Após o prazo de entrega, retificação no IR deve seguir modalidade usada para transmitir declaração

A Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por unanimidade, entendeu que, após o fim do prazo para a entrega da Declaração do Imposto sobre a Renda da Pessoa Física (DIRPF), eventuais retificações devem ser feitas utilizando a mesma modalidade escolhida originalmente, mantendo o modelo de formulário (completo ou simplificado) usado na transmissão do documento para a Receita Federal.

O caso analisado pelo colegiado teve origem em mandado de segurança impetrado por um contribuinte que solicitou à Receita a retificação de suas declarações referentes aos exercícios de 2005 a 2008. Ele alegou que desconhecia a obrigatoriedade de declarar os bens que possuía no exterior e que, ao tentar corrigir a declaração, o sistema não permitiu a alteração da modalidade simplificada para a completa.

A sentença que concedeu o mandado de segurança foi mantida pelo Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3), sob o fundamento de que o artigo 147, parágrafo 1º, do Código Tributário Nacional (CTN) admite a retificação por iniciativa do contribuinte, ainda que com a finalidade de reduzir ou excluir tributo, desde que o erro seja comprovado e a retificação ocorra antes de ser feita a notificação de lançamento.

Além disso, para o tribunal, uma vez que era concedida ao contribuinte a possibilidade de escolher entre a declaração simplificada e a completa, não haveria motivo para impedir correções posteriores, especialmente quando resultassem em tributo a recolher em valor inferior ao inicialmente apurado.

No recurso especial dirigido ao STJ, a Fazenda Nacional alegou que a escolha exercida pelo contribuinte na declaração de rendimentos, seja ela simplificada ou completa, não pode ser alterada mediante declaração retificadora apresentada fora do prazo previsto para a entrega da DIRPF, por não configurar erro apto a autorizar a retificação.

Retificação no IR não envolve troca de modelo de declaração

O relator do recuso, ministro Afrânio Vilela, destacou que, conforme o artigo 147, parágrafo 1º, do CTN, a retificação da declaração pelo próprio declarante, visando reduzir ou excluir tributo, só é permitida com a devida comprovação do erro que a fundamenta.

O ministro esclareceu que o erro passível de retificação não se refere à troca de modalidade de declaração, mas sim a aspectos como a identificação do sujeito passivo, a alíquota aplicável, os documentos relativos ao pagamento ou o cálculo do montante devido.

Ao citar precedentes, o ministro apontou que, de acordo com o artigo 18 da Medida Provisória 2.189-49/2001 e outros dispositivos legais, a retificação deve seguir a mesma modalidade da declaração original, não sendo permitida a retificação com o objetivo de trocar a forma de tributação escolhida após o prazo final do envio.

”Desse modo, após o transcurso do prazo previsto para a entrega da DIRPF, a retificação dos equívocos deve ocorrer dentro da modalidade escolhida, mantido o modelo de formulário utilizado (completo ou simplificado) no momento da transmissão da declaração”, concluiu o ministro ao dar provimento ao recurso.

Fonte: STJ

Projeto autoriza delegado a pedir medida cautelar e protetiva direto à Justiça

O Projeto de Lei 2435/24 autoriza o delegado de polícia a apresentar diretamente ao Poder Judiciário medida cautelar, protetiva de urgência e recursos relacionados à investigação sob sua responsabilidade. A Câmara dos Deputados analisa a proposta, que altera a Lei 12.830/13, sobre investigação criminal conduzida por delegado.

Deputado Delegado Caveira fala ao microfone
Delegado Caveira quer evitar brechas na lei atual – Mário Agra/Câmara dos Deputados

Segundo o autor, deputado Delegado Caveira (PL-PA), a medida atende “aos interesses da sociedade e à busca incessante da verdade real no curso das investigações policiais presididas pelo delegado de polícia”.

O deputado explica que, na prática, as manifestações, recursos, cautelares inominadas já são rotina na atividade policial. “Mas buscando modernizar a legislação e evitar eventuais brechas na legislação que possam ensejar supostas nulidades, urge a necessidade dessa alteração legislativa”, defende Delegado Caveira.

Pela proposta, além das medidas protetivas de urgência da Lei Maria da Penha, os delegados poderão apresentar diretamente à Justiça pedidos de:

  • prisão temporária ou preventiva;
  • busca e apreensão de pessoas ou objetos;
  • interceptação de comunicações ou dados;
  • quebra do sigilo bancário ou fiscal;
  • exame de insanidade mental;
  • sequestro ou arresto de bens;

Próximos passos
A proposta será analisada, em caráter conclusivo, pelas comissões de Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado; e de Constituição e Justiça e de Cidadania.

Para virar lei, a proposta precisa ser aprovada pela Câmara e pelo Senado.

Fonte: Câmara dos Deputados

É possível fixar honorários para autor da ação de busca e apreensão extinta a seu pedido após pagamento da dívida

Para o ministro Marco Aurélio Bellizze, o pedido de extinção da ação de busca e apreensão de veículo se deveu à perda superveniente de objeto e ao reconhecimento implícito da procedência do pedido.

Para a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), é possível o arbitramento de honorários de sucumbência em favor do advogado da parte autora quando esta pede a extinção da ação de busca e apreensão de veículo devido ao pagamento dos valores em aberto, ainda que o réu tenha apresentado contestação antes do cumprimento da liminar.

No julgamento de recurso especial, o colegiado negou o pedido da devedora fiduciante para que fossem fixados honorários em favor do seu advogado, após ela pagar as parcelas atrasadas que levaram a instituição credora a ajuizar a ação de busca e apreensão do veículo financiado.

“O pedido extintivo feito pela demandante, por evidente, tem por lastro a perda superveniente de objeto da ação e – implicitamente – o próprio reconhecimento da procedência do pedido, ante o cumprimento das prestações pela ré, a ensejar, em ambas as situações, a sua responsabilidade pelo pagamento da verba honorária”, destacou o relator, ministro Marco Aurélio Bellizze.

Na origem do caso, o juízo de primeiro grau concedeu a liminar para apreensão do veículo. A devedora chegou a apresentar contestação antes que a medida fosse cumprida, mas o banco informou que a dívida tinha sido regularizada logo em seguida e requereu a extinção do processo. O novo pedido também foi aceito, e a situação foi tratada como desistência, sem fixação de honorários de sucumbência – entendimento mantido pelo Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC).

Ambas as instâncias decidiram que o arbitramento de honorários seria indevido, pois o pedido de extinção da ação ocorreu antes do cumprimento da liminar. Além disso, concluíram que o comparecimento espontâneo da ré no processo não supriria a falta de citação. Em recurso especial, a defesa da consumidora alegou que a falta de condenação ao pagamento de honorários por desistência da ação violaria o artigo 90 do Código de Processo Civil (CPC).

