Para Quarta Turma, consulta a órgãos públicos ou concessionárias não é obrigatória antes da citação por edital

​A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que a expedição de ofícios a cadastros públicos e concessionárias de serviços públicos antes da citação por edital não é obrigatória, mas uma possibilidade a ser avaliada pelo magistrado. A partir dessa posição, o colegiado negou provimento ao recurso especial de uma empresa que buscava anular sua citação em ação monitória.

“A norma processual não impõe a obrigatoriedade da expedição de ofícios a cadastros públicos e concessionárias de serviços públicos antes da citação por edital, mas apenas prevê essa possibilidade como uma ferramenta importante”, destacou o relator do caso, ministro Antonio Carlos Ferreira.

Na origem, um banco ajuizou ação de busca e apreensão contra a empresa por falta de pagamento de empréstimo garantido por alienação fiduciária. Após a conversão do litígio em ação monitória e a citação por edital, o juízo de primeiro grau rejeitou embargos monitórios opostos por curador especial e reconheceu a procedência do pedido do banco.

Em apelação ao Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios, a empresa alegou que a citação por edital deveria ser anulada, pois não foram esgotados os meios de localização da ré, como a expedição de ofícios às concessionárias de serviços públicos. A corte, contudo, rejeitou o recurso por avaliar que a medida é dispensável quando já realizadas pesquisas nos cadastros de órgãos públicos, com efetiva tentativa de citação em todos os endereços encontrados.

Obrigatoriedade de consulta representa formalismo excessivo

Segundo Antonio Carlos Ferreira, a jurisprudência do STJ afirma que a citação por edital pressupõe o esgotamento dos meios necessários para localização do réu, sob pena de nulidade. Nesse sentido, prosseguiu, o parágrafo 3º do artigo 256 do Código de Processo Civil (CPC) dispõe sobre os meios para encontrá-lo, incluindo a possibilidade – e não a imposição – de consulta a órgãos públicos ou concessionárias de serviços públicos.

O relator observou que o princípio da celeridade processual determina que o processo se desenvolva de maneira eficiente e ágil, evitando formalismos excessivos. Portanto, a expedição de ofícios a órgãos públicos e concessionárias, embora recomendável na maioria das situações, não é uma exigência automática.

“O julgador tem discricionariedade para avaliar, caso a caso, se a requisição de tais informações é necessária, conforme o contexto e as tentativas já realizadas. A obrigatoriedade absoluta dessas medidas oneraria o processo com formalidades que, em muitos casos, não trariam resultados práticos”, destacou.

O ministro lembrou ainda que o CPC usa a conjunção “ou” para indicar que o julgador tem a opção de buscar os dados do réu em cadastros de órgãos públicos ou nas concessionárias de serviços públicos, sem que as medidas sejam necessariamente adotadas ao mesmo tempo. Especificamente sobre a requisição às concessionárias, Antonio Carlos Ferreira citou precedente da corte reconhecendo que ela é apenas uma alternativa dada ao juízo (REsp 1.971.968).

“Assim, a verificação do esgotamento das tentativas de localizar o réu e a necessidade de expedição de ofícios aos órgãos públicos ou às concessionárias de serviços públicos deverão ser decididas de forma casuística, levando em consideração as especificidades de cada situação”, concluiu o relator.

Fonte: STJ

Posted in STJ

Câmara aprova projeto que cria o Estatuto da Vítima

A Câmara dos Deputados aprovou nesta quarta-feira (11) projeto de lei que institui o Estatuto da Vítima. A proposta detalha direitos e contém regras para a chamada justiça restaurativa, aplicável de forma preventiva ou após infrações penais ou não. O texto será enviado ao Senado.

 
Discussão e votação de propostas legislativas. Dep. Lídice da Mata (PSB - BA)
Lídice da Mata, relatora da proposta – Bruno Spada/Câmara dos Deputados

De autoria do deputado Rui Falcão (PT-SP) e outros, o Projeto de Lei 3890/20 foi aprovado na forma de um substitutivo da relatora, deputada Lídice da Mata (PSB-BA). “A vítima é mais do que mero sujeito passivo da infração – é sujeito de direitos”, disse a relatora, que defendeu um olhar diferenciado para as vítimas no Brasil.

Segundo o texto, a vítima terá direitos considerados universais, como à comunicação, à defesa, à proteção, à informação, ao apoio, à assistência e ao tratamento profissional.

Lídice da Mata explicou que o texto trata de vítimas de especial vulnerabilidade, como crianças, idosos, pessoas com deficiência e vítimas de crimes violentos, considerando suas necessidades específicas de proteção. “Nota-se a preocupação com o amparo a pessoas que são duramente afetadas por tragédias e que atualmente têm pouco ou nenhum apoio do Estado para superar o trauma vivenciado e se reerguer”, disse.

O autor da proposta, deputado Rui Falcão, ressaltou que, após 40 anos, a Câmara acolhe resolução das Nações Unidas sobre a criação de um estatuto da vítima.

Criança e adolescente
De acordo com o texto aprovado, se a vítima for criança ou adolescente, o poder público deverá garantir que seu interesse superior seja “uma preocupação primordial”, devendo prevalecer sempre abordagem sensível segundo a idade, maturidade, pontos de vista, necessidades e preocupações.

As normas do projeto se aplicam às vítimas de infrações penais, atos infracionais, calamidades públicas, desastres e epidemias, independentemente de nacionalidade ou vulnerabilidade individual ou social.

Calamidade pública
Quanto às vítimas de calamidades públicas, recursos do Fundo Nacional para Calamidades Públicas, Proteção e Defesa Civil (Funcap) poderão ser usados para ações de resposta quando compreenderem socorro e assistência às vítimas e reparação a elas.

Também em razão de calamidades públicas e catástrofes naturais, a Justiça pode, de maneira fundamentada, destinar as multas penais e os bens declarados perdidos para o custeio de tratamento e ressarcimento de despesas e reparação de danos causados às vítimas.

