segundo o ministro Luis Felipe Salomão, o reconhecimento desse tipo de dano pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) ocorreu no julgamento do REsp 1.057.274, de relatoria da ministra Eliana Calmon (aposentada), em caso de indevida submissão de idosos a procedimento de cadastramento para o gozo do benefício de passe livre. Nesse recurso especial, o tribunal reconheceu a configuração do dano moral coletivo e considerou desnecessária a comprovação de dor, sofrimento e abalo psicológico, suscetíveis de apreciação na esfera do indivíduo, mas inaplicáveis quando se trata de interesses difusos e coletivos.

“Diferentemente do que ocorre no dano individual, os valores das indenizações por dano moral coletivo não vão para pessoas específicas, mas para fundos ou instituições, de maneira que sejam revertidos em prol da sociedade.

Crianças e adolescentes humilhados em programa de TV

O ministro Salomão relatou recurso no qual o STJ se pronunciou sobre a responsabilidade pelo conteúdo transmitido pelas emissoras de televisão. No julgamento do REsp 1.517.973, os ministros da Quarta Turma condenaram a TV e Rádio Jornal do Commercio Ltda. a pagar dano moral coletivo por humilhar menores em um quadro sobre investigação de paternidade. Para o relator, o programa contribuía para tornar crianças e adolescentes vulneráveis a discriminações e vítimas potenciais de bullying.

Segundo o processo, em um de seus programas, a emissora exibia um quadro chamado “Investigação de Paternidade”, no qual expunha a vida e a intimidade de crianças e adolescentes cuja origem biológica estava em apuração. O apresentador utilizava expressões humilhantes para se referir aos menores e à situação que vivenciavam.

Salomão explicou que a configuração do dano moral coletivo no caso estava relacionada aos “prejuízos causados a toda a sociedade, em virtude da vulnerabilização de crianças e adolescentes, notadamente aqueles que tiveram sua origem biológica devassada e tratada de forma jocosa”.

O ministro disse que o programa, ao expor imagens e nomes dos pais dos menores, “tornou-os vulneráveis a toda sorte de discriminações, ferindo o comando constitucional que impõe a todos (família, sociedade, Estado) o dever de lhes assegurar, com absoluta prioridade, o direito à dignidade e ao respeito e de colocá-los a salvo de toda forma de discriminação, violência, crueldade ou opressão (artigo 227 da Constituição da República)”.

Filmes exibidos fora do horário recomendado pelo Ministério da Justiça

Já no julgamento do REsp 1.840.463, a Terceira Turma negou pedido de fixação de danos morais coletivos contra a Rádio e Televisão Bandeirantes S/A por causa da exibição de filmes não recomendados para menores de 18 anos em horário diverso do indicado pelo Ministério da Justiça.

Para o colegiado, esse tipo de condenação é possível diante de abusos e violações do direito à programação sadia, desde que a conduta afronte de forma clara valores e interesses coletivos fundamentais.

Entre 2006 e 2007, a emissora exibiu quatro filmes fora do horário indicado. Um deles, não recomendado para menores de 18 anos, passou às 22h15, quando, de acordo com o ministério, programas com essa classificação só deveriam ser exibidos a partir das 23h.

O relator do caso, ministro Marco Aurélio Bellizze, mencionou que, segundo o Supremo Tribunal Federal (STF), a classificação indicativa não é obrigatória nem caracteriza censura prévia dos conteúdos veiculados em rádio e TV, mas tem a função pedagógica de ajudar os pais na definição do que é adequado para seus filhos.

No caso em julgamento, o relator verificou que a conduta da TV Bandeirantes, apesar de irregular, “não foi capaz de abalar de forma intolerável a tranquilidade social dos telespectadores, bem como seus valores e interesses fundamentais”.

Tratamento inadequado a idosos e gestantes merece punição pedagógica

A falta de tratamento adequado às pessoas que têm direito a atendimento bancário com prioridade pode levar à condenação por dano moral coletivo. Esse foi o entendimento da Terceira Turma ao julgar o REsp 1.221.756. O colegiado confirmou a decisão de segunda instância que impôs a um banco a obrigação de instalar caixa para atendimento de idosos, gestantes e pessoas com deficiência no andar térreo, além de pagar indenização de R$ 50 mil como reparação de danos morais coletivos.