Manifestação espontânea da ré é capaz de suprir a falta de citação

De acordo com Bellizze, a impossibilidade de condenação da instituição financeira ao pagamento de honorários deve ser mantida, mas por fundamento diverso, já que, em sua avaliação, não se pode afirmar que tenha havido desistência da ação por parte do credor fiduciário.

Citando precedente da corte, o ministro observou que, na ação de busca e apreensão prevista no Decreto-Lei 911/1969, a análise da contestação deve ocorrer somente após a execução da medida liminar, mas o devedor fiduciante pode se antecipar à citação e apresentar sua defesa.

Dessa forma, prosseguiu, a manifestação espontânea da parte ré supre a falta do ato citatório e consolida a relação processual, elemento indispensável para gerar a responsabilidade pelo pagamento da verba honorária sucumbencial.

Quitação da dívida indicou o reconhecimento da procedência do pedido

Quanto à definição de quem deve arcar com esse ônus, o ministro citou os princípios da sucumbência e da causalidade, previstos no CPC, mas ressaltou especificamente o artigo 90, o qual impõe ao autor que desiste ou renuncia, bem como ao réu que reconhece a procedência do pedido, a responsabilidade pelos honorários. Segundo Bellizze, foi a falta de pagamento das parcelas que deu causa ao ajuizamento da ação.

“Por sua vez, a quitação dos valores devidos durante a tramitação da ação, além de torná-la sem objeto, coaduna-se, inclusive, com o reconhecimento da procedência do pedido por parte da demandada, circunstância que, consoante o teor do artigo 90 do CPC (parte final), também conduziria à sua responsabilização pelos honorários advocatícios em favor da demandante”, concluiu o ministro.

No entanto, o relator observou que, embora a responsabilização da ré pelos honorários fosse a melhor solução para o caso, não seria adequado agravar a sua situação após sucessivos recursos exclusivos da defesa. “Por tal razão, mantém-se, por fundamentação diversa, o desfecho quanto ao não cabimento de condenação da instituição financeira ao pagamento da verba honorária sucumbencial, sem reversão do julgado”, finalizou.

Leia o acórdão no REsp 2.028.443.

Fonte: STJ

Morte simultânea de segurado e herdeira não afasta direito dos filhos dela à divisão do seguro

O tribunal reconheceu o direito dos dois filhos menores à divisão da indenização securitária com uma tia, única irmã viva do titular do seguro, cujo contrato não indicava beneficiários.

Para a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), no contrato de seguro de vida que não elenca os beneficiários da indenização, a comoriência (presunção de morte simultânea) do segurado e da pessoa que seria sua herdeira não afasta o direito de representação dos filhos dessa herdeira, nos termos dos artigos 1.851 a 1.854 do Código Civil.

Segundo o colegiado, o direito de representação se destina a proteger o interesse dos filhos que perderam precocemente seus pais. “A questão ganha ainda mais relevo quando os que pleiteiam o direito de representação são crianças e adolescentes – inseridos na condição peculiar de pessoas em desenvolvimento, conforme reconhecido pelo artigo 6º do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), e cuja proteção deve ser garantida com absoluta prioridade pela família, pela sociedade e pelo Estado (artigo 227 da Constituição)”, afirmou a ministra Nancy Andrighi, relatora.

De acordo com o processo, o titular do seguro de vida – que não tinha cônjuge, pais vivos ou filhos – faleceu em um acidente de trânsito junto com a sua irmã, que tinha dois filhos. Como o contrato de seguro não indicava beneficiários, a seguradora pagou a indenização integralmente para a única irmã viva do segurado, sua herdeira colateral.

Como consequência, os filhos menores da irmã falecida ingressaram com ação e alegaram que a indenização deveria ser dividida entre eles e a tia. O pedido foi acolhido em primeiro grau, mas a sentença foi reformada pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), segundo o qual não haveria transmissão de direitos entre parentes que morreram na mesma ocasião.

Na representação, herdeiros mais próximos concorrem com os de grau mais distante

A ministra Nancy Andrighi explicou que, embora o capital garantido pelo seguro de vida não seja considerado herança, um dos principais critérios utilizados pela legislação brasileira, em caso de omissão contratual a respeito dos beneficiários, é a ordem de vocação hereditária.

Ela destacou que, nos termos do artigo 1.829 do Código Civil, a sucessão legítima observa a seguinte ordem: 1º) descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se o cônjuge for casado com o falecido em comunhão universal, ou com separação obrigatória de bens; ou se, no regime da comunhão parcial, o falecido não deixar bens particulares; 2º) ascendentes, em concorrência com o cônjuge; 3º) cônjuge sobrevivente, e; 4º) colaterais.

Entretanto, a relatora lembrou que há uma hipótese excepcional de sucessão por direito de representação, na qual a lei chama determinados parentes do herdeiro falecido para receberem todos os direitos que ele receberia se estivesse vivo.

“Pelo direito de representação, herdeiros de grau mais próximo concorrerão com os de grau mais distante, que receberão a herança na qualidade de representantes daquele que, se vivo fosse, seria herdeiro daquele grau mais próximo”, completou.

Legislação não prevê que comoriência afaste direito de representação

Segundo Nancy Andrighi, embora não seja a hipótese mais comum, é possível que o direito de representação ocorra no caso das mortes simultâneas do representado e do autor da herança. A ministra enfatizou que a legislação brasileira não estabelece que a situação de comoriência afastaria o direito de representação.

“O filho que perdeu prematuramente seu pai antes do seu avô, por exemplo, encontra-se em uma situação em tudo similar à do filho que perdeu o pai e o avô em um mesmo acidente de trânsito”, disse ela.

No caso dos autos, a ministra comentou que, se a mãe tivesse morrido segundos antes do segurado, não haveria dúvidas quanto ao direito de representação dos filhos, ao passo que, caso a morte do segurado ocorresse antes, a mãe dos menores receberia – em concorrência com a outra irmã – parte do valor da indenização, a qual seria repassada a título de herança para os recorrentes.

“Ao se presumir a morte simultânea (comoriência), não se pode conferir uma interpretação dos artigos 1.851 ao 1.854 do Código Civil apta a gerar a injusta situação em que os recorrentes não teriam direito a nada e que caberia à irmã viva o valor integral do seguro”, concluiu a ministra ao restabelecer a sentença.

Leia o acórdão no REsp 2.095.584.

Fonte: STJ

Proteção legal do meio ambiente do trabalho nas normas penais

O não cumprimento das normas de segurança, higiene e medicina do trabalho pode levar a acidentes de trabalho e caracterizar os crimes de homicídio, de lesões corporais ou de perigo comum, previstos, respectivamente, nos artigos 121, 129 e 132 do Código Penal brasileiro, por conduta dolosa ou culposa do empregador ou dos responsáveis pela segurança dos trabalhadores.

