Cláusula de renúncia às benfeitorias em contrato de aluguel não se estende às acessões

Para a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), a cláusula de contrato de locação imobiliária que prevê renúncia à indenização por benfeitorias e adaptações não pode ser estendida à hipótese de acessão (aquisição do direito de propriedade sobre os acréscimos feitos no imóvel).

A partir desse entendimento, o colegiado restabeleceu a sentença que reconheceu o direito de um empresário a ser ressarcido depois de construir uma academia em propriedade alugada, mas não conseguir viabilizar o negócio por falta de regularização que dependia da locadora.

“A obra realizada pelo locatário configurou uma acessão – e não uma mera benfeitoria, até porque o valor por ele investido no imóvel alcançou um montante elevado, que supera o senso comum para uma simples adaptação do bem para suas atividades”, avaliou o relator do caso, ministro Marco Aurélio Bellizze.

Ação apontou enriquecimento sem causa da proprietária

Sem poder iniciar as atividades da academia, o empresário parou de pagar os aluguéis até que a situação do imóvel fosse regularizada, mas se viu obrigado a deixar o local devido à ação de despejo movida pela proprietária. Posteriormente, o imóvel foi alugado para outra pessoa que fez uso de toda a estrutura construída.

Por essa razão, o antigo locatário ajuizou ação alegando enriquecimento sem causa da dona do imóvel e pedindo indenização por danos materiais.

O juízo de primeiro grau acolheu o pedido, mas a decisão foi reformada pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP). A corte entendeu que a cláusula de renúncia ao direito de indenização estabelecida no contrato de locação abrangeria não só as benfeitorias, mas todas as alterações feitas no imóvel. Nessa situação, estaria incluída a construção (acessão) feita para adequar o local à atividade que o locatário pretendia desenvolver.

Benfeitoria e acessão não podem ser tratadas da mesma forma

O ministro Bellizze apontou que a existência de uma nova construção no imóvel ficou claramente demonstrada no processo, havendo divergência entre as instâncias ordinárias quanto ao alcance da cláusula de renúncia a indenizações.

Segundo o relator, é preciso diferenciar os conceitos de benfeitoria e acessão, institutos que não podem ser tratados da mesma forma: a primeira é uma melhoria de natureza acessória realizada em coisa já existente, enquanto a acessão é a aquisição da propriedade de acréscimos, nas formas previstas no artigo 1.248 do Código Civil (CC).

“Por isso, mostra-se inviável estender a previsão contratual de renúncia à indenização por benfeitoria também à acessão, notadamente porque o artigo 114 do CC determina que ‘os negócios jurídicos benéficos e a renúncia interpretam-se estritamente'”, observou Bellizze.

Código Civil prevê indenização para locatário que age de boa-fé

O magistrado ressaltou ainda que o locatário não pôde explorar a academia por falta de alvará de funcionamento, o qual não foi obtido devido ao desinteresse da proprietária do imóvel. “Ou seja, o locatário foi impedido de iniciar suas atividades em decorrência de ato da locadora”, disse, lembrando que, segundo o artigo 1.255 do CC, quem edifica em terreno alheio perde a construção para o proprietário, mas tem direito à indenização se agiu de boa-fé.

“O locatário procedeu de boa-fé, inclusive mediante autorização da locadora para a realização das obras, podendo-se cogitar a má-fé da proprietária, consoante presunção do artigo 1.256, parágrafo único, do CC, já que a construção se deu com o seu conhecimento e sem impugnação de sua parte”, concluiu o relator ao dar provimento ao recurso especial.

Leia o acórdão no REsp 1.931.087.

Fonte: STJ

É cabível recurso adesivo à apelação do advogado da parte contrária que apenas discute honorários

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por unanimidade, considerou válida a interposição de recurso adesivo quando a apelação é apresentada pelo advogado da parte contrária exclusivamente para discutir honorários de sucumbência. A partir desse entendimento, o colegiado rejeitou recurso especial segundo o qual não deveria ser conhecido um recurso adesivo vinculado à apelação em que o advogado apenas pretendia modificar a decisão sobre honorários.