Direito à informação
Quanto ao direito à informação, o projeto aprovado diz que a vítima deve ser informada – desde o seu primeiro contato com as autoridades e servidores competentes – sobre várias questões, como:

  • serviços e órgãos públicos a que pode recorrer para obter apoio;
  • procedimentos para apresentar e acompanhar sua queixa ou notícia-crime;
  • possibilidade de ser notificada de decisões sobre a ação;
  • se residente em outro país, os mecanismos que pode utilizar no Brasil para defender seus interesses.

A interpretação de tratados internacionais deverá ser feita no melhor interesse do brasileiro vítima de violência em território estrangeiro, vedada a aplicação em casos de violência doméstica.

Agressor
O projeto garante à vítima o direito de ser comunicada imediatamente pelo Poder Judiciário da prisão, soltura ou fuga do suposto autor do crime; do arquivamento do inquérito policial; da condenação ou absolvição do acusado; da suspensão condicional da pena; e de quaisquer outros atos e decisões referentes à investigação e ao processo que possam colocar em risco sua integridade física, psíquica ou moral.

Assistência jurídica
Na comunicação com a vítima, o texto define que deve ser usada linguagem simples e clara, levando-se em consideração suas características pessoais, especialmente idade, maturidade, grau de escolaridade ou se for pessoa com deficiência.

Já o direito de orientação e assistência jurídica deverá ser assegurado independentemente da habilitação destas (Defensoria Pública, por exemplo) como assistente no processo criminal ou do ajuizamento de demanda cível associada ao evento que vitimou a pessoa.

 
Homenagem pelo Transcurso dos Quarenta Anos do Movimento das “Diretas Já”. Dep. Rui Falcão (PT-SP)
Rui Falcão, autor do projeto de lei – Zeca Ribeiro/Câmara dos Deputados

Proteção
Quanto à proteção da vítima, o texto prevê que o juiz deve adotar medidas coercitivas ou protetivas que impeçam a persistência no tempo dos efeitos da ação delituosa ou do evento traumático, como ser escutada em local físico ou digital separado do autor do delito e acolhimento e validação de seu depoimento, que não poderá ser questionado sem justa causa.

Em crimes contra a dignidade e liberdade sexual, a repetição de depoimento será proibida, assim como a formulação de perguntas de caráter ofensivo e vexatório em crimes de preconceito de raça ou cor.

Ressarcimento
Outra novidade em relação às normas vigentes é o direito da vítima de ser ressarcida pelas despesas em processos criminais necessárias à sua participação, sem prejuízo de reparação do dano causado.

Em caso de condenação com sentença transitada em julgado, o autor do crime, segundo sua capacidade financeira, deverá restituir os valores gastos pela vítima ou por sua família com tratamento médico, psicológico ou funeral.

Revitimização
O projeto aprovado prevê procedimentos para evitar que a vítima, especialmente em crimes de natureza sexual, tenha de relembrar os fatos, passando por uma revitimização.

Quando a vítima possuir uma vulnerabilidade especial, deve ser realizada avaliação individual dela para constatar isso e ela deverá ser informada sobre:

  • seu direito de ser acompanhada por pessoa de sua confiança;
  • direito de ser ouvida por pessoa do mesmo sexo, no caso de vítima de violência sexual, doméstica ou familiar; e
  • direito a um técnico ou servidor designado pela autoridade competente para ajudá-la a prestar seu depoimento por videoconferência ou teleconferência.

O projeto define como vítima de vulnerabilidade especial aquela em situação de fragilidade em razão de idade, sexo, raça, estado de saúde ou deficiência, devendo ser considerado ainda o grau e a duração da vitimização em função de consequências graves a seu equilíbrio psicológico.

Justiça restaurativa
A justiça restaurativa é definida pelo projeto como uma política pública que pode ser empregada antes, durante, após ou independentemente do processo penal ou cível. Poderá ocorrer ainda em situações de calamidade pública ou desastre natural. O objetivo é restaurar os efeitos causados pelo fato que vitimou a pessoa.

A participação dos envolvidos é voluntária, proibida qualquer forma de coação ou intimação judicial ou extrajudicial para as sessões.

Nessas sessões, haverá um facilitador e também podem participar dela familiares e representantes da comunidade atingida direta ou indiretamente.

Embora não seja obrigatório haver um acordo sobre a reparação, no caso de um acordo sobre matéria penal, seus efeitos somente valerão depois do trânsito em julgado da sentença, e o processo não será suspenso pela prática restaurativa penal.

Fonte: Câmara dos Deputados

Discussão sobre ICMS na base de cálculo de IRPJ/CSLL é infraconstitucional, decide STF

Maioria dos ministros seguiu o voto do relator, Barroso, que não vê questão constitucional a ser analisada

O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu contra o reconhecimento de repercussão geral na discussão sobre a inclusão do ICMS na base de cálculo do IRPJ e da CSLL apurados no regime do Lucro Presumido. A maioria dos ministros seguiu o voto do relator, ministro Luís Roberto Barroso, que não vê questão constitucional a ser analisada. Ficaram vencidos os ministros Alexandre de Moraes e Dias Toffoli.

Com a decisão de que o tema não é competência do Supremo, fica valendo a posição do Superior Tribunal de Justiça (STJ) sobre o assunto, contrária aos contribuintes, ou seja, pela inclusão do ICMS na base de cálculo do IRPJ e da CSLL no Lucro Presumido.

“O exame da questão sobre a inclusão do ICMS na base de cálculo do IRPJ e da CSLL exige a interpretação do Decreto-Lei 1598/1977, assim como da Lei 9249/1995, da Lei 9430/1996 e da Lei 9718/1998, de modo a apurar se são valores cuja dedução é autorizada pela legislação infraconstitucional”, afirmou o ministro Luís Roberto Barroso em seu voto.