O banco foi alvo de ação civil pública proposta pelo Ministério Público do Rio de Janeiro porque, em uma agência de Cabo Frio (RJ), as pessoas com prioridade precisavam subir três lances de escada, no total de 23 degraus, para serem atendidas no caixa especial. O MP considerou essa circunstância vexatória e degradante para os cidadãos com necessidades especiais.

Na avaliação do relator do caso no STJ, ministro Massami Uyeda (aposentado), era incontestável a ocorrência de dano moral coletivo, apto a gerar indenização. “Não é razoável submeter aqueles que já possuem dificuldades de locomoção, seja pela idade, seja por deficiência física ou por causa transitória, como as gestantes, à situação desgastante de subir escadas, exatos 23 degraus, em agência bancária que, diga-se, possui plena capacidade e condições de propiciar melhor forma de atendimento – que, curiosamente, é chamado de prioritário”, disse o relator.

O ministro comentou que, nessas situações, a indenização por dano moral coletivo serve não apenas como reparação, mas também como uma “pedagógica punição”.

Simples exagero em propaganda não ofende valores sociais

No julgamento do REsp 1.370.677, a Quarta Turma afastou uma condenação por dano moral coletivo decorrente de campanha publicitária de ar-condicionado. Para os ministros, ao descrever o aparelho como “silencioso”, a propaganda incorreu no chamado puffing – técnica publicitária que utiliza o exagero para enaltecer certa característica do produto em comparação com outros.

“Dizer ser o aparelho silencioso, nas condições tecnológicas da época, em que os condicionadores de ar de gerações anteriores produziam mais ruído, era mero exagero publicitário comparativo”, observou o relator do caso, ministro Raul Araújo.

O recurso no STJ teve origem em ação ajuizada pelo Ministério Público Federal (MPF). Tanto o juízo de primeiro grau quanto o Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3) concluíram que a campanha teria iludido os consumidores ao atribuir uma característica inexistente ao aparelho.

No entanto, Raul Araújo afirmou que a propaganda de condicionadores de ar costuma ter razoável conteúdo comparativo e se dirige a um público que é capaz de compreender o exagero na apresentação de alguma característica.

“Em tal contexto, não se pode entrever a ocorrência de danos morais coletivos, que ficam adstritos às hipóteses em que configurada grave ofensa à moralidade pública, sob pena de sua banalização”, concluiu o ministro.

Indenização por desmatamento na região amazônica

A Segunda Turma deu provimento ao REsp 1.989.778, no qual o Ministério Público de Mato Grosso pedia o reconhecimento de dano moral coletivo resultante da derrubada de floresta nativa na região amazônica, que deveria ser preservada. O colegiado aplicou a jurisprudência segundo a qual a lesão ao meio ambiente gera dano moral in re ipsa, ou seja, que dispensa a demonstração de prejuízos.

“A Justiça local condenou o responsável a pagar danos materiais, bem como a recompor o meio ambiente e a se abster de desmatar outras áreas. Para o Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT), a condenação por danos morais coletivos não seria possível, pois isso exigiria que o fato transgressor fosse de “razoável significância” e excedesse “os limites da tolerabilidade”.

A relatora do caso no STJ, ministra Assusete Magalhães (aposentada), afirmou que a própria corte estadual reconheceu ter havido “desmatamento e exploração madeireira sem a indispensável licença ou autorização do órgão ambiental competente”, conduta que “tem ocasionado danos ambientais no local, comprometendo a qualidade do meio ambiente ecologicamente equilibrado”.

A ministra destacou que, uma vez constatado o dano ambiental, incide a Súmula 629 do STJ. “Trata-se de entendimento consolidado que, ao amparo do artigo 225, parágrafo 3º, da Constituição Federal e do artigo 14, parágrafo 1º, da Lei 6.938/1981, reconhece a necessidade de reparação integral da lesão causada ao meio ambiente, permitindo a cumulação das obrigações de fazer, de não fazer e de indenizar, inclusive quanto aos danos morais coletivos”, declarou a magistrada.

Cabimento do dano moral coletivo no processo penal

A condenação ao pagamento de indenização por danos morais coletivos também é cabível em processos de direito penal, nos termos do artigo 387, inciso IV, do Código de Processo Penal (CPP). Esse entendimento foi estabelecido pela Quinta Turma no julgamento do REsp 2.018.442.

Leia também: Quinta Turma admite fixação de indenização por dano moral coletivo no processo penal

Os ministros acolheram parcialmente um recurso especial do MPF para determinar que o Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF2) retomasse o julgamento da apelação em um processo decorrente da Operação Armadeira – que apurou esquema de fraude em fiscalizações da Receita Federal –, para examinar se houve dano moral coletivo.