“Trata-se de posicionamento que melhor se adequa à teleologia do recurso adesivo, porquanto propicia a democratização do acesso à Justiça e o contraditório ampliado”, destacou a relatora do caso, ministra Nancy Andrighi.

A origem do recurso especial foi uma ação de cobrança na qual um homem foi condenado a pagar R$ 35 mil a uma gráfica. Nenhuma das partes recorreu quanto ao mérito da decisão, mas a defesa do homem entrou com apelação alegando a ocorrência de erro no cálculo da verba honorária. O Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT) julgou prejudicada a apelação e deu provimento ao recurso adesivo da empresa.

No recurso especial, o devedor argumentou que apenas o autor e o réu de uma ação teriam legitimidade para entrar com recurso adesivo, instrumento processual que não poderia ser utilizado para apelo de terceiro – no caso, o advogado interessado em discutir a fixação de honorários.

Doutrina admite recurso adesivo a partir de apelação do advogado

A ministra Nancy Andrighi explicou que o recurso adesivo é admitido na hipótese de sucumbência recíproca entre as partes e se sujeita ao recurso principal, mas não há relação de subordinação quanto à matéria debatida pelo recurso principal.

Segundo a relatora, a controvérsia diz respeito à legitimidade para interposição do recurso adesivo. Em sua avaliação, a interpretação literal do artigo 997, parágrafo 1º, do Código de Processo Civil leva a crer que ele só poderia ser interposto pelas partes do processo e desde que uma delas tivesse apresentado o recurso principal.

No entanto, Nancy Andrighi disse se alinhar à corrente doutrinária que admite a possibilidade de interposição do recurso adesivo a partir de apelação exclusiva do advogado, pois esse entendimento “amplia a legitimidade para recorrer adesivamente”.

Atuação do advogado se assemelha à de parte processual

A ministra apontou que a jurisprudência do STJ já reconheceu a legitimidade concorrente da parte e do advogado para discutir verba honorária, o que permite concluir que os advogados que ingressam no processo para discutir direito próprio atuam com feição de parte processual.

“Logo, deve-se permitir a interposição de recurso adesivo quando interposto recurso principal pelos patronos da contraparte”, finalizou a relatora.

Posteriormente, o colegiado ainda rejeitou embargos de declaração do recorrente, por entender que não houve omissão quanto à análise dos argumentos submetidos ao tribunal.

Fonte: STJ

Não há honorários se embargos à execução são acolhidos apenas para reconhecer nulidade da citação

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que não são devidos honorários sucumbenciais em embargos à execução quando estes são acolhidos somente para reconhecer a nulidade da citação por edital no processo executivo. Para o colegiado, os honorários serão devidos apenas nos embargos à execução que resultarem em algum proveito econômico para o embargante.

No caso dos autos, um banco ajuizou ação de execução de título extrajudicial contra dois clientes que deixaram de pagar um empréstimo. Assistidos pela Defensoria Pública, por meio da curadoria especial, os executados opuseram embargos, alegando, entre outras questões, a preliminar de nulidade da citação, que foi feita por edital.

Após o juízo de primeiro grau rejeitar a preliminar e julgar improcedentes os embargos, o Tribunal de Justiça do Acre (TJAC) deu provimento à apelação para anular a execução desde a citação por edital, determinando, ainda, que as verbas sucumbenciais fossem definidas ao final do processo.

No recurso ao STJ, os executados sustentaram a necessidade de fixação de honorários sucumbenciais nos embargos, pois estes configuram ação autônoma. Segundo eles, a declaração de nulidade da citação nos embargos leva ao arquivamento dos respectivos autos, e não teria sentido falar em continuidade do processo para, somente ao fim da execução, ser definida a sucumbência.

Fixação dos honorários deve observar resultado prático alcançado

O ministro Marco Aurélio Bellizze, relator, afirmou que os embargos à execução constituem, de fato, uma ação autônoma, na qual o executado pede o reconhecimento de algum defeito relacionado ao direito material ou processual no título executivo extrajudicial, e suas alegações podem ser acolhidas no todo ou parcialmente, ou ainda rejeitadas, por meio de uma sentença.