A discussão sobre o ICMS na base de cálculo do IRPJ e da CSLL no regime do Lucro Presumido é considerada uma “tese filhote” do Tema 69, do STF, conhecido como “tese do século”. Por meio deste tema de repercussão geral, em 2017, o Supremo decidiu que o ICMS não compõe a base de cálculo do PIS e da Cofins. A Corte entendeu que o ICMS não representa faturamento, por ser uma verba transitória no caixa das empresas. Com o entendimento, surgiram teses para discutir diferentes situações de tributo na base de cálculo de outros tributos, envolvendo o próprio ICMS mas também o ISS, por exemplo.

Em maio de 2023, o STJ fixou o Tema 1008, que prevê que o ICMS integra a base de cálculo dos tributos. Na ocasião, a derrota dos contribuintes na discussão sobre o ICMS na base de cálculo do IRPJ e da CSLL evitou uma perda de R$ 2,4 bilhões anuais para os cofres públicos, conforme projeção do PLDO 2024. O entendimento que prevaleceu, por 5×1, foi de que a posição do STF no Tema 69 está restrita ao PIS e à Cofins e não pode ser estendida ao IRPJ e à CSLL apurados no lucro presumido.

A decisão se deu em ARE 1493235, movido pela Conex Eletromecânica Indústria e Comércio Ltda.

Fonte: Jota

Corregedoria-Geral da Justiça Federal cria rede de inteligência dos Juizados Especiais Federais

Iniciativa busca aprimorar a gestão de processos nos Juizados Especiais Federais e prevenir litígios repetitivos

A Corregedoria-Geral da Justiça Federal (CG) realizou, nesta segunda-feira (9), reunião com a Comissão Permanente dos Juizados Especiais Federais (JEFs) para discutir a criação da rede de inteligência vinculada à Turma Nacional de Uniformização (TNU). O encontro ocorreu na sede do Conselho da Justiça Federal (CJF), em Brasília (DF), em formato híbrido, e reuniu magistradas e magistrados dos Tribunais Regionais Federais (TRFs).

O objetivo da iniciativa é monitorar demandas judiciais no âmbito dos JEFs, prevenir o ajuizamento de litígios repetitivos, aprimorar rotinas cartorárias, fomentar soluções alternativas de conflitos e propor padronizações para a gestão de processos suspensos em todas as instâncias da Justiça Federal.

A reunião foi conduzida pelo vice-presidente do CJF, corregedor-geral da Justiça Federal e presidente da Comissão Permanente dos Juizados Especiais Federais, ministro Luis Felipe Salomão, que enfatizou a importância da proposta diante do alto volume de processos nos JEFs: “Mais de 60% da distribuição dos processos da justiça federal está nos juizados especiais. Temos expectativas muito boas de que o trabalho da rede de inteligência possa produzir frutos. A ideia é criar um canal de comunicação bem institucionalizado, com melhorias a curto e médio prazo”, destacou o ministro.

A proposta foi apresentada pela auxiliar da Corregedoria-Geral da Justiça Federal juíza federal Vânila Cardoso, que sublinhou a relevância de otimizar os fluxos de trabalho e evitar retrabalhos: “A ideia é fortalecer e racionalizar a gestão nos juizados, aproveitando o sistema já existente e criando uma rede de inteligência para atuar de forma sistêmica. Será criado um segundo grupo operacional, vinculado à TNU, com atenção especial às demandas específicas e integração de novos membros ao grupo decisório”, explicou a magistrada.

Segundo o secretário-geral do CJF, juiz federal Erivaldo Ribeiro dos Santos, a iniciativa representa um momento significativo para os juizados especiais: “Trazer os juizados para o centro dessa discussão no âmbito do Centro Nacional de Inteligência é essencial. Muitas vezes, julgamos temas na TNU acreditando que estão pacificados, mas, na prática, não estão. Esse olhar mais atento e sistêmico é extremamente válido”, destacou.

Também participaram da reunião o auxiliar da Corregedoria-Geral da Justiça Federal, juiz federal Otávio Henrique Martins, além da secretária Viviane da Costa, representando as servidoras e os servidores da TNU.

Fonte: CJF

Posted in CJF

Comissão aprova projeto que muda regra para audiência de retratação em casos de violência doméstica

A Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania da Câmara dos Deputados aprovou projeto para assegurar que a audiência de retratação nos casos de violência doméstica só será realizada se houver manifestação expressa da vítima, apresentada antes do recebimento da denúncia pelo juiz.

 
Deputado Ricardo Ayres fala ao microfone
Ricardo Ayres recomendou a aprovação da proposta – Mario Agra / Câmara dos Deputados

O Projeto de Lei 3112/23, de autoria da deputada Laura Carneiro (PSD-RJ), recebeu parecer favorável do relator, deputado Ricardo Ayres (Republicanos-TO).

A proposta, que altera a Lei Maria da Penha, foi analisada em caráter conclusivo e poderá seguir ao Senado, a menos que haja recurso para votá-la no Plenário da Câmara. 

Interpretação
O Supremo Tribunal Federal (STF) já confirmou a interpretação de que o juiz não pode, sem pedido da vítima, marcar audiência para que ela desista de processar o agressor nos crimes de violência contra mulher em que a ação penal seja condicionada a sua manifestação. 

A decisão do STF foi tomada em ação movida pela Associação Nacional dos Membros do Ministério Público (Conamp). Segundo a ação, alguns juízes designam a audiência por conta própria, sem a manifestação da vítima, e a ausência dela tem sido interpretada como renúncia tácita, com o arquivamento do processo.

Conforme a Lei Maria da Penha, a retratação da representação da vítima só é possível em momento específico, perante o juiz, em audiência anterior ao recebimento da denúncia, marcada para essa finalidade, e ouvido o Ministério Público. O objetivo é assegurar que a vítima deseja desistir da denúncia por vontade própria.

De acordo com o relator, a proposta inclui na legislação o que já foi acertado pelos tribunais superiores acerca do tema. “O texto promove a devida segurança jurídica no que tange à aplicação da Lei Maria da Penha”, argumenta Ricardo Ayres.