O artigo 132 do código Penal estabelece que “expor a vida ou a saúde de outrem a perigo direto e iminente: Pena — detenção, de três meses a um ano, se o fato não constitui crime mais grave. Parágrafo único. A pena é aumentada de um sexto a um terço se a exposição da vida ou da saúde de outrem a perigo decorre do transporte de pessoas para a prestação de serviços em estabelecimentos de qualquer natureza, em desacordo com as normas legais”.

Este artigo foi feito à época visando a prevenir os acidentes de trabalho, tendo como motivação o aumento da construção civil no País e, com ela, os muitos acidentes de trabalho decorrentes. Este artigo foi inspirado no Código Penal suíço e tem expressivo caráter preventivo e pedagógico, embora com pouca aplicação prática. Aos delegados de polícia cabe instaurarem inquéritos para apuração da responsabilidade penal pessoal dos acidentes de trabalho.

A responsabilidade penal, que é pessoal — do empregador, do tomador de serviços, do preposto, dos membros da Cipa, dos engenheiros de segurança, dos técnicos de segurança etc. — caracteriza-se não só pelo acidente de trabalho em si, quando a ação ou omissão decorrer de dolo ou culpa, mas também pelo não cumprimento das normas de segurança, medicina e higiene do trabalho, expondo-se a risco e perigo a vida dos trabalhadores, como preceitua o Código Penal.

A Lei nº 8.213/91, no artigo 19, § 2º, considera como contravenção penal, punível com multa, deixar a empresa de cumprir as normas de segurança e higiene do trabalho.

Há outros dispositivos legais que têm aplicação na esfera trabalhista, pelo não cumprimento das normas que tratam da segurança, medicina e higiene do trabalho. É o caso do artigo 15 da Lei nº 6.938/81 (Lei de Política Nacional do Meio Ambiente), estabelecendo que:

Art. 15: O poluidor que expuser a perigo a incolumidade humana, animal ou vegetal, ou estiver tornando mais grave situação de perigo existente, fica sujeito à pena de reclusão de 1 (um) a 3 (três) anos e multa de 100 (cem) a 1.000 (mil) MVR.

§ 1º A pena é aumentada até o dobro se:

I — resultar:

a) dano irreversível à fauna, à flora e ao meio ambiente;

b) lesão corporal grave;

II — a poluição é decorrente de atividade industrial ou de transporte;

III — o crime é praticado durante a noite, em domingo ou em feriado.

§ 2º Incorre no mesmo crime a autoridade competente que deixar de promover as medidas tendentes a impedir a prática das condutas acima descritas.

Sanções por crime contra o meio ambiente

A Lei nº 9.605/98 (artigo 3º), que estabelece sanções penais e administrativas pelos crimes causados ao meio ambiente, inovou no sistema jurídico brasileiro (atendendo ao mandamento do § 3º do artigo 225 da CF), incriminando também as pessoas jurídicas, sem excluir a responsabilidade das pessoas físicas, nos seguintes termos: “as pessoas jurídicas serão responsabilizadas administrativa, civil e penalmente conforme o disposto nesta Lei, nos casos em que a infração seja cometida por decisão de seu representante legal ou contratual, ou de seu órgão colegiado, no interesse ou benefício da sua entidade”. Acrescenta o parágrafo único desse artigo que “a responsabilidade das pessoas jurídicas não exclui a das pessoas físicas, autoras, coautoras ou partícipes do mesmo fato”.

O artigo 8º desta Lei diz que as penas restritivas de direito são:

  • I — prestação de serviços à comunidade;
  • II — interdição temporária de direitos;
  • III — suspensão parcial ou total de atividades;
  • IV — prestação pecuniária;
  • V — recolhimento domiciliar.

O artigo 21 (Lei nº 9.605/98) estabelece que as penas aplicáveis isolada, cumulativa ou alternativamente às pessoas jurídicas, de acordo com o disposto no artigo 3º, são:

  • I — multa;
  • II — restritivas de direitos;
  • III — prestação de serviços à comunidade.

Complementando, estabelece o artigo 22 que as penas restritivas de direitos da pessoa jurídica são:

  • I — suspensão parcial ou total de atividades;
  • II — interdição temporária de estabelecimento, obra ou atividade;
  • III — proibição de contratar com o Poder Público, bem como dele obter subsídios, subvenções ou doações.

Essas disposições legais, criadas para o meio ambiente no geral, também têm aplicação contra os degradadores do meio ambiente do trabalho, uma vez que este é apenas um dos aspectos daquele, não obstante seja necessária uma legislação penal explícita e específica para o âmbito trabalhista.

Pelas normas clássicas do Código Penal, a criminalização existe depois que o trabalhador se acidenta ou falece, o que, na prática, não surte o efeito desejado, que é prevenir a ocorrência dos acidentes.

A Lei nº 7.802/89, no tocante ao controle de agrotóxicos, trata especificamente da tutela da saúde do trabalhador no artigo 14 e letra f, dizendo que “as responsabilidades administrativa, civil e penal pelos danos causados à saúde das pessoas e ao meio ambiente, quando a produção, comercialização, utilização, transporte e destinação de embalagens vazias de agrotóxicos, seus componentes e afins, não cumprirem o disposto na legislação pertinente, cabem: … ao empregador, quando não fornecer e não fizer manutenção dos equipamentos adequados à proteção da saúde dos trabalhadores ou dos equipamentos na produção, distribuição e aplicação dos produtos”.

No artigo 16, diz que “o empregador, profissional responsável ou o prestador de serviço, que deixar de promover as medidas necessárias de proteção à saúde e ao meio ambiente, estará sujeito à pena de reclusão de dois a quatro anos, além de multa de 100 a 1.000 MVR. Em caso de culpa, será punido com pena de reclusão de um a três anos, além de multa de 50  a 500 MVR”.

Portanto, é preciso tomar cuidado, porque o não cumprimento das normas de saúde, higiene e segurança do trabalho pode levar à responsabilização penal dos infratores, inclusive pessoas jurídicas, como visto acima.

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Grupo Decisório do Centro Nacional de Inteligência da Justiça Federal aprova quatro notas técnicas

A reunião aconteceu na manhã desta quinta-feira (5), na sede do CJF, em Brasília (DF)

Em reunião realizada na manhã desta quinta-feira (5), na sede do Conselho da Justiça Federal (CJF), em Brasília (DF), o Grupo Decisório do Centro Nacional de Inteligência da Justiça Federal (CIn) aprovou quatro notas técnicas encaminhadas pelos Centros Locais de Inteligência e pelo Grupo Operacional do CIn, com vistas à prevenção de conflitos, ao monitoramento das demandas e à gestão dos precedentes.