No processo, um empresário teve contas bancárias bloqueadas para garantir o pagamento de eventuais danos materiais, estimados em R$ 4 milhões, e de danos morais coletivos, no mesmo valor. O TRF2, porém, levantou o bloqueio relativo aos danos morais coletivos, sob o entendimento de que eventual ressarcimento a esse título deveria ser exigido em processo específico para esse fim. 

Relator do recurso especial do MPF, o ministro Ribeiro Dantas lembrou que, no julgamento da AP 1.025, o STF passou a admitir a indenização por dano moral coletivo no processo criminal.

“Restou assentado que a prática de ato ilícito, com grave ofensa à moralidade pública, ou com desrespeito aos princípios de observância obrigatória no âmbito da administração pública, com a intenção de satisfazer interesses pessoais, em flagrante violação às expectativas de toda a sociedade brasileira, enseja a responsabilidade civil dos envolvidos pelo dano moral coletivo”, completou.

Exploração de atividade ilícita também é hipótese de condenação

A exploração comercial de atividade ilícita também configura, em si mesma, dano moral coletivo. Com esse entendimento, a Segunda Turma, no julgamento do REsp 1.567.123, reformou acórdão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) para impor a indenização a um estabelecimento que explorava jogos de bingo.

Os juízos de primeiro e segundo graus haviam julgado o pedido de indenização improcedente, ao entendimento de que seria necessário comprovar que a atividade teria gerado abalo de natureza não patrimonial à coletividade.

Segundo o relator, ministro Herman Benjamin, a ação civil pública do Ministério Público Federal tem a dimensão coletiva de não somente reparar danos já sofridos pelos consumidores (controle repressivo), como também determinar às exploradoras de jogos de bingo e caça-níqueis obrigação de fazer, de não fazer, de informar e de indenizar, para prevenir danos futuros a outros consumidores, como autoriza o artigo 6º, VI, do Código de Defesa do Consumidor (controle preventivo).

Para o ministro, no caso dos autos, era patente a necessidade de corrigir uma “lesão supraindividual às relações de consumo”, pois o dano em questão transcendia os interesses individuais dos frequentadores de bingo ilegal.

Fonte: STJ

Ministério Público pode ir à Justiça para questionar honorários abusivos em ações previdenciárias

Para a Terceira Turma, quando pessoas hipossuficientes e vulneráveis são induzidas de forma recorrente a aceitar a cobrança abusiva de honorários, o problema ultrapassa a esfera meramente individual.

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que o Ministério Público (MP) tem legitimidade para propor ação civil pública com o objetivo de discutir honorários advocatícios supostamente abusivos cobrados de pessoas hipossuficientes para o ajuizamento de ações previdenciárias.

Para o colegiado, o profissional que cobra valores excessivos pela prestação do serviço de advocacia, além de prejudicar a subsistência do cliente, vai contra a lógica do direito previdenciário – situação que ultrapassa a esfera dos interesses particulares.

Na origem do caso julgado pela Terceira Turma, o MP propôs ação civil pública contra dois advogados, na tentativa de inibir um esquema de captação de clientes, beneficiários da Previdência Social, e de cobrança de honorários supostamente excessivos.

O juízo de primeiro grau julgou a ação parcialmente procedente e tornou sem efeito a cobrança de honorários que ultrapassasse 30% do valor do benefício previdenciário. A sentença também anulou cláusulas contratuais que previam o recebimento integral dos honorários nas hipóteses de rescisão ou distrato e, ainda, determinou que os alvarás expedidos em nome dos advogados fossem de apenas 30% do valor depositado em juízo. O Tribunal de Justiça de Rondônia (TJRO) manteve a decisão.

Em recurso especial dirigido ao STJ, os advogados alegaram a ilegitimidade do MP para propor esse tipo de ação, por envolver interesses individuais e particulares, e sustentaram que não haveria vício nos contratos.

Usuários da Previdência Social estão em situação de vulnerabilidade

A relatora, ministra Nancy Andrighi, comentou que o contrato de prestação de serviços advocatícios está inserido no âmbito do direito privado, mas, quando pessoas em situação de hipossuficiência e vulnerabilidade são induzidas de forma recorrente a aceitar a cobrança abusiva de honorários, o problema ultrapassa os limites da esfera meramente individual.