Fonte:Câmara dos Deputados

Senado aprova indicados para diretoria do BC

​O Senado aprovou os nomes de Izabela Correa, Gilneu Vivan e Nilton David para a diretoria colegiada do BC. Os novos diretores assumem a partir de 1° de janeiro de 2025, após serem nomeados pelo Presidente da República.  

Nilton David será Diretor de Política Monetária, no lugar de Gabriel Galípolo, que assumirá a Presidência do BC. Ele é formado em Engenharia de Produção pela Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (USP). Desde 2019 é Chefe de Operações na Tesouraria do Banco Bradesco. 

Izabela Correa foi indicada para a vaga de Carolina de Assis Barros, atual Diretora de Relacionamento, Cidadania e Supervisão de Conduta. Ela é analista do Banco Central, formada em Administração Pública pela Escola de Governo da Fundação João Pinheiro. Tem mestrado em Ciência Política pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e doutorado em Governo pela London School of Economics and Political Science (LSE). É a atual Secretária de Integridade Pública na Controladoria Geral da União (CGU). 

Gilneu Vivan substituirá Otávio Damaso na Diretoria de Regulação. Ele é analista do Banco Central, formado em Economia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), com especialização em Gestão Financeira (UFRGS) e mestrado em Gestão Econômica e Negócios pela Universidade de Brasília (UnB). Atualmente, é o chefe do Departamento de Regulação do Banco Central. 

Foro para execução de alimentos já iniciada pode mudar, ainda que autor seja maior e capaz

Para a Terceira Turma, o dispositivo legal que prevê alternativas para o cumprimento de sentença em ação de alimentos deve ser interpretado de forma favorável ao alimentando, mesmo que seja maior.

Para a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), após iniciado o cumprimento de sentença de prestação alimentícia promovido por alimentanda maior de idade e absolutamente capaz, é possível a remessa dos autos para o juízo do seu domicílio. Segundo o colegiado, o artigo 528, parágrafo 9º, do Código de Processo Civil (CPC), que prevê alternativas ao exequente para o cumprimento de sentença em ação de alimentos, deve ser interpretado da maneira mais favorável ao alimentando, ainda que seja maior de idade e capaz.

No caso, uma mulher maior e absolutamente capaz ajuizou ação de revisão de alimentos contra o pai, na qual houve acordo para fixar alimentos em favor da autora, devidamente homologado pelo juízo. Após iniciado o cumprimento de sentença no mesmo juízo, a alimentanda informou mudança de endereço e requereu a remessa dos autos para a circunscrição judiciária de seu novo domicílio.

O juízo que recebeu os autos suscitou o conflito negativo de competência, argumentando que não seria possível o declínio de ofício de competência relativa, conforme a Súmula 33 do STJ. Além disso, destacou que alterações posteriores à distribuição da ação – como a mudança de endereço da parte – não autorizariam a modificação do foro competente para o cumprimento de sentença de alimentos, nos termos do artigo 43 do CPC.

Juiz não pode limitar escolha do foro pelo exequente

A ministra Nancy Andrighi, relatora do conflito no STJ, lembrou que a competência para processar o cumprimento de sentença já foi absoluta, vinculada ao juízo que proferiu a decisão.

Contudo, segundo ela, após a edição da Lei 11.232/2005, essa competência se tornou relativa, permitindo ao exequente optar por outros foros – como o domicílio do executado, o local dos bens sujeitos à execução ou o local de cumprimento de obrigações específicas – para evitar o uso de cartas precatórias e assegurar maior eficiência na execução.

De acordo com a relatora, a escolha do foro pelo exequente não pode ser restringida pelo juízo, desde que haja comprovação de mudança de domicílio ou da localização de bens do devedor, podendo a solicitação ser feita antes ou durante a execução. A ministra acrescentou que, para o STJ, criar entraves ao processamento no foro escolhido pelo exequente contraria a efetividade da execução, especialmente nos casos de prestação alimentícia.

CPC traz normas específicas para beneficiar o alimentando

Nancy Andrighi ressaltou que o CPC traz normas específicas para beneficiar o alimentando, presumidamente vulnerável: o artigo 528, parágrafo 9º, assegura que o cumprimento de sentença possa ocorrer no seu domicílio, e ainda há as opções do artigo 516, parágrafo único.

“Desse modo, em cumprimento de sentença em favor de alimentando maior de idade, independentemente se já iniciado ou não o procedimento, é possível o declínio da competência, a requerimento da parte exequente, para o juízo que melhor confira efetividade à execução”, concluiu.

Quanto à Súmula 33, invocada pelo juízo suscitante, a ministra afirmou que a remessa do processo a outro foro decorreu de pedido expresso da exequente, o que afasta a alegação de declínio de ofício. “Acrescente-se que não se demonstrou qualquer prejuízo às partes em virtude da remessa dos autos. Não há nulidade sem prejuízo. Assim, conforme entendimento desta corte, inexiste nulidade em caso de eventual irregularidade em matéria de competência relativa quando não identificado prejuízo concreto e efetivo”, disse.

O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.

Fonte: STJ

Posted in STJ

Dia Internacional dos Direitos Humanos: você tem fome de quê?

Como celebramos há 75 anos, neste 10 de dezembro de 2024, a Declaração Universal de Direitos Humanos (DUDH) completará mais um capítulo de sua história marcada por enorme resiliência, o reiterado começar de novo e a resistência de uma humanidade que, compelida pelas atrocidades da Segunda Guerra Mundial, estabeleceu o mínimo civilizatório em nome da vida e da necessidade de uma convivência racionalmente sustentável.