O encontro, promovido pelo Centro de Estudos Judiciários (CEJ/CJF), foi conduzido pelo corregedor-geral da Justiça Federal e coordenador-geral do Centro de Inteligência da Justiça Federal (CIn), ministro Luis Felipe Salomão, que assumiu a coordenação dos trabalhos do grupo. Também participaram o integrante da Comissão Gestora de Precedentes e de Ações Coletivas do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministro Sérgio Kukina, e desembargadores federais responsáveis pelos Núcleos de Gerenciamento de Precedentes e de Ações Coletivas (NUGEPNAC) dos Tribunais Regionais Federais (TRFs), além de representantes do Grupo Operacional do CIn.

Em sua primeira participação à frente do Grupo Decisório, o ministro Luis Felipe Salomão destacou a excelência do trabalho desenvolvido no CIn: “É absolutamente extraordinário o que se faz aqui, são exemplos muito significativos. Então, estou empolgado com esse trabalho. Acredito que vamos fazer uma gestão coletiva. Esse grupo tem um papel fundamental de pensar as políticas que vamos desenvolver, com muita representatividade de todas as áreas, de todos os segmentos e tribunais, bem como de juízes de 1º grau e da associação de magistrados”.

O ministro Sérgio Kukina, por sua vez, expressou satisfação em retornar ao Conselho para contribuir nos trabalhos do Grupo Decisório. “Para mim, esse ambiente é muito familiar. Tenho as melhores lembranças dele porque, até pouco tempo atrás, estive participando do CJF, em um convívio extraordinariamente salutar, e tive o ensejo de trabalhar, por um breve espaço de tempo, junto à TNU. Portanto, tenho a certeza de uma manhã de trabalho muito exitosa e de que saímos daqui com boas soluções e bons ensinamentos”, afirmou.

A juíza auxiliar da Corregedoria-Geral da Justiça Federal e coordenadora do Grupo Operacional, Vânila Cardoso André de Moraes, enfatizou que o trabalho desenvolvido pelo CIn, desde sua criação, é de “concretização e de grande impacto na sociedade e no sistema de justiça”. Segundo a magistrada, a justiça brasileira “realmente precisa desse trabalho, pautado em união, cooperação, colaboração e harmonização”.

Notas técnicas

A primeira nota técnica aprovada foi a CLISP n. 17/2023, do Centro Local de Inteligência da Seção Judiciária de São Paulo (SP), que trata da instrução concentrada em ações sobre aposentadoria por idade rural e aposentadoria por idade híbrida. O tema foi apresentado pelo integrante do Grupo Operacional do TRF da 3ª Região (TRF3), juiz federal Eurico Zecchin Maiolino.

Outra nota técnica do Centro Local de Inteligência da Seção Judiciária de São Paulo (SP), n. 20/2024, também foi aprovada e se refere a formulários-padrão online de distribuição de processos, por assunto, nos Juizados Especiais Federais (JEFs). A questão foi apresentada pela integrante do CLISP, juíza federal Eliana Rita Maia Di Pierro.

Em seguida, o CIn ratificou a nota técnica conjunta da Rede de Inteligência e Inovação da 4ª Região n. 1/2024, que compartilha informações e diretrizes para a prevenção e o tratamento da litigiosidade superveniente ao desastre climático no Rio Grande do Sul (RS), ocorrido em maio de 2024, e propõe providências. A apresentação do tema foi conduzida pela integrante do Grupo Operacional do TRF da 4ª Região (TRF4) desembargadora federal Taís Schilling Ferraz.

A última nota aprovada versa sobre as especificidades da Justiça Federal diante do julgamento do Tema 1.184 do Supremo Tribunal Federal (STF), com repercussão geral, e a edição da Resolução CNJ n. 547/2024, que estabeleceu critérios para a extinção das execuções fiscais. O tema foi apresentado pelo integrante do Grupo Operacional do TRF da 5ª Região (TRF5) juiz federal Marco Bruno Miranda Clementino.

Novidade

Na ocasião, o ministro Luis Felipe Salomão anunciou o desenvolvimento do projeto Notas Técnicas em Podcast. Produzido pelo Centro Nacional de Inteligência da Justiça Federal (CIn), em parceria com a Assessoria de Comunicação Social do Conselho da Justiça Federal (ASCOM/CJF), a iniciativa visa dar voz aos conteúdos aprovados pelo grupo, para ampliar o acesso à informação de maneira fácil, rápida e inclusiva.

Os primeiros episódios, que serão lançados neste mês de setembro, irão abordar as quatro notas técnicas aprovadas na reunião desta quinta-feira (5), com narração de relatoras e relatores dos temas.

CIn

O Centro Nacional é formado por ministros do Superior Tribunal de Justiça (STJ), desembargadoras e desembargadores federais e um Grupo Operacional composto por juízas e juízes federais, oriundos dos Tribunais Regionais Federais, além de contar com o auxílio de servidoras e servidores do STF, do STJ e do Poder Judiciário federal.

Fonte: CJF

STJ rejeita pedido de impeachment de Domingos Brazão

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu rejeitar um pedido de impeachment do conselheiro do Tribunal de Contas do Rio de Janeiro Domingos Brazão, preso pela acusação de atuar como um dos mandantes do assassinato da vereadora Marielle Franco, em 2018.

A decisão foi proferida na semana passada pela Corte Especial. que rejeitou um pedido do PSOL para afastar o conselheiro do mandato. O caso chegou ao STJ em março deste ano após a prisão de Domingos Brazão.

Pelo entendimento dos ministros, as acusações criminais contra Brazão não têm relação com crimes de responsabilidade, conduta que é apurada em casos de impeachment.

Domingos Brazão, o irmão dele, Chiquinho Brazão, deputado federal (Sem Partido-RJ), o ex-chefe da Polícia Civil do Rio de Janeiro Rivaldo Barbosa e o major da Policia Militar Ronald Paulo de Alves Pereira são réus no Supremo Tribunal Federal (STF) pela acusação de atuarem no assassinato de Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes.

Mais cedo, o Conselho de Ética da Câmara dos Deputados aprovou o parecer que pede a cassação de Chiquinho Brazão .

A defesa do deputado tem cinco dias úteis para recorrer à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Casa. Para que o parlamentar perca o mandato, o parecer ainda precisa ser aprovado pelo plenário da Casa.

Fonte:

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Intimação pessoal do devedor de alimentos pode ser dispensada mesmo que advogado não tenha poderes especiais

Para aTerceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), é possível dispensar a intimação pessoal de devedor de alimentos, em cumprimento de decisão que tramita sob o rito da prisão, na hipótese em que o réu tenha constituído advogado e praticado diversos atos processuais, ainda que a procuração judicial não contenha poderes especiais para o recebimento das comunicações processuais.  