“Ao ser proferida a sentença, consequentemente, serão observados os efeitos dela decorrentes, inclusive mediante a fixação de ônus sucumbenciais quando cabíveis, exatamente por se tratar de uma ação autônoma, observando-se, contudo, o resultado prático alcançado pelo embargante”, declarou.

Sentença não colocou fim ao processo executivo

No caso em análise, o ministro apontou que a corte de segundo grau reconheceu a nulidade da citação e determinou que a sucumbência fosse vista ao final, pois, apesar da autonomia dos embargos, a decisão não colocou fim à da execução. Dessa forma, de acordo com Bellizze, os assistidos da Defensoria Pública não se saíram vencedores na demanda, pois foi determinada nova citação, com o consequente prosseguimento do processo.

Em conclusão, o relator afirmou que a procedência dos embargos, apenas para reconhecer a nulidade de um ato processual e determinar a sua renovação, não justifica o pagamento de honorários – diferentemente do que ocorreria se os embargos tivessem sido acolhidos para julgar a execução improcedente, no todo ou em parte, ou para extingui-la, pois assim o embargante teria sido vitorioso.

Fonte: STJ

Corte Especial desmembra denúncia sobre esquema criminoso no Acre e mantém competência do STJ para processar o governador

Por unanimidade, a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu, nesta quinta-feira (14), desmembrar a denúncia apresentada pelo Ministério Público Federal (MPF) sobre suposto esquema criminoso instalado no Poder Executivo do Acre, mantendo no STJ apenas a acusação contra o governador do estado, Gladson Cameli. Como consequência, a denúncia contra os investigados que não têm foro por prerrogativa de função será distribuída para os juízos criminais competentes. Na mesma sessão, a Corte Especial prorrogou medidas cautelares anteriormente deferidas contra alguns dos investigados, mas não analisou o pedido apresentado pelo MPF para afastamento do governador do cargo. Cameli e mais 12 pessoas foram denunciadas por uma série de crimes relacionados a irregularidades em licitação e na execução de contrato com uma empresa privada. Eles são acusados pelo MPF por crimes como organização criminosa, corrupção ativa e passiva, peculato, lavagem de dinheiro e fraude à licitação. Iniciadas em 2019, as práticas ilícitas já teriam causado prejuízos de mais de R$ 16 milhões aos cofres públicos. O MPF falava inicialmente em prejuízo superior a R$ 11 milhões, mas notas técnicas da Controladoria-Geral da União indicam que os danos seriam ainda maiores. De acordo com o MPF, a denúncia decorre de fraudes na contratação da Murano Construções Ltda. – e na respectiva licitação – para a realização de obras de engenharia viária e edificação, pelas quais a empresa teria recebido R$ 18 milhões. As supostas irregularidades nesse contrato foram apuradas no contexto de uma investigação mais ampla, denominada Operação Ptolomeu.

Desmembramento de ações é a regra

A relatora do caso, ministra Nancy Andrighi, destacou jurisprudência do STJ no sentido de que, salvo casos excepcionais, a regra deve ser o desmembramento das ações penais em relação aos réus que não exerçam cargos que atraiam o foro por prerrogativa de função. Segundo a ministra, o tamanho do processo, a complexidade dos fatos e a quantidade de acusados na mesma ação poderia prejudicar a celeridade processual. A relatora também afirmou que o desmembramento não impede a apuração de todos os crimes, inclusive o de organização criminosa. “Embora pesem contra os réus as acusações de práticas de corrupção ativa e passiva, bem como de organização criminosa, esses elementos, por si só, não impõem o julgamento conjunto dos acusados, não devem determinar a excepcional prorrogação de foro e, consequentemente, não impedem o desmembramento do processo, já que a responsabilidade penal é subjetiva e, portanto, para ensejar eventual condenação, deve ser cumprido o ônus da acusação de comprovar individualmente as imputações em relação a cada acusado”, concluiu a ministra. Fonte: STJ

Jurisprudência em Teses traz novos entendimentos sobre registro de imóvel e ação reivindicatória

A Secretaria de Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) disponibilizou a edição 227 de Jurisprudência em Teses sobre o tema Registros Públicos, Cartorários e Notariais IV. A equipe responsável pelo produto destacou duas teses.