Eleanor Roosevelt, então presidente da Comissão de Direitos Humanos da ONU, em 1948

Assim nasceu a Declaração Universal de Direitos Humanos como uma carta jurídica de princípios distribuídos em 30 artigos que posteriormente foram ancorados no Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos e no Pacto Internacional de Direitos Econômicos e Sociais de 1966, dando a consistência necessária para uma relação de exigibilidade contra os Estados signatários e responsáveis pelo desenvolvimento das cidadanias, observando-se a universalidade, a indivisibilidade e a relativização cultural dos diversos modelos e padrões de sociedade mundo afora.

Coube e caberá à Organização das Nações Unidas (ONU) fazer a gestão de efetividade da Declaração Universal de Direitos Humanos, vencendo, inclusive, sua própria crise enquanto maior referência multilateral entre os Estados no mundo, entregando o que se espera efetivamente, reequilibrando as forças econômicas e políticas dos países e promovendo um redesenho que traduza o novo mundo que tem fome de direitos humanos.

Neste contexto se insere o Brasil, signatário da Declaração Universal de Direitos Humanos que, na história mais recente, desde 1988 com a Constituição e o processo de redemocratização, adotou uma postura proativa de prospectar direitos humanos nas relações internacionais como uma estratégia de se consolidar como uma democracia moderna, que pudesse entre outros objetivos, se colocar no cenário internacional influenciando em alto nível os espaços multilaterais como a ONU.

Se no campo internacional foram muitos os compromissos e avanços, internamente, muitos desafios ainda seguem colocados em processos em curso na construção de um mínimo civilizatório de direitos humanos que possa denominar como uma Política Nacional de Direitos Humanos.

E é sobre essa fome de direitos humanos que o Estado brasileiro deve se dedicar como um termômetro do que somos e o que podemos oferecer a sociedade brasileira.

Afinal de contas, qual o tamanho da “Era de Direitos” brasileira anunciada em inúmeras leis internas sancionadas após o processo de redemocratização e as dezenas de tratados internacionais de direitos humanos assumidos em especial nos organismos multilaterais da Organização das Nações Unidas e na OEA-Organização dos Estados Americanos?

Sobre isso é importante registrar que neste contexto o Estado brasileiro contou com um Programa Nacional de Direitos Humanos que, em sua última versão, se consolidou por meio do Decreto nº 7.037/2009, o denominado PNDH-3.

Após a consolidação desse documento jurídico interno o fato mais importante a se destacar no cenário nacional, em termos da política nacional de direitos humanos, foi o atravessamento do Princípio do Retrocesso Social que se impôs em 2018, jogando o pouco que se consolidou com a nova democracia, desde 1988, num abismo de regressões que ainda são sentidas pela sociedade brasileira.

Hoje, ressentimo-nos pela necessidade de uma Política Nacional de Direitos Humanos que seja conduzida estrategicamente pelo Estado com a capacidade de não só recuperar o que foi soterrado, mas apresentar um novo signo de direitos humanos forjado na participação social.

Esse novo desenho terá também que situar o que se consolidou em termos de demanda social no mundo, especialmente pelo documento sombra que foi gerado no G20, pela agenda do G20 Social, destacando-se a necessidade de um enfrentamento à fome ao asseverar: “(…) em caráter de urgência e prioridade máxima, é imperiosa a adesão de todos os países do G20 e outros Estados, à iniciativa da Aliança Global contra a Fome e a Pobreza. Em alinhamento com os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável da Agenda 2030 da ONU”.

Importância do Conselho Nacional de Direitos Humanos

Logo, se temos a responsabilidade de desenvolver uma Política Nacional de Direitos Humanos que combine a recuperação do que foi afetado pelo retrocesso social de 2018 com uma nova ordem nacional para este campo de cidadanias, é preciso ouvir as vozes do G20 Social.

Ocorre que, atualmente, o principal órgão da Política Nacional de Direitos Humanos no Brasil, que reúne todos os predicados e pressupostos internacionais para fazer valer esse novo signo, não recebe o tratamento institucional adequado por parte do Estado e, mais que isso, é tido como uma “trincheira de entidades” que podem ameaçar o establishment.

Falamos aqui do Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH), órgão público do Estado brasileiro, instituído pela Lei Federal nº 12.986/14, composto por representações da sociedade civil eleitas e por representantes do Poder público dos três poderes da República.

O Conselho Nacional de Direitos Humanos, está completando 60 anos de história, sendo repaginado em 2014 e recebendo a atribuição de ser a instância controladora e deliberativa da Política Nacional de Direitos Humanos.

Não há dúvidas na engenharia política e normativa do Estado brasileiro que o caminho para a construção de um novo signo de direitos humanos no Brasil passa pelo reconhecimento institucional do CNDH como Instituição Nacional de Direitos Humanos, com base nos Princípios de Paris, sendo eles:

1. A instituição nacional deve ter uma área de atuação abrangente, prevista na constituição ou em lei; 2. A instituição nacional deve ter uma infraestrutura adequada para o bom desempenho de suas atividades; 3. A instituição nacional deve ter pessoal e instalações próprios, de modo a ser independente do Governo; 4. A nomeação dos membros da instituição deve ser realizada através de um ato oficial, que estabelecerá a duração específica do mandato.

Mas a realidade é outra. Não há na agenda governamental qualquer iniciativa de fazer deste órgão público de participação social uma Instituição Nacional de Direitos Humanos.

Ao contrário, são escassos os recursos orçamentários destinados ao CNDH, não possuindo o mesmo sequer um fundo especial próprio que garanta uma funcionalidade efetivamente autônoma e independente.

Sem recursos orçamentários satisfatórios, o Conselho Nacional de Direitos Humanos se movimenta como um “departamento” do Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania, com a resistência dos movimentos sociais e organizações que o integram e que lhe exigem outra postura, sobrevivendo com baixa institucionalidade e sem a força necessária para cumprir seu papel de principal instância da República para o tema.

E quando tratamos de recursos financeiros, é importante recuperar que na repaginação do CNDH, a força do capital se impôs, e foi-lhe retirado a possibilidade de aplicar sanções pecuniárias contra violações estruturais de direitos humanos, restando outras medidas que não tem o condão de impactar uma efetiva responsabilização.