O colegiado reforçou que, como regra, é necessária a intimação pessoal do devedor, inclusive por meio de advogado com poderes especiais para esse fim, sobre a obrigação de pagar os alimentos e a possibilidade da prisão civil se persistir o inadimplemento, porém, no caso analisado pela turma, diversas circunstâncias permitem confirmar que o devedor teve ciência inequívoca da ação e, por meio de seu advogado, exerceu o contraditório e se manifestou normalmente no processo.

De acordo com os autos, os credores iniciaram a fase de cumprimento provisório de decisão interlocutória que fixou os alimentos, motivo pelo qual o juízo determinou a intimação pessoal do devedor para pagar, provar que pagou ou justificar a absoluta impossibilidade de pagar o débito.

Posteriormente, o devedor juntou aos autos procuração sem poderes específicos para receber citações ou intimações pessoais e, na sequência, apresentou exceção de pré-executividade. Após parecer do Ministério Público e novas manifestações dos credores e do devedor, o juízo decretou a prisão civil do réu, o qual impetrou habeas corpus em segunda instância e no STJ.

Segundo o devedor de alimentos, a constituição do advogado e o ingresso nos autos se deu apenas com a finalidade de apresentar a exceção de pré-executividade, o que não supriria a necessidade de intimação pessoal do réu e tornaria nula a ordem de prisão civil.  

A prática de atos processuais pode suprir a intimação pessoal

A relatora do habeas corpus, ministra Nancy Andrighi, apontou que, no EREsp 1.709.915, a Corte Especial estabeleceu que há a configuração do comparecimento espontâneo do réu, entre outras hipóteses, com a apresentação de embargos à execução ou de exceção de pré-executividade, mesmo que não tenham sido outorgados poderes especiais ao advogado para receber citação.

No caso dos autos, reforçou a relatora, além da exceção de pré-executividade, os advogados seguiram atuando no processo e realizaram inclusive defesa de mérito, tanto em relação ao valor do débito alimentar quanto no tocante à impossibilidade de prisão civil do devedor. 

“Deve-se concluir que o comparecimento espontâneo do executado, nas circunstâncias fáticas acima mencionadas, supriu a necessidade de intimação pessoal por ter sido configurado o comparecimento espontâneo, aplicando-se, por analogia, o artigo 239, parágrafo 1º, do CPC“, completou.

Nancy Andrighi enfatizou a importância de a primeira intimação do devedor de alimentos ser realmente pessoal, tendo em vista a grave consequência do seu inadimplemento. Contudo, ela observou que “as demais, relativas às parcelas da dívida alimentar que se vencerem no curso do cumprimento de sentença, poderão ser validamente efetivadas na pessoa do advogado por ele constituído”.

“Com a primeira intimação pessoal, o devedor passa a ter ciência inequívoca de que o credor optou pela referida cobrança pelo rito da coerção pessoal, de modo que também tem ciência inequívoca de que, sob essa modalidade procedimental, o inadimplemento poderá acarretar a decretação de sua prisão civil”, concluiu a ministra ao negar o habeas corpus.

O número do processo não é divulgado em razão de segredo judicial.

Fonte: STJ

Sigilo bancário e fiscal: dois pesos e duas medidas

Recentemente, a imprensa repercutiu fortemente a decisão tomada pela 2ª Turma do STF no julgamento do Agravo Regimental no Recurso Extraordinário nº 1.393.219 (j. 28/6/24), no qual foi decidido que “em que pese o Supremo Tribunal Federal tenha autorizado o compartilhamento de relatórios de inteligência financeira da UIF e de procedimento fiscalizatório da Receita Federal do Brasil com os órgãos de persecução penal, não permitiu que o Ministério Público requisitasse diretamente dados bancários ou fiscais para fins de investigação ou ação penal sem autorização judicial prévia”.

Marcelo Camargo/Agência Brasil

A decisão, no ponto, é acertadíssima: apesar de o MP ter poder requisitório de determinadas informações (artigo 129, VI, CF/88 e artigo 8º, II, LC nº 75/93), os dados fiscais e bancários dizem respeito à intimidade e vida privada das pessoas, cuja inviolabilidade é uma garantia constitucional (artigo 5º, X, XII e LXXIX), que só pode ser afastada nas hipóteses e na forma prevista na lei — isto segundo lei de mesma hierarquia da LC nº 73/93, maior especificidade e mais recente: o sigilo bancário no artigo 1º, § 4º, da LC nº 105/2001 e o fiscal no artigo 198, § 1º, I, do CTN, adicionado pela LC nº 104/2001.

O STF, portanto, só reafirmou o que dizem a Constituição e a lei sobre o sigilo fiscal e o que sempre foi o entendimento dos tribunais: a sua flexibilização se justifica em excepcionais situações previstas em lei e, na hipótese de a “demanda” partir de um órgão persecutório, depende de autorização judicial prévia. Não há inovação e nem imposição de maiores dificuldades. Ao contrário, trata-se do correto e necessário equilíbrio entre a legítima persecução penal de fatos criminosos e o respeito às garantias constitucionais, por meio do filtro judicial que autoriza o acesso aos dados quando isto for cabível e desautoriza eventuais devassas sem razão.

A decisão, porém, aprofundou a confusão generalizada feita sobre o que, afinal, o plenário do STF decidiu ao julgar o Tema nº 990 de Repercussão Geral e evidenciou que a Corte trata com menos rigor a proteção do sigilo bancário, comparativamente ao fiscal. E isto sem razão, pois a Constituição e a legislação não estabelecem esse tratamento diferenciado.

Como dito, os dados fiscais e bancários são igualmente protegidos por sigilo, e o seu acesso pelas autoridades encarregadas pela persecução penal é, de igual modo, condicionado à autorização judicial.

No caso do sigilo fiscal, essa regra é excepcionada, pela própria lei, para autorizar que a Receita Federal compartilhe com as autoridades penais dados fiscais quando, depois do procedimento administrativo, constatar supressão de tributo possivelmente caracterizadora de crime tributário, hipótese em que espontaneamente envia a essas autoridades uma representação fiscal para fins penais (artigo 198, § 3º, I, CTN e artigo 83, Lei nº 9.430/96), contendo dados fiscais, independentemente de autorização judicial.

Ao julgar o RE nº 1.055.941 (Tema 990/RG), o STF fixou que essa possibilidade não contraria qualquer norma constitucional e, nesta decisão mais recente no AgRg no RE nº 1.393.219, esclareceu que, apesar disso, o MP não pode requisitar esses dados fiscais.

Até aqui, tudo perfeito.