Segundo a ministra, o caso ganha maior importância por envolver demandas previdenciárias, pois “geralmente são pessoas em situação de hipervulnerabilidade social, econômica e sanitária que estão buscando o poder público para garantir meios de sobrevivência”.

Nancy Andrighi observou que, embora os beneficiários do sistema previdenciário não sejam apenas os idosos, o artigo 74 do Estatuto da Pessoa Idosa dá ao Ministério Público competência para instaurar inquérito civil e ação civil pública para proteção desse público, que compõe a maioria dos segurados.

Ofensa ao sistema previdenciário atinge toda a sociedade

Conforme acrescentou a ministra, a advocacia que visa prejudicar o propósito da Previdência Social é uma ofensa ao próprio sistema previdenciário – bem jurídico de interesse de toda a sociedade, o que atrai a competência do MP.

“A modalidade de advocacia predatória que obsta o propósito da Previdência Social de mantença de seus segurados, ao atuar com desídia para aumentar a sua remuneração e ao cobrar honorários que prejudicam a subsistência dos beneficiários, desvirtua a lógica do direito previdenciário”, concluiu a relatora.

Fonte: STJ

Repetitivo discute se provas do inquérito e testemunho indireto são suficientes para a pronúncia

A Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) afetou o Recurso Especial 2.048.687, de relatoria do ministro Reynaldo Soares da Fonseca, para julgamento sob o rito dos repetitivos. A controvérsia, cadastrada como Tema 1.260, envolve duas questões: “a) se, nos termos do artigo 155 do Código de Processo Penal (CPP), a pronúncia não pode se fundamentar exclusivamente em elementos colhidos durante o inquérito policial; e b) se o testemunho indireto, ainda que colhido em juízo, não constitui, isoladamente, meio de prova idôneo para a pronúncia“.

O colegiado decidiu não suspender a tramitação dos processos que tratem da mesma questão jurídica.

Na decisão de afetação do tema como repetitivo, o ministro Reynaldo Soares da Fonseca determinou, além da comunicação aos Tribunais de Justiça e aos Tribunais Regionais Federais, a notificação da Defensoria Pública da União para que atue no caso como amicus curiae.

Recursos repetitivos geram economia de tempo e segurança jurídica

O Código de Processo Civil regula, nos artigos 1.036 e seguintes, o julgamento por amostragem, mediante a seleção de recursos especiais que tenham controvérsias idênticas. Ao afetar um processo, ou seja, encaminhá-lo para julgamento sob o rito dos repetitivos, os ministros facilitam a solução de demandas que se repetem nos tribunais brasileiros.

A possibilidade de aplicar o mesmo entendimento jurídico a diversos processos gera economia de tempo e segurança jurídica. No site do STJ, é possível acessar todos os temas afetados, bem como saber a abrangência das decisões de sobrestamento e as teses jurídicas firmadas nos julgamentos, entre outras informações.

Fonte: STJ

Espólio receberá valores da reserva especial de plano de previdência complementar

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que o espólio tem o direito de receber valores da reserva especial revertidos por entidade fechada de previdência complementar, após a morte do beneficiário, por força dos superávits apurados nos exercícios anteriores à sua morte. De acordo com o processo, foi ajuizada ação de cobrança contra uma fundação de previdência privada para o recebimento de superávit relativo a quatro anos de participação da falecida no plano de previdência complementar. Tanto o juízo de primeiro grau quanto o Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR) julgaram o pedido improcedente, sob o fundamento de que a pensionista faleceu antes do prazo de três exercícios sem a atualização da reserva de contingência, momento em que teria criado o direito ao recebimento, conforme o artigo 20, parágrafo 2º, da Lei Complementar 109/2001. Ao STJ, o espólio sustentou que a beneficiária adquiriu o direito de receber os valores com a geração do superávit, ao final do exercício financeiro. Além de apontar enriquecimento ilícito por parte da entidade de previdência privada, acrescentou que tais valores não caracterizam benefício, mas sim reembolso de parte do resultado superavitário do plano.