Neste baixo grau de institucionalidade, o CNDH não consegue assumir seu papel de liderança para a construção de uma Política Nacional de Direitos Humanos que possa resultar na normatização de um Sistema Nacional de Direitos Humanos, sincronizando competências e responsabilidades de órgãos públicos e entidades no Estado brasileiro.

Por outro giro, se temos no debate quanto a ponderação de interesses entre as políticas identitárias ou as pautas econômicas numa Política Nacional de Direitos Humanos, somando-se a isso, o desafio do G20 Social quanto ao combate à fome, existe uma pedra no meio do caminho que acende a luz amarela: o discurso de ódio e os ataques institucionalizados contra a democracia no Estado brasileiro.

Hoje, no atual estado da arte no país, no que se refere a construção de uma Política Nacional de Direitos Humanos é urgente a construção de pontes que dialoguem com a sociedade para a criação de entendimentos e ações que possam enfrentar o discurso de ódio, especialmente perpetrado contra grupos minoritários como a comunidade LGBTQIA+, religiões de matriz africana, mulheres e pessoas com deficiência, entre outros.

E não há outro espaço institucional no Estado brasileiro que possa desempenhar esta missão que não seja o Conselho Nacional de Direitos Humanos, necessariamente convertido em Instituição Nacional de Direitos Humanos, considerando seu DNA de participação social dos movimentos sociais, classe trabalhadora e redes nacionais de direitos humanos.

É preciso considerar que as atrocidades da Segunda Guerra Mundial que levaram a humanidade a pactuar uma Declaração Universal de Direitos Humanos como uma resposta objetiva dos Estados, hoje se apresenta com uma nova forma que são os ataques de ódio na sociedade que, no Brasil necessitam de uma resposta institucional no campo das políticas públicas.

E é no aniversário de 76 anos deste importante documento internacional, frente às demandas e desafios colocados, especialmente em construirmos um novo signo que possa ancorar o mínimo civilizatório, que é possível e razoável   afirmar que se tratando de Brasil, não há outro caminho senão avançar na formulação de uma Política Nacional de Direitos Humanos que seja de Estado e não de Governos que se alternam em seus projetos políticos.

Para isso, não há alternativa que não seja a transformação do Conselho Nacional de Direitos Humanos em Instituição Nacional de Direitos Humanos, na forma dos Princípios de Paris, pois os tempos sombrios se reapresentam mundialmente, deixando claro que  quem tem fome de direitos humanos, tem pressa para salvar a democracia e a dignidade civilizatória  na humanidade.

O post Dia Internacional dos Direitos Humanos: você tem fome de quê? apareceu primeiro em Consultor Jurídico.

Supremo tem maioria para validar trabalho intermitente

O Supremo Tribunal Federal (STF) formou nesta sexta-feira (6) maioria de votos para confirmar a constitucionalidade do contrato de trabalho intermitente, inserido na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) pela reforma trabalhista de 2017.

Pelo placar de 6 votos a 2, os ministros mantiveram as mudanças na legislação trabalhista para inserir o modelo de contratação.

O caso voltou a ser julgado no plenário virtual da Corte após ser interrompido em setembro deste ano por um pedido de vista do ministro Cristiano Zanin, que votou nesta sexta-feira pela constitucionalidade da tese.

Além de Zanin, os ministros Nunes Marques, Alexandre de Moraes, André Mendonça, Luiz Fux e Gilmar Mendes se manifestaram a favor da legalidade das alterações na CLT.

O relator, Edson Fachin, e a ministra Rosa Weber, que se manifestou antes da aposentadoria, consideraram o trabalho intermitente inconstitucional.

Faltam os votos de quatro ministros. A votação virtual prossegue até o dia 13 de dezembro. 

As ações no STF que contestam o trabalho intermitente foram protocoladas por sindicatos que atuam na defesa de frentistas, operadores de telemarketing e dos trabalhadores da indústria.

Para as entidades, o modelo favorece a precarização da relação de emprego e o pagamento de remunerações abaixo do salário mínimo, além de impedir a organização coletiva dos trabalhadores.

Conforme definido na reforma trabalhista, o trabalhador intermitente recebe por horas ou dias trabalhados, e tem férias, FGTS e décimo terceiro salário de forma proporcional ao período trabalhado. No contrato, é definido o valor da hora de trabalho, que não pode ser inferior ao salário mínimo por hora ou à remuneração dos demais empregados que exerçam a mesma função.

O empregado deve ser convocado com, no mínimo, três dias corridos de antecedência. No período de inatividade, pode prestar serviços a outras empresas.

Fonte: EBC

Royalties decorrentes da licença da propriedade intelectual em contratos mistos

Repercussões tributárias da não segregação de royalties

Comumente, os bens da propriedade intelectual são ofertados em conjunto com uma série de outras utilidades, não raras vezes mediante único contrato e único pagamento, que se submetem a regimes tributários diferenciados.

Portanto, é relevante identificar quais os critérios de individualização dos royalties pagos em contraprestação à licença da propriedade intelectual frente a outros valores que são submetidos a regimes tributários diferenciados.

Pretende-se, com isso, mensurar os royalties devidos em operações que dão ensejo a essa modalidade de rendimentos e estabelecer parâmetros para aferir os tributos que incidem sobre royalties, que utilizem essa medida para apuração de créditos ou que tenham sua apuração determinada em qualquer medida por essa cifra.

Isso porque a legislação tributária federal impõe segregar as repercussões econômicas de cada uma das utilidades fornecidas em contratos mistos.

A orientação vigente no âmbito da Receita Federal, inclusive, é a de que, se o contrato não for suficientemente claro para individualizar os componentes (prestação de serviços, licença de bens intangíveis etc.), segregando royalties dos demais rendimentos pagos, toda a base será considerada para uma finalidade ou outra.