Porém, no mesmo julgamento do RE nº 1.055.941 — que a princípio apenas tratava do sigilo fiscal — o STF, por maioria apertada, aumentou o escopo da decisão para tratar também da difusão de relatórios de inteligência pelo Coaf sem autorização judicial.

Coaf pode compartilhar relatórios com a Justiça

Como se sabe, os RIFs são elaborados pelo Coaf a partir de informações recebidas pelos sujeitos obrigados listados no artigo 9º da Lei de lavagem de dinheiro. Entre esses sujeitos, estão as instituições financeiras, que comunicam ao órgão operações bancárias atípicas, ou seja, com um grau de suspeição sobre a ocorrência, ou não, de lavagem de dinheiro. Assim, tais RIFs, quando elaborados com informações prestadas por instituições financeiras, contêm alguns dados bancários (operações ativas e passivas), protegidos por sigilo nos termos do artigo 1º da Lei Complementar nº 105/2001 [1].

No julgamento do RE nº 1.055.941, o STF expressamente decidiu ser constitucional a possibilidade de o Coaf compartilhar os RIFs com as autoridades penais ao constatar a possível ocorrência de crime de lavagem de dinheiro, sem autorização judicial, nos termos do disposto no artigo 15 da Lei nº 9.613/98 [2]. Segundo argumentou o plenário da Suprema Corte, dado que o RIF não continha movimentações globais dos correntistas, o sigilo bancário teria reduzida incidência, de modo que seria possível o compartilhamento direto.

A partir disso, porém, surgiu generalizada confusão sobre se o MP ou a polícia poderiam solicitar ou requisitar acesso a esses RIFs sem autorização judicial, pois o dispositivo da decisão e a tese fixada não esclareciam essa possibilidade e apenas alguns ministros se manifestaram favoravelmente a ela.

Com analogia à lógica há anos estabelecida para o sigilo fiscal e confirmada pela 2ª Turma do STF no julgamento mais recente, o STJ decidiu que era ilegal a solicitação ou requisição, pelas autoridades penais, de confecção e compartilhamento de RIFs: o Coaf poderia, tal como a Receita, espontaneamente compartilhar esses dados quando, no exercício da sua função, notar a possível ocorrência de crime, mas o MP não pode pedir acesso direto sem autorização judicial (RHC 147.707, j. 15.08.23).

A 1ª Turma do STF, porém, cassou essa decisão dizendo que, embora não se tenha autorizado a requisição (obrigatoriamente deve ser atendida) dos RIFs com dados bancários, autorizou-se a sua solicitação pelas autoridades penais e o atendimento pelo Coaf, independentemente de autorização judicial (AgRg na RCL nº 61.944, j. 02.04.24). Um jogo de palavras que termina por fulminar a proteção ao sigilo dos dados bancários. Muda-se, no corpo do ofício endereçado ao Coaf, a denominação de requisição para solicitação e, voilà, a devassa está autorizada.

No mais, essa compreensão evidencia o tratamento diferenciado e incoerente dos sigilos fiscal e bancário pelo STF: de um lado, (1) os dados fiscais podem ser compartilhados espontaneamente pela Receita, mas não podem ser requisitados pelo MP sem autorização judicial, não havendo qualquer referência à possibilidade da tal “solicitação”; de outro lado, (2) as operações ativas e passivas em instituições financeiras, que consistem em dados bancários (artigo 1º LC 105/2001) podem ser compartilhadas espontaneamente pelo Coaf, mas, além disso e incoerentemente, admite-se que eles sejam diretamente solicitados pelas autoridades penais sem autorização judicial.

A decisão mais recente, no AgRg no RE nº 1.393.219, talvez já percebendo a incoerência entre os julgados, adianta-se para dizer ser “importante ressaltar que o relatório de inteligência financeira (RIF) a pedido não se confunde com requisição, porquanto compete à autoridade fiscal decidir se compartilha ou não a informação com o órgão responsável pela persecução penal”.

O argumento, contudo, é frágil por diversos aspectos. Além de se resumir, na prática e como já dito, a uma singela troca de etiquetas (apaga-se o termo requisição e coloca-se solicitação, mas a natureza das informações e o seu fluxo seguem os mesmos), é risível imaginar que o órgão administrativo vá negar o pedido ministerial, seja ele batizado de solicitação, requisição, requerimento, demanda ou postulação.

Menos rigor ao sigilo bancário

Ainda, a alegação de que, por ser uma mera “solicitação”, competiria ao Coaf decidir se compartilha ou não a informação com o órgão responsável pela persecução penal, termina por transferir ilegalmente para uma decisão administrativa, o que a lei federal condiciona à decisão judicial. Pela lógica, então, o MP poderia solicitar à Receita os dados fiscais do contribuinte e, querendo, o órgão fiscal os compartilharia livremente independentemente de autorização judicial?

Claro que não, e o STF, evidentemente, nunca disse o contrário.

Na prática, então, o STF trata com menos rigor o sigilo bancário, permitindo que ele seja relativizado por decisão de órgão administrativo e não judicial, enquanto trata com o rigor adequado, estipulado por lei federal, o sigilo fiscal.

E há razão que o justifique? Não há.

Primeiro, porque a disciplina legal no ponto é idêntica: (1) a proteção sigilo bancário e ao fiscal é extraída dos mesmos dispositivos constitucionais (artigo 5º, X e XI); (2) não há, nem no artigo 198 do CTN (exceções sigilo fiscal) e nem no artigo 15 da Lei nº 9.613/98 (exceção sigilo bancário), hipótese de exceção para compartilhamento por solicitação ou requisição. Em nenhum dos casos deveria ser autorizada.

Segundo, porque as recomendações do Gafi (Grupo de Ação Financeira Internacional), normalmente mencionadas pelo STF como justificativa para a exceção, (1) embora sugiram a possibilidade de elaboração de RIFs a pedido (solicitação), não vedam que esse pedido esteja condicionado à prévia autorização judicial, então não há conflito entre a recomendação e a legislação interna e, sim, complementação possível. E, (2) de qualquer modo, ainda que houvesse conflito, a recomendação não é impositiva e nem tem a força de lei derrogatória do artigo 1º, § 4º, da LC nº 105/2001, que prevalece sobre ela.

Terceiro, e por fim, porque os dados bancários são, por sua própria natureza, ainda mais sensíveis do que os dados fiscais: (i) de informações fiscais se inferem dados mais ou menos amplos, relativos à evolução patrimonial anual, quais negócios jurídicos tributáveis foram entabulados durante o ano etc.; (ii) de informações bancárias, diferentemente, é possível inferir uma gama muito maior de dados, como as transferências feitas diariamente ou hora a hora, dentro de um mesmo dia, as terceiras pessoas envolvidas nas transações, em alguns casos o local da transação e também o seu conteúdo, enfim, uma maior sensibilidade.