A primeira tese mostra que a inexistência de registro de imóvel objeto de ação de usucapião não induz a presunção de que o bem seja público (terras devolutas) e, por isso, cabe ao Estado provar a titularidade do terreno como óbice ao reconhecimento da prescrição aquisitiva.

O segundo entendimento aponta que em ação reivindicatória, deve prevalecer o primeiro título registrado em cartório, quando houver mais de um registro hígido para o mesmo bem imóvel.

A ferramenta

Lançada em maio de 2014, Jurisprudência em Teses apresenta diversos entendimentos do STJ sobre temas específicos, escolhidos de acordo com sua relevância no âmbito jurídico.

Cada edição reúne teses identificadas pela Secretaria de Jurisprudência após cuidadosa pesquisa nos precedentes do tribunal. Abaixo de cada uma delas, o usuário pode conferir os precedentes mais recentes sobre o tema, selecionados até a data especificada no documento.

Fonte: STJ

Informativo traz julgado sobre ANPP e antecedentes

A Secretaria de Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) divulgou a edição 797 do Informativo de Jurisprudência. A equipe de publicação destacou dois julgamentos nesta edição.

No primeiro processo em destaque, a Quinta Turma do STJ, por unanimidade, decidiu que o fato de o acordo de não persecução penal (ANPP) não gerar reincidência ou maus antecedentes não necessariamente implica o reconhecimento de “bom comportamento público e privado”, para fins de reabilitação criminal, conforme estabelecido no artigo 94, II, do Código Penal. A tese foi fixada no REsp 2.059.742, de relatoria do ministro Ribeiro Dantas.

Em outro julgado mencionado na edição, a Quinta Turma, por unanimidade, definiu que é nulo o julgamento do tribunal de júri que não possibilita ao Ministério Público diligenciar pela localização da testemunha arrolada com cláusula de imprescindibilidade. O AgRg no REsp 1.989.459 teve como relator o ministro Joel Ilan Paciornik.

Fonte: STJ

Processos enviados ao STJ com dados fora do padrão serão devolvidos aos tribunais de origem

A partir de 21 de janeiro de 2024, uma atualização no sistema eletrônico do Superior Tribunal de Justiça (STJ) fará com que todos os processos que não estiverem de acordo com os requisitos estabelecidos na Resolução STJ/GP 10/2015 sejam automaticamente recusados e devolvidos às cortes de origem para adequação.

O ajuste vai contribuir para que o STJ consiga enfrentar o grande volume de processos recebidos todos os dias, uma vez que, com o cumprimento das normas em vigor, o processamento inicial dos feitos se torna mais fácil e rápido, mediante o aproveitamento automático dos dados que já foram gerados pelas instâncias ordinárias.

Ao regulamentar o processo judicial eletrônico no STJ, a resolução (com suas atualizações posteriores) estabeleceu o Manual de Especificação de Dados e Indexação de Peças, com orientações técnicas específicas para cada classe processual a ser enviada à instância superior.

Da mesma forma, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) instituiu diretrizes (Resolução CNJ 46/2007Resolução CNJ 65/2008 e Provimento 61/2017) para uniformizar alguns aspectos processuais no Poder Judiciário.

A partir dessas regras, ficou estabelecido que, no momento da transmissão ao STJ, cada feito deve conter obrigatoriamente, entre outros dados: número único do processo; classe processual e assunto, ambos de acordo com as Tabelas Processuais Unificadas do Poder Judiciário; discriminação de todas as partes que integram a lide, com seus respectivos CPFs e/ou CNPJs; e indicação dos advogados, com os respectivos números de inscrição na OAB.