Para incidência da Contribuição ao PIS e da Cofins sobre os rendimentos pela prestação de serviços, o entendimento é reiterado em diversas manifestações fazendárias.

A não segregação dos rendimentos se reflete não somente na incidência dessas contribuições sociais, mas também na determinação do regime aplicável das contribuições e, no caso do regime não cumulativo, na apuração dos créditos devidos.

O artigo 10, XV, c/c §2°, da Lei n° 10.833/2003, estabelece que a tributação da receita decorrente do licenciamento de software nacional deve mantida no regime cumulativo da Cofins. Nos termos do artigo 15, V, o mesmo se aplica à Contribuição ao PIS.

Do mesmo modo, tem-se a inviabilidade da apuração dos créditos devidos, pois as despesas somente poderiam ser deduzidas na proporção da receita submetida ao regime não cumulativo, nos termos do §§ 7° e 8°, II, do artigo 3°, das Leis n° 10.637/2002 e n° 10.833/2003.

O tema repercute, ainda, na determinação das regras aplicáveis para evitar a bitributação da renda. Diversas são as repercussões no âmbito da tributação internacional, como a impossibilidade de aplicação adequada das cláusulas de tax sparing e matching credit, geralmente, utilizadas pelo Brasil em relação aos dividendos, juros e royalties.

Consequências são verificadas ainda na definição da alíquota do IRRF e na apuração das deduções do IRPJ.

Nos termos do artigo 2°, da Lei n° 10.168/2000, fica reduzida para 15% a alíquota do IRRF incidente sobre as importâncias pagas, creditadas, entregues, empregadas ou remetidas ao exterior a título de remuneração de serviços de assistência administrativa e semelhante, que sofram a incidência da Cide-Remessas. Ademais, de acordo com o parágrafo único do artigo 44 da Lei n° 14.596/2023, as despesas com royalties não são dedutíveis da apuração do lucro real em determinadas circunstâncias.

O problema se revela, ainda, na aplicação das regras de preço de transferência. Com a revogação § 9º do artigo 18 da Lei nº 9.430/1996, passa-se a aplicar tais regras às transações que envolvem os pagamentos de royalties em transações controladas pessoas jurídicas domiciliadas no Brasil e partes relacionadas no exterior.

Outra repercussão está na possibilidade ou não de aderir ao regime da CPRB e do método de apuração dessa contribuição. O artigo 7°, I, da Lei n° 12.456/2011, com a redação dada pela Lei n° 13.670/2018, permite que as empresas que atuam no licenciamento de programas de computação (hipótese do § 4°, V, da Lei n° 11.774/2008) adiram ao regime especial da CPRB – evidentemente, submetendo a receita dessa atividade a esse regime.

Verifica-se, ainda, a relevância do tema na incidência ou não do II e do IPI. O artigo 1° do Decreto-Lei n° 37/1966, em consonância com o artigo 19 do CTN, estabelece que o II incide sobre a importação de produtos estrangeiros. O artigo 131 do Regulamento do IPI, aprovado pelo Decreto nº 4.544/2002 prevê que a base de cálculo do IPI será o valor total da operação de que decorrer a saída do estabelecimento industrial ou equiparado a industrial.

Ainda, o Artigo VII do Acordo de Valoração Aduaneira, promulgado pelo Decreto nº 1.355/1994, estabelece que o valor aduaneiro, que serve de base de cálculo a tributos incidentes na importação, deve ser determinado pelo valor de transação, que, de acordo com o artigo 1°, corresponde ao preço efetivamente pago ou a pagar pela mercadoria importada, ajustado segundo as disposições do artigo 8 do AVA.

Outra consequência é verificada no regime da Cide-Remessas, que, nos termos da Lei n° 10.168/2000, é devida não somente pela adquirente de tecnologia estrangeira, mas também é devida pelas pessoas jurídicas signatárias de contratos que remeterem royalties, a qualquer título, a beneficiários residentes ou domiciliados no exterior.

Em todos esses casos, a não individualização dos royalties distorce a base de cálculo de incidência dos tributos ou dos créditos apurados nas operações. Verifica-se, portanto, a existência de inúmeras repercussões da correta ou incorreta mensuração desses rendimentos.

Trata-se de um problema que merece uma análise detida e uma solução concreta.

Há determinadas prescrições contábeis que auxiliam na mensuração dos royalties, especificamente, aquelas constantes do Pronunciamento CPC n° 47 e que, portanto, conduzem esta análise.

Alocação de preços e segregação de receitas

O artigo 58 da Lei n° 12.973/2014 determina que a modificação ou adoção de métodos e critérios contábeis posteriores à sua publicação não terá implicação na apuração de tributos federais até que a legislação tributária regule a matéria.

Por força desse dispositivo, a Receita se manifestou a respeito da aplicabilidade do CPC 47 para fins tributários, através da Instrução Normativa n° 1771/2017, que aprovou o Anexo IV da Instrução Normativa n° 1.753/2017.

Nessa norma, segregou-se as regras do CPC 47 em três grupos distintos: a) aquelas que “não contemplam modificação ou adoção de novos métodos ou critérios contábeis ou não têm efeito na apuração dos tributos federais”; b) aquelas que “contemplam métodos ou critérios contábeis que divergem da legislação tributária”; e c) aquelas que “contemplam modificação ou adoção de novos métodos ou critérios contábeis”, estas admitidas para fins tributários.

Neste último se encontram as regras sobre “a aplicação dos critérios para a alocação do preço de transação às obrigações de desempenho”.

Portanto, de acordo com a manifestação da Receita na IN n° 1.771/2017, não há nenhum óbice para a aplicação das regras do CPC 47 sobre alocação de preços para fins de tributação federal.

O CPC 47 tem como objetivo estabelecer métodos para o devido reconhecimento de receitas pela entidade quando esta transfere utilidades para os clientes, em valor que corresponda à contraprestação pelo qual a entidade espera ter direito, com base no contrato.