Reserva especial não tem natureza previdenciária

A relatora do recurso na Terceira Turma, ministra Nancy Andrighi, observou que o entendimento do STJ é de que os assistidos somente têm direito ao superávit do plano de benefícios após revisão, apreciação e aprovação do órgão fiscalizador, a Superintendência Nacional de Previdência Complementar (Previc). Entretanto, ela apontou que, na hipótese dos autos, não se pretende receber fração antes de satisfeitas as exigências legais e regulamentares. A ministra destacou que a reserva especial é constituída pelo excedente, ou seja, não tem natureza previdenciária, e a devolução desse valor deve ser feita aos que contribuíram. “O direito à reversão dos valores correspondentes à reserva especial se incorpora, gradualmente, ao patrimônio jurídico de quem contribuiu para o resultado superavitário, à medida em que há o decurso do tempo e se concretizam as demais exigências para a sua aquisição plena”, completou.

Direito subjetivo de recebimento

A relatora lembrou que, apesar de a beneficiária não ter direito adquirido, há a figura do direito acumulado no artigo 17 da Lei Complementar 109/2001. Para Nancy Andrighi, embora o superávit não gere direito adquirido, não pode ser entendido como mera expectativa de direito, pois os participantes que contribuíram para o resultado positivo têm o direito subjetivo de receber sua fração individual, após a revisão do plano com reversão de valores da reserva especial correspondente. “Mesmo antes do preenchimento de todos os requisitos de elegibilidade para o recebimento dos valores revertidos, o participante já agregou uma parcela desse direito ao seu patrimônio jurídico”, ressaltou.

Princípio da boa-fé objetiva

Por outro lado, a relatora explicou que, no intervalo entre a apuração do resultado e a determinação de revisão obrigatória, essa espécie de expectativa de direito qualificada fica sujeita a eventuais alterações do plano sobre a destinação e a utilização do superávit apurado. A ministra concluiu que, sob a ótica do princípio da boa-fé objetiva, a melhor forma de proteger aquele que contribuiu para um resultado superavitário e para a formação da reserva especial é devolver os valores que excederam o necessário para a garantia dos benefícios contratados e das despesas administrativas do plano de benefícios. — Fonte: STJ

Indicação de repetitivo pela Comissão Gestora de Precedentes não gera suspensão automática de processos

A Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reiterou que a seleção, pela Comissão Gestora de Precedentes (Cogepac), de recursos especiais indicados para julgamento pelo rito dos repetitivos não resulta na suspensão automática dos processos com a mesma controvérsia jurídica que estejam tramitando no tribunal.

O entendimento foi aplicado pelo colegiado ao rejeitar embargos de declaração da União no âmbito de recurso especial que discutiu os efeitos da coisa julgada em execução coletiva sobre eventuais execuções individuais propostas posteriormente.

Ao reformar o acórdão de segundo grau e determinar o prosseguimento de uma execução individual contra a União, a Segunda Turma entendeu que, não tendo a autora participado da ação coletiva como litisconsorte nem requerido a suspensão da ação individual, a coisa julgada formada no processo coletivo não a alcançaria.

Lei não prevê suspensão automática de processos pela atuação da Cogepac

Nos embargos de declaração, a União alegou que, como a Cogepac do STJ já havia selecionado alguns recursos especiais para possível discussão do tema sob o rito dos repetitivos, todos os processos sobre o mesmo assunto em trâmite na corte deveriam ter sido suspensos.

O ministro Teodoro Silva Santos, relator, citou precedentes do STJ para demonstrar que, por falta de previsão legal, não é possível acolher o pedido de suspensão de processos em razão da mera indicação de recursos candidatos ao julgamento pelo sistema qualificado.

Fonte: STJ

Memorial descritivo deve considerar matrículas individualizadas dos imóveis que integram a propriedade rural

A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) estabeleceu que, para fins de registro imobiliário rural, a certificação do memorial descritivo de propriedade deve considerar as matrículas individualizadas de cada imóvel que a compõe, conforme previsto na Lei 6.015/1973 (Lei de Registro de Imóveis). Nessa hipótese, o colegiado afastou o uso do conceito de imóvel rural previsto na legislação agrária, que abrange as glebas contíguas do mesmo proprietário utilizadas para objetivos econômicos similares.

Com esse entendimento, ao julgar recurso especial, a turma negou o pedido do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) para anular o registro de transferência de propriedade rural em favor de uma empresa agropecuária por falta do prévio georreferenciamento e da certificação da autarquia, exigidos por lei.

Na origem do caso, a empresa requereu ao Incra a atualização cadastral e a certificação de alguns imóveis rurais, mas o pedido foi indeferido sob a alegação de que as matrículas apresentadas seriam irregulares. A autarquia federal avaliou que os registros em cartório foram feitos sem a identificação prévia das áreas, nos moldes previstos no artigo 176, parágrafos 3º e 4º, da Lei de Registro de Imóveis, e ajuizou a ação para anular os registros imobiliários.