Apesar dessas orientações técnicas, muitos tribunais ainda remetem recursos fora dos padrões definidos na Resolução STJ/GP 10/2015, o que tem obrigado o STJ a adequar os processos individualmente, retardando a sua tramitação.

Erros estão relacionados a inconsistências ou falta de dados da autuação

O titular da Secretaria Judiciária do STJ, Augusto Gentil, afirmou que a maioria dos erros presentes nos processos encaminhados pelos tribunais de origem está relacionada à ausência ou à inconsistência de metadados. Segundo ele, é essencial que esses metadados (conjunto de dados processuais da autuação) sejam inseridos corretamente, pois vinculam todas as etapas de tramitação do processo.

Um levantamento feito em setembro deste ano pela Coordenadoria de Autuação e Controle de Dados Processuais do STJ identificou, em apenas um dia e somente na classe dos Agravos em Recurso Especial (AREsp), mais de 5 mil erros na autuação dos metadados. Segundo o estudo, os principais problemas encontrados foram: processos sem nome do advogado; sem o CPF da parte; sem indicação do agravante ou agravado; com o assunto sem o terceiro nível ou nível folha; sem indicação da unidade federativa (UF).

“A ausência de identificação de advogados e partes pode gerar uma nulidade por falta de intimação e comprometer a triagem dos impedimentos dos ministros. Já a omissão ou inconsistência da informação sobre presença de liminar implicará a não marcação da prioridade ao caso e pode comprometer o pedido. Da mesma forma, a omissão ou inconsistência da informação sobre segredo de justiça pode gerar publicidade indevida a processos com algum nível de sigilo”, explicou Augusto Gentil.

“Se não fizermos as ações corretivas, fica comprometido o fluxo do processo no STJ. Daí o porquê desse esforço enorme de conferência dos processos, que demanda um certo tempo”, acrescentou.

Fonte: STJ

O Dia Internacional dos Direitos Humanos celebrado em imagens e decisões do STJ

Neste 10 de dezembro, o STJ apresenta uma reflexão sobre os direitos humanos a partir de decisões históricas e da imagem de pessoas que têm razões muito especiais para comemorar a data.
Se a pauta dos direitos humanos carrega um elemento de força e resistência, na medida em que estiveram no centro de lutas históricas em sucessivas gerações, também há nesse tema um aspecto de fragilidade, pois sua conquista não é definitiva, e sua violação é uma ameaça real e diária. Os direitos humanos, afinal, são feridos a cada criança morta em uma guerra, a cada família que sofre sem comida ou um lugar para morar, a cada pessoa que padece sem atendimento médico adequado.

Direitos humanos queimam com incêndios criminosos na floresta, naufragam em barcos de refugiados à deriva, silenciam com o tolhimento da liberdade de expressão, têm as letras embaralhadas pela falta de educação.

Contra todas essas ameaças, pessoas e instituições têm o papel diário de proteger e reafirmar os direitos conquistados ao longo de gerações, cada qual em seu âmbito de atuação. Ao Poder Judiciário, cabe a função de resguardar tais direitos quando se pronuncia em litígios que envolvam a sua violação – e o Superior Tribunal de Justiça (STJ) foi responsável por diversas decisões que os colocaram em primeiro lugar.

Neste 10 de dezembro, Dia Internacional dos Direitos Humanos, o STJ apresenta uma reflexão sobre o tema a partir de pessoas que têm razões muito especiais para comemorá-lo – retratadas em fotos e no vídeo comemorativo produzido pela Secretaria de Comunicação Social do tribunal dentro do projeto Transformando Direitos: Justiça & Direitos Humanos, que integra as ações do programa Humaniza STJ.

Terra para indígenas é proteção de direitos fundamentais

Quando os direitos humanos encontram as questões indígenas, há um olhar que se volta ao passado e evoca a ancestralidade dos povos originários, suas lutas pela própria existência e suas perdas irreparáveis. O passado, contudo, está fadado a se repetir no presente e no futuro se não houver a intervenção da Justiça para que crianças como Lene Marya, de três anos, do povo Tapuia, possam continuar sorrindo e mantendo as suas tradições, como no registro feito na sala de julgamentos da Corte Especial do STJ.