Para essa finalidade, o CPC 47 prevê 5 etapas: identificar o contrato com o cliente; identificar as obrigações de performance; determinar o preço da transação; alocar os preços da transação por cada obrigação de performance; e reconhecer a receita quando cada obrigação de performance for satisfeita.

Interessa à presente análise, em especial, a etapa n° 4, em que se aplicam as regras para alocação dos preços da transação para cada obrigação de performance. Isso porque pretende-se verificar a possibilidade de individualização da licença de propriedade intelectual que é remunerada por royalties como uma obrigação de performance autônoma, que não se confunde com outras operações realizadas simultaneamente e baseadas no mesmo contrato.

Para verificar a etapa 4, é necessário discorrer, brevemente, sobre as demais etapas.

A primeira etapa trata da identificação do contrato com cliente, que corresponde a um acordo individual formalizado por escrito, verbalmente ou sugerido pelas práticas usuais, que estabelece direitos e obrigações executáveis, cuja respectiva receita é de provável recebimento.

A segunda etapa dispõe que que cumpre identificar as obrigações de performance, que corresponde à “obrigação da entidade vendedora desempenhar a sua obrigação de repassar o controle do bem ou serviço à entidade compradora”. O CPC 47 indica, ainda, a possibilidade de que o contrato inclua entre os bens e serviços outras utilidades, dentre elas, a “concessão de licença”, que corresponde aos direitos à propriedade intelectual da entidade.

A terceira etapa prevê regras para definir o preço da transação. A entidade, com base no contrato firmado e nas práticas usuais do negócio, deverá estipular o valor da contraprestação devida pela transferência dos bens ou serviços ao cliente. Aqui, pretende-se estabelecer o valor global da transação, valor esperado a ser recebido pela entidade.

Então, tem-se a quarta etapa: alocar os preços da transação para cada obrigação de performance. Nesse momento, a entidade deve determinar o preço pelo qual a entidade ofertaria cada utilidade ao cliente separadamente e estabelecer, a participação de cada um desses preços, de forma proporcional, no preço da transação.

Para estabelecer o preço individual não diretamente observável pela entidade, ela deverá estima-lo e alguns métodos são estabelecidos pelo CPC 47 nesse sentido.

O primeiro método é a “abordagem de avaliação de mercado ajustada”, mediante a qual a entidade avalia no mercado em que está inserido o preço estimado que os clientes estão dispostos a pagar. Para tanto, a entidade pode recorrer aos preços aplicados pelos seus concorrentes ou tomar por base o preço de utilidades semelhantes e ajustá-las.

O segundo método é a “abordagem do custo esperado mais margem”, através do qual a entidade estabelece o custo que incorre para cumprir com a sua obrigação de performance e adiciona a margem que entende devida pela utilidade ofertada.

O terceiro método consiste em uma “abordagem residual”. A entidade subtrai do preço total da transação o valor da soma dos preços observáveis das demais obrigações de performance. Para utilizar esse método, a entidade deverá atender a alguns requisitos: oferecer a mesma utilidade a diferentes clientes, simultaneamente, por valores variados, nos casos em que os preços são altamente variáveis, não sendo depreendidos a partir de evidências observáveis; ou não ter a entidade estabelecido qualquer preço para a utilidade, que jamais foi ofertada individualmente pela entidade.

Determinada a alocação dos preços por obrigação de desempenho, tem-se a quinta etapa: reconhecer a receita quando cada obrigação de performance for satisfeita, quando há transferência do controle dos bens ou serviços ao cliente e não mais quando se transfere os riscos e benefícios da utilidade ofertada.

Ultrapassadas as cinco etapas, tem-se, então, a possibilidade de reconhecimento individualizado das receitas decorrentes de contrato com oferta de múltiplas utilidades.

Conclusão

Em contratos em que têm, simultaneamente, ofertas de serviços e bens tangíveis e intangíveis, podem ser aplicadas as regras para alocação do preço de cada operação.

A licença de bens intangíveis remunerada por royalties, enquanto operação para oferta de um bem deve ser interpretada como uma obrigação de performance. Em cada contrato, deverão ser analisadas as possibilidades de individualização dessa obrigação em cotejo com as demais utilidades.

Mediante as regras previstas pelo pronunciamento contábil que foram recepcionadas pela Receita, torna-se possível precisar os royalties devidos pela licença de bens intangíveis que são ofertados de forma conjunta com serviços e mercadorias.

Com tal esforço, tem-se uma proposta de solução para os problemas que surgem na aplicação da legislação tributária federal quando não há precisa individualização dos rendimentos de royalties.

Do ponto de vista dos tributos federais, a solução encontrada para tal problema pode ser encontrada na segregação de receitas entre cada uma das obrigações identificadas em um contrato híbrido. Essa segregação, como constatado, pode ser realizada mediante as técnicas de alocação de preços, previstas no CPC 47, que foi, neste ponto, acolhido pela Receita Federal.

A adoção da segregação tal como proposto, assim como viabiliza estabelecer com precisão a aplicação de diversas normas jurídico-tributárias que atribuem efeitos específicos ao reconhecimento e à mensuração de royalties, igualmente, impõe um esforço diferenciado aos contribuintes e ao fisco. Àqueles, pois deverão despender maiores esforços no sentido de aplicar corretamente os métodos de alocação de preço para fins tributários, além de expor a precificação das suas ofertas. Estes, porque deverão verificar se as informações prestadas pelo contribuinte são legítimas.

Não obstante se reconheça que esses fatores possam influenciar a consolidação das práticas jurídicas, a dificuldade intrínseca à tarefa não justifica a dispensa da sua adoção. Como visto, o sistema tributário nacional demanda que a segregação das receitas seja implementada.

O post Royalties decorrentes da licença da propriedade intelectual em contratos mistos apareceu primeiro em Consultor Jurídico.

Nota de alerta
Prevenção contra fraudes com o nome do escritório Aragão & Tomaz Advogados Associados