Portanto, se o tratamento era para ser diferente, deveria se restringir mais o acesso aos dados bancários, em razão da sua maior sensibilidade, e não o contrário.

Diante disso, o que se espera é que no julgamento da ADI nº 7.624 — proposta pelo CFOAB, que sustenta justamente a ilegalidade do pedido de RIF sem autorização judicial —, o STF faça nova reflexão sobre o tema, mais aprofundada e, agora sim, em uma ação em que a questão é especificamente discutida, os pontos relevantes são colocados e há substrato fático que permita à Corte entender as nuances da questão.

E que, ao fazê-lo, perceba que deve se dar ao tratamento do sigilo bancário o mesmo rigor dado ao sigilo fiscal: estes dados apenas podem ser acessados, a pedido, com autorização judicial, pois o atual entendimento da Corte tem legitimado a instauração de inquéritos policiais — às vezes, provocados por denúncia anônima —em que o primeiro ato é a solicitação de elaboração de RIFs com acesso direto aos dados bancários do investigado.


[1] Importante destacar que, de acordo com informações do Relatório de gestão Integrada do COAF, foram recebidas, em 2023, 7,6 milhões de comunicações dos sujeitos obrigados. Destas, quase 5 milhòes foram oriundas dos bancos, o que permite concluir que a maioria das informações que subsidiam a confecção dos RIFs são bancárias. Fonte: https://www.gov.br/coaf/pt-br/centrais-de-conteudo/publicacoes/publicacoes-do-coaf-1/rig-coaf-2023.pdf, acesso em 20 de agosto de 2024.

[2] Sobre o tema, importante ver as considerações feitas por Heloísa Estellita, no sentido de que, tratando-se de dados bancários,  subsiste o questionamento se tal autorização dependeria de lei complementar o que condicionaria a interpretação do artigo 15 da lei de lavagem aos limites do quanto disposto na LC 105/2001. ESTELLITA, H. O RE 1.055.941: um pretexto para explorar alguns limites à transmissão, distribuição, comunicação, transferência e difusão de dados pessoais pelo COAF. Direito Público, [S. l.], v. 18, n. 100, 2022. DOI: 10.11117/rdp.v18i100.5991. Disponível em: https://www.portaldeperiodicos.idp.edu.br/direitopublico/article/view/5991. Acesso em: 20 ago. 2024.

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Os contratos sucessórios na reforma do Código Civil

A nulidade absoluta infligida aos contratos sucessórios pelas codificações brasileiras (CC/1916, artigo 1.089; CC/2002, artigo 426) nunca encorajou a doutrina pátria a estudar o tema com a devida acuidade, até mesmo para questionar a conveniência de tal opção político-legislativa, que, cumpre registrar, abarcaria as suas três espécies, isto é, as avenças institutivas (que nomeiam herdeiro ou legatário), renunciativas (que veiculam a abdicação de vindouras participações hereditárias) e dispositivas (que transacionam futuros direitos mortis causa).

Como pudemos demonstrar em nossa tese de doutoramento, recentemente publicada pela editora Revista dos Tribunais [1], esse modelo assaz restritivo não vigorou em Roma e no período do ius commune, bem como nunca fora acolhido, por exemplo, pelo Code Napoléon e pela lei civil portuguesa de 1966, já que sempre restara consentida a validade de algumas hipóteses exceptivas.

Portanto, tem-se que a prática negocial sucessória não constitui realidade jurídica exclusiva da tradição germânica e dos derechos forales espanhóis, embora nesses ordenamentos, de fato, vislumbra-se uma liberdade contratual mais acentuada.

Ademais, em razão das recentes reformas empreendidas em alguns diplomas europeus, principalmente naqueles países que não contemplavam um permissivo transacional tão significativo, ampliou-se o assentimento de novos pactos causa mortis, como ocorreu, ilustrativamente, no direito francês, em 2001 e 2006, e, de forma pontual, em Portugal.

Aliás, somente com o advento da Lei nº. 48/2018, que alterou o codex lusitano para permitir a renúncia recíproca entre cônjuges à condição de herdeiro legitimário (necessário), é que essa temática passou a ser tardiamente ventilada entre nós, ainda que circunscrita aos ajustes abdicativos, havendo até mesmo quem defenda a aplicabilidade dos seus termos em nosso sistema independentemente de alteração legal. A propósito, considerando apenas o chamado mundo lusófono, salta aos olhos que tal variante de contrato de non succedendo já havia sido anteriormente albergada pelo artigo 1571º do Código Civil de Macau de 1999 [2], ou seja, com precedência de quase 20 anos à comutação da lex portuguesa. [3]

Assim, nesse contexto de ampliação da autonomia privada sucessória no direito estrangeiro, movimento que alguns adjetivam de autêntica contratualização da transmissão mortis causa, impõe-se a análise das proposições constantes do anteprojeto de reforma do Código Civil, apresentado pela Comissão de Juristas em abril de 2024, que almeja trazer novos contornos à matéria na legislação nacional.

Parecer da subcomissão de direito das sucessões

No âmbito da Subcomissão de Direito das Sucessões, o parecer ofertado supostamente pretendia a inserção de pactos aquisitivos e renunciativos, tanto que o caput do artigo 1.790-A dispunha que: “há sucessão contratual quando, por contrato, alguém renuncia à sucessão de pessoa viva ou dispõe sobre a sua própria sucessão”.

Contudo, analisando os parágrafos [4] do pretenso dispositivo percebe-se que havia uma profusão de matérias reguladas (doação; tutela post mortem de direitos da personalidade; regramento societário), mas nada, efetivamente, que disciplinasse os mencionados negócios hereditários.

Desta feita, apesar da promessa, pode-se afirmar que o esboço não estabelecia nenhuma modalidade de contrato institutivo.

Por outro lado, o artigo 1.808, §§ 5º a 7º [5], previa a figura do ajuste abdicativo exclusivamente entre cônjuges ou conviventes que, além da sua impertinente regulamentação conjunta com a renúncia da herança, ostentava uma basilar incoerência sistemática: os pactos renunciativos, por excelência, voltam-se à entabulação da abdicação daquele que não pode ser apartado unilateralmente do processo sucessório pelo auctor successionis, notadamente os sucessores contratuais, inexistentes no direito brasileiro em vigor e na proposta de lege ferenda, e os herdeiros necessários, que, nos termos projetados pelo parecer, voltariam a ser apenas os descendentes e os ascendentes, como outrora estatuído pelo revogado Código de 1916.

Logo, se o consorte e o companheiro poderiam ser excluídos da sucessão por disposição testamentária, tem-se que a adição da avença abdicativa nos moldes formulados não se justificaria, eis que destituída de maior finalidade.