Direitos humanos, passado e futuro foram temas do REsp 1.623.873, no qual a Primeira Seção garantiu ao grupo indígena Fulkaxó o direito de ver concluído, em prazo razoável, o processo administrativo para que o poder público lhe destinasse uma área específica para ocupação, em razão de conflitos existentes com o grupo Kariri-Xocó (do qual os primeiros se originam).

Segundo o processo, os conflitos entre os grupos decorriam não só da insuficiência de terras, mas de problemas na partilha de recursos e de desavenças sobre decisões políticas, costumes e tradições.

Relator do recurso da União, o ministro Gurgel de Faria lembrou que os conflitos entre os dois povos se mantinham desde 2006 e envolviam questões humanitárias e culturais. De acordo com o ministro, uma vez configurada demora injustificada do poder público para resolver controvérsias como a dos autos, o Judiciário pode determinar que o Executivo adote medidas para dar cumprimento aos direitos e às garantias fundamentais previstos na Constituição.

“Embora se reconheça a complexidade do procedimento de criação de reservas indígenas, a fixação de prazo pelo Poder Judiciário justifica-se pela urgência da solução dos conflitos e pela demora da administração pública na conclusão do processo administrativo em apreço, instaurado há anos”, concluiu o ministro ao negar provimento ao recurso da União.

Dedos para a música e para ver o mundo

Se a luz escapa aos olhos, o corpo se reinventa, aprimorando os demais sentidos. Dedos como o do pianista Daniel Cardoso, de 11 anos, são usados para a arte da música – como na foto tirada no Salão de Recepções do STJ – e também para enxergar o mundo pelo tato.

Essa percepção diferente da vida, que transforma as atividades básicas da pessoa com deficiência, deve ser levada em consideração para que ela possa exercer plenamente as suas capacidades.

Para garantir o direito de quem precisa enxergar de outras maneiras, a Terceira Turma, no REsp 1.315.822, decidiu que as instituições financeiras devem utilizar o sistema braille na confecção de contratos bancários a serem firmados por pessoas com deficiência visual (a Quarta Turma firmou entendimento semelhante no REsp 1.349.188).

O relator do recurso especial analisado pela Terceira Turma, ministro Marco Aurélio Bellizze, lembrou que a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência – adotada pelo Brasil com status de emenda constitucional – impõe a obrigação de assegurar a essas pessoas o exercício pleno e equitativo de todos os direitos, os quais incluem a acessibilidade física, a comunicação e a informação, além da autonomia e da independência.

Para o ministro, a não adoção do braille no processo de contratação bancária impedia as pessoas com deficiência de exercer, em igualdade de condições com os demais indivíduos, os direitos básicos de consumidor, caracterizando-se como discriminação intolerável.

No caso do consumidor com deficiência visual, segundo Bellizze, “a consecução desse direito, no bojo de um contrato bancário de adesão, somente é alcançada (de modo pleno, ressalta-se) por meio da utilização do método braille, a facilitar, e mesmo a viabilizar, a integral compreensão e a reflexão acerca das cláusulas contratuais submetidas a sua apreciação, especialmente aquelas que impliquem limitações de direito, assim como dos extratos mensais, dando conta dos serviços prestados, taxas cobradas etc.”

Futebol e outras terapias para pessoas com Down

Crianças são crianças, sejam quais forem suas condições de vida. Não surpreende, portanto, que o garoto Gustavo Chebli, de oito anos, tenha pegado sua bola ao ouvir que iria brincar em um gramado parecido com o dos estádios de futebol – ainda que esse campo fosse o jardim do STJ.

Para garantir que Gustavo e outras crianças com síndrome de Down possam continuar brincando, a Terceira Turma decidiu que os planos de saúde devem custear para elas terapias multidisciplinares sem limite de sessões (processo em segredo de Justiça).