As instâncias ordinárias, entretanto, julgaram improcedente o pedido por avaliar, entre outros pontos, que os registros imobiliários contestados são regulares, pois não estavam sujeitos ao georreferenciamento à época de sua emissão.

Para o Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF2), nos termos da Lei de Registros Públicos, o georreferenciamento deve analisar o imóvel como descrito na matrícula do registro público imobiliário competente, e não a partir da configuração adotada pelo cadastro do Incra (CCIR), de modo que a exigência do artigo 176 da lei deve ser apurada com base nas áreas das matrículas individualizadas.

Direito agrário e registral trazem definições diversas de imóvel rural

Relator do recurso no STJ, o ministro Raul Araújo destacou que a solução do caso passa pela diferenciação entre os conceitos de imóvel rural no direito registral e na legislação agrária. No âmbito agrário, segundo o ministro, o Estatuto da Terra e a Lei da Reforma Agrária definem que o imóvel rural abrange a totalidade das glebas contíguas do mesmo proprietário utilizadas para fins econômicos similares.

“A definição de imóvel rural adotada pela legislação agrária é importante para o fim de se identificar se foram adotados corretamente os instrumentos técnicos para medição e georreferenciamento, para que não haja superposição de áreas nos imóveis rurais”, observou.

Por outro lado – prosseguiu o relator –, o direito registral busca segurança jurídica e estabilidade nas relações sobre direitos reais. Raul Araújo esclareceu que o registro de imóveis segue o princípio da especialidade, o qual impõe que toda inscrição deve recair sobre um objeto precisamente individualizado, a partir de indicações exatas de suas medidas, características e confrontações.

“Para o direito registral, com espeque nos princípios da especialidade e da unitariedade, cada matrícula representa uma unidade imobiliária, inclusive no que tange aos imóveis rurais, o que significa que o memorial descritivo a que se refere os parágrafos 3º e 4º do artigo 176 da Lei de Registros Públicos deve corresponder ao imóvel representado pela matrícula e que, portanto, cada matrícula deve ser demarcada e georreferenciada individualmente”, concluiu o ministro ao negar provimento ao recurso especial.

Fonte: STJ

Plano de saúde deverá pagar por medicamento incluído no rol da ANS durante o processo

Segundo a ministra Nancy Andrighi, após a inclusão do medicamento de uso domiciliar no rol de procedimentos e eventos em saúde da ANS, a operadora não pode mais recusar o seu custeio.

​A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que a operadora do plano de saúde é obrigada a cobrir medicamento de uso domiciliar incluído no rol da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) durante a tramitação do processo judicial que solicita seu fornecimento.

Na origem do caso, foi ajuizada ação contra o plano de saúde para que ele fornecesse um medicamento para o tratamento de psoríase. Tanto o juízo de primeiro grau quanto o tribunal local entenderam que o beneficiário teria o direito de receber o medicamento pelo tempo que fosse necessário.

No recurso especial dirigido ao STJ, a operadora do plano sustentou que, na época de sua negativa, o tratamento com a medicação pleiteada não era previsto no rol da ANS, o que só veio a ocorrer alguns meses depois. Alegou também que, por esse motivo, a questão deveria ser analisada conforme a resolução normativa vigente no momento da solicitação do medicamento.

Nova regra não pode ser aplicada retroativamente

A relatora, ministra Nancy Andrighi, destacou que, após a inclusão do medicamento de uso domiciliar no rol de procedimentos e eventos em saúde da ANS, a operadora não pode mais recusar o seu custeio.

Segundo ela, a Resolução Normativa 536/2022, publicada em 6 de maio de 2022, alterou o anexo II da Resolução Normativa 465/2022 para incluir a previsão de cobertura obrigatória do medicamento risanquizumabe para o tratamento de pacientes com psoríase. Até a data da publicação, portanto, os planos de saúde estavam autorizados a negar a cobertura do medicamento de uso domiciliar, de acordo com artigo 10, inciso VI, da Lei 9.656/1988, salvo se houvesse previsão contratual em sentido contrário.

De acordo com a relatora, não é possível aplicar retroativamente a nova resolução. Assim, a Terceira Turma reformou o acórdão de segunda instância para condenar o plano a custear o medicamento apenas a partir de 6 de maio de 2022.

Fonte: STJ