Relatório final

Acertadamente, o Relatório final não acatou as sugestões referenciadas, proscrevendo particularmente o insólito artigo 1.790-A.

No entanto, manteve o contrato renunciativo unicamente entre cônjuges ou conviventes, alocando-o no novel artigo 426, cujo § 1º, inciso II, dispõe que: “Não são considerados contratos tendo por objeto herança de pessoa viva, os negócios: II- que permitam aos nubentes ou conviventes, por pacto antenupcial ou convivencial, renunciar à condição de herdeiro”.

Outrossim, o § 2º preceitua que: “Os nubentes podem, por meio de pacto antenupcial ou por escritura pública pós-nupcial, e os conviventes, por meio de escritura pública de união estável, renunciar reciprocamente à condição de herdeiro do outro cônjuge ou convivente”.

Por fim, o § 3º estatui que: “A renúncia não implica perda do direito real de habitação previsto no artigo 1.831 deste Código, salvo expressa previsão dos cônjuges ou conviventes”.

Como se pode aferir, o relatório final, apesar de inexplicavelmente rejeitar a sua essência hereditária, o que tecnicamente não se revela correto, ao menos logrou estabelecer uma função para o ajuste abdicativo no projetado sistema nacional: a renúncia transacionada do citado ius in re aliena, que, não se deve olvidar, constitui legado ex lege de natureza legitimária, não suscetível, pois, de privação unilateral pelo testador.

Até porque, conforme a proposta, além de não serem mais herdeiros necessários, o que, giza-se, autoriza o desprezo do consorte ou do companheiro em testamento, resta eliminada a concorrência sucessória na transmissão ab intestato, de modo que, estando apenas na terceira classe (artigo 1.829, inciso III), a sua abdicação favorecerá tão só os colaterais, conjectura que certamente não atrairá muitos interessados na sua estipulação.

Ponderações críticas

Sem embargo dos seus inequívocos méritos, parece-nos que o desconhecimento das potencialidades dos contratos sucessórios para um harmônico, estável e eficiente processo hereditário representa um dos aspectos mais questionáveis do anteprojeto, que se contrapõe não somente ao estuário normativo europeu, mas também à novel codificação argentina de 2014, eis que os anosos argumentos difundidos, particularmente aqueles que apontam para uma suposta imoralidade ou infringência aos bons costumes, tanto que recorrente a menção da locução pacta corvina, há tempos não mais estão a sensibilizar os doutrinadores e legisladores contemporâneos.

A experiência estrangeira comprova que os pactos institutivos, verbi gratia, desempenham um papel relevante na cômoda sucessão de uma sociedade empresarial e na retribuição por serviços prestados, assim como podem ser convenientemente manejados para garantir uma participação do cônjuge ou do convivente na divisão do espólio, sobretudo quando estes não titularizam nenhum quinhão reservatário, pois que em tais negócios, regra geral, a resilição unilateral não é admitida. Os acordos dispositivos e renunciativos, por sua vez, evitam uma indesejada pluralidade de coerdeiros, inclusive de descendentes e ascendentes, ou, por vezes, utiliza-se uma avença abdicativa apenas para reforçar a segurança jurídica de uma determinada transação (ex. doação), tal como acontece na renúncia antecipada à ação de redução.

Indubitavelmente, a mera recepção envergonhada e descontextualizada da lei portuguesa não condiz com a necessidade de modernização do direito brasileiro. Em verdade, talvez fosse então o caso de, no mínimo, copiar na íntegra a fórmula lusitana, mantendo o consorte e o convivente como herdeiros necessários, franqueando-se, em contrapartida, a renúncia à quota legitimária por meio de ajuste abdicativo, mormente quando a retirada de tais sujeitos do rol de sucessores obrigatórios, como se ambiciona, certamente enfrentará severas dificuldades políticas na sociedade e no Congresso.


[1] POLETTO, Carlos Eduardo Minozzo. Legítima Hereditária e Sucessão Contratual: Estudo Comparado da Autonomia Privada Sucessória. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2024.

[2] Art. 1571º. Renúncia à qualidade de herdeiro legitimário. A convenção antenupcial pode, desde que com carácter de reciprocidade, conter a renúncia à qualidade de herdeiro legitimário dos cônjuges.

[3] Ainda que em flerte com o cabotinismo, lembramos que em 2013 fizemos referência a essa disposição estrangeira. Cf. POLETTO, Carlos Eduardo Minozzo. Indignidade Sucessória e Deserdação. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 156.

[4] § 1º. É válida a doação, com eficácia submetida ao termo morte. § 2º. A transmissão hereditária dos dados contidos em qualquer aplicação de internet, bem como das senhas e códigos de acesso, pode ser regulada em testamento ou, na omissão deste, nos contratos celebrados entre titulares e usuários e as respectivas plataformas. § 3º. A reconstrução de voz e imagem após a morte se submete à mesma proteção dos direitos morais de autor. § 4º. A sucessão em participações societárias, ou na administração da sociedade, pode ser regulada nos instrumentos societários das sociedades em geral, sem prejuízo à legítima dos herdeiros necessários. § 5º. Na hipótese de que trata o parágrafo anterior, o valor da participação societária será avaliada com base em balanço patrimonial especialmente levantado na data da abertura da sucessão, avaliando-se bens e direitos do ativo, tangíveis e intangíveis, a preço de saída, além do passivo também a ser apurado de igual forma. § 6º Se o valor a que se refere o parágrafo anterior superar ao do quinhão atribuído em partilha ao sucessor contratual designado, este deverá repor ao monte o valor do excesso, em dinheiro. § 7º A sucessão contratual dos sócios ou administradores, quando expressamente regulada nos instrumentos societários ou pactos parassociais, se fará automaticamente após a abertura da sucessão, independentemente de autorização judicial. § 8º Em caso de morte de sócio ou administrador único, o Juiz poderá designar um administrador provisório até que se conclua a sucessão na sociedade. § 9º Os contratos sucessórios apenas são admitidos nos casos previstos neste Código, sendo nulos todos os demais, sem prejuízo do disposto no artigo 426.

[5] Art. 1.808. Não se pode aceitar ou renunciar a herança sob condição ou a termo. § 5º É admitida a renúncia prévia e recíproca a direitos sucessórios futuros, quando manifestada simultaneamente, por cônjuges ou companheiros em escritura pública. §6º É anulável a renúncia de todos os direitos sucessórios, quando o renunciante, na data de abertura da sucessão, não possuir outros bens ou renda suficiente para a própria subsistência. § 7º Na hipótese do parágrafo anterior, o juiz fixará os limites e a extensão da renúncia, de modo a assegurar a subsistência do renunciante.

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