Em análise do recurso da operadora do plano, a ministra Nancy Andrighi esclareceu que, segundo a posição mais recente da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), o fato de a síndrome de Down não estar enquadrada na Classificação Internacional de Doenças F84 (transtornos globais do desenvolvimento) não afasta a obrigação de cobertura do tratamento multidisciplinar prescrito para o beneficiário – e de forma ilimitada.

No caso específico da equoterapia – um dos tratamentos pleiteados pelo paciente na ação –, Nancy Andrighi também lembrou que a Lei 13.830/2019 reconheceu o método como eficaz na reabilitação e no desenvolvimento biopsicossocial da pessoa com deficiência.

“Ao assim fazê-lo, o legislador concretiza o fim do Estatuto da Pessoa com Deficiência, de assegurar e promover, em condições de igualdade, o exercício dos direitos e das liberdades fundamentais por pessoa com deficiência, visando à sua inclusão social e cidadania (artigo 1º da Lei 13.146/2015)”, afirmou a ministra, ressaltando que o direito de gozar do estado de saúde mais elevado possível está contemplado na Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência.

Idosos em movimento, nos salões ou nas estradas

Se as crianças devem ser livres e saudáveis para brincar, os idosos também têm o direito de se manterem felizes e ativos, e a dança parece ser um excelente aliado nesse objetivo. Deixando o sedentarismo de lado, o casal Ana Lúcia Fleury, de 72 anos, e Elizeu Rocha, de 71, aproveitou a oportunidade de dançar no salão do Pleno do STJ e desfilou sincronia em um ambiente normalmente ocupado pelos ministros nas sessões solenes ou administrativas.

Como não é só nos passos da dança que as pessoas da terceira idade precisam se movimentar, a legislação lhes assegura o direito ao transporte gratuito – ou com redução tarifária – em várias situações. Para dar efetividade a esse direito, a Primeira Turma definiu que, no transporte coletivo interestadual, a reserva de duas vagas gratuitas por veículo para idosos com renda igual ou inferior a dois salários mínimos – prevista no artigo 40, inciso I, do Estatuto da Pessoa Idosa – abrange não só o valor das passagens, mas os custos relacionados diretamente ao serviço de transporte, como as tarifas de pedágio e de utilização de terminais (REsp 1.543.465).

Como destacou o relator do caso julgado pela turma, ministro Napoleão Nunes Maia Filho (aposentado), a gratuidade do transporte rodoviário interestadual para os idosos não advém apenas da Lei 10.741/2003, pois tem base eminentemente constitucional.

“Nota-se, nesse particular, que o constituinte teve especial atenção ao transporte dos idosos, considerando tratar-se não só de um direito, mas de verdadeira garantia, que tem por escopo, além de facilitar o dever de amparo ao idoso, assegurar sua participação na comunidade, bem-estar e dignidade, conforme o disposto nos artigos 229 e 230 da Constituição Federal“, apontou.

De acordo com o ministro, ao reservar duas vagas por veículo para passageiros idosos de baixo poder aquisitivo, o Estatuto da Pessoa Idosa excluiu a possibilidade de cobrança de taxas adicionais dos beneficiados pela gratuidade.

A dança que evoca a luta contra o preconceito

Motivo de saúde e longevidade para o casal de idosos, a dança ganha um elemento adicional nos movimentos de Júlio Cesar: o combate ao preconceito. Com os pés descalços e trazendo na roupa símbolos da luta antirracista, o professor de dança negra contemporânea apresentou uma coreografia diante das colunas criadas pela artista plástica Marianne Peretti para a fachada do STJ.

Nos últimos anos, a luta pela equidade racial teve avanços importantes no ordenamento jurídico, como em 2021, quando o Supremo Tribunal Federal (STF) equiparou a injúria racial ao crime de racismo, tornando-a imprescritível, e neste ano, com a edição da Lei 14.532/2023, que definitivamente tipificou a injúria racial como racismo.

Antes desses marcos mais recentes, contudo, o STJ já havia se manifestado pela possibilidade de equiparação entre a injúria e o racismo. Um desses precedentes foi o AREsp 686.965, de 2015, no qual a Sexta Turma afastou a prescrição em crime de injúria racial.

Segundo o relator, desembargador convocado Ericson Maranho, a injúria racial é imprescritível por ser um delito que traduz preconceito relacionado à cor e leva à segregação, somando-se, portanto, à lista das condutas definidas na Lei de Crimes Raciais (Lei 7.716/1989), que não é taxativa.

Fonte: STJ

Repetitivo vai discutir dedução de contribuições extraordinárias à previdência complementar no IRPF

A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) afetou os Recursos Especiais 2.043.775, 2.050.635 e 2.051.367, de relatoria do ministro Benedito Gonçalves, para julgamento sob o rito dos recursos repetitivos.

A controvérsia, registrada como Tema 1.224 na base de dados do STJ, é sobre a “dedutibilidade, da base de cálculo do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF), dos valores correspondentes às contribuições extraordinárias pagas a entidade fechada de previdência complementar, nos termos da Lei Complementar 109/2001 e das Leis 9.250/1995 e 9.532/1997“.

O relator destacou que o tema dos recursos especiais é apresentado de forma reiterada no STJ. Segundo Benedito Gonçalves, a corte registrou, entre fevereiro de 2020 e abril de 2023, 51 processos sobre a mesma questão. Nos Tribunais Regionais Federais, já em segundo grau de jurisdição, a pesquisa realizada pela Comissão Gestora de Precedentes e de Ações Coletivas identificou mais 4.188 processos semelhantes.

“O requisito da multiplicidade recursal, portanto, está preenchido diante do elevado número de processos com idêntica questão de direito, a justificar a afetação da temática sob o rito dos recursos repetitivos“, observou o ministro.

Com base nesses dados, Bendito Gonçalves determinou a suspensão, em todo o território nacional, de todos os processos que tratem da mesma matéria, conforme previsão do artigo 1.037, II, do Código de Processo Civil (CPC).

Recursos repetitivos geram economia de tempo e segurança jurídica

O CPC regula, nos artigos 1.036 e seguintes, o julgamento por amostragem, mediante a seleção de recursos especiais que tenham controvérsias idênticas. Ao afetar um processo, ou seja, encaminhá-lo para julgamento sob o rito dos repetitivos, os ministros facilitam a solução de demandas que se repetem nos tribunais brasileiros.

A possibilidade de aplicar o mesmo entendimento jurídico a diversos processos gera economia de tempo e segurança jurídica. No site do STJ, é possível acessar todos os temas afetados, bem como conhecer a abrangência das decisões de sobrestamento e as teses jurídicas firmadas nos julgamentos, entre outras informações.

Fonte: STJ

STJ No Seu Dia fala sobre cidadania ambiental

​O mais novo episódio do podcast STJ No Seu Dia traz o tema cidadania ambiental. No bate-papo com os jornalistas Fátima Uchôa e Thiago Gomide, a redatora do portal de notícias do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Júlia Azambuja conta detalhes de uma reportagem especial que escreveu sobre o assunto.

Júlia aponta que, diante dos eventos climáticos extremos vividos em 2023 e de previsões de impactos ainda mais intensos em 2024, a preservação do meio ambiente se firmou entre as maiores preocupações mundiais, convidando cada um a refletir sobre a própria responsabilidade nesse tema.

Segundo ela, “a proteção do meio ambiente é uma das faces do exercício da cidadania. O cumprimento dos deveres individuais e coletivos em favor do desenvolvimento sustentável, fruto da consciência sobre o direito desta e das futuras gerações a um ambiente saudável e equilibrado, tem nome: cidadania ambiental”.

A redatora lembra que, com a promulgação da Constituição Federal de 1988, o meio ambiente ecologicamente equilibrado foi erguido ao patamar de um verdadeiro direito fundamental.

“Na esteira das diretrizes constitucionais, surgiram diversas leis que disciplinam temas sobre o meio ambiente, como a Lei de Crimes Ambientais (Lei 9.605/1998), a Política Nacional de Recursos Hídricos (Lei 9.433/1997) e o Código Florestal Brasileiro (Lei 12.651/2012)”, acrescenta.

Fonte: STJ