‘Contribuições e fundos estaduais’, reforma tributária e agronegócio

A partir da inovação promovida pelo Mato Grosso do Sul, que, 1999, criou o Fundersul, nos termos da Lei nº 1.963 e posteriores alterações, tivemos a edição, por diversos estados da federação, de uma “contribuição” facultativa ou outras formas de cobrança, destinada a fundos estaduais para, teoricamente, investimentos em infraestrutura e habitação, tais como Fethab (Fundo Estadual do Transporte e Habitação de Mato Grosso — Lei nº 7.263/2000), FDI (Fundo do Desenvolvimento Industrial do Maranhão — Lei nº 8.246/2005), TFTG  (Taxa de Transporte de Grãos e Minérios do Maranhão — Lei nº 11.687/2022 [1]), FET (Fundo Estadual de Transporte do Tocantis — Lei nº 3.617/2019 [2] posterior alteração pela Lei nº 4.303/2023) e Fundeinfra (Goiás — Lei nº 21.670/2022).

Em geral, tais exigências estaduais configuram formas de cobrança pelos estados, na maioria das vezes, sob a roupagem de uma “contribuição facultativa”, de valores incidentes sobre a operação com mercadorias, principalmente, produtos relacionados ao agronegócio (por exemplo, soja, milho, carnes, entre outros), tal como o ICMS, como condição ao gozo de alguma espécie de regime diferenciado de tributação daquele imposto estadual, inclusive, nas hipóteses de exportação.

Já tivemos oportunidade em outro momento nesta coluna de apresentar críticas ao Fundeinfra [3], no entanto, voltamos ao tema diante da aprovação da Emenda Constitucional nº 132/2023 (Reforma Tributária).

De forma ampla e geral, tais “contribuições” estaduais podem ser reconhecidas, com clareza meridiana, como inconstitucionais, uma vez que fogem completamente à própria estrutura conformadora do texto constitucional brasileiro, que exige a atuação do legislador seja racional, agindo com certa coerência a fim de atingir com exatidão as regras e princípios preestabelecidos pelo constituinte. E convenhamos, não há qualquer condição de reconhecer racionalidade legislativa quando se institui uma exigência, seja qual for a natureza desta, que tenha por finalidade precípua onerar o setor do agronegócio, principalmente, quanto às exportações.

Ora, entre os fundamentos do Estado democrático Brasileiro está a dignidade da pessoa humana (artigo 1º), que, por essência, tem como ponto de proteção e promoção o mínimo existencial, de tal sorte que, entre as atividades do agronegócio, a produção de alimentos, há de ser resguardada, até porque, garante também o direito à vida (artigo 5º), além de ser um direito social (artigo 6º — direito alimentação),  exigindo políticas publicas efetivas e de atuação positiva a fim de concretizar, de fato, este direito fundamental. Mais do que isso, nosso texto constitucional impõe, como política pública ligada à cadeia do agronegócio, o seu fomento e incentivo, inclusive, por meio de instrumentos fiscais e creditícios (artigo 187, CF).

Com isso, não nos parece fazer sentido algum a criação de uma contribuição ou qualquer forma de exação que caminhe no sentido oposto ao que se preconiza no texto constitucional para o setor.

Irracionalidade legislativa e incoerência

E a irracionalidade legislativa e incoerência não se resume a este ponto. Isto porque, esta forma de oneração do setor atinge, inclusive, as exportações, que, sob todo ponto de vista da Constituição, tem como pressuposto básico a exoneração, na medida em que, no comércio internacional, temos o princípio do destino.

Portanto, o caminhar inicial por tais exigências já nos leva a reconhecer uma total contradição e incoerência com nosso sistema jurídico constitucional ao onerar a cadeia do agronegócio e, sobretudo, as exportações.

O vício, no entanto, fica ainda mais evidenciado quando percebemos que, sob a perspectiva de um Estado Fiscal, é natural que os estados da federação, tenham formas de obter suas receitas, especialmente, por tributos. Todavia, ao se buscar encontrar a natureza de tais cobranças e as formas de sua obtenção, não conseguimos identificar a origem, pois, não seria de natureza originária (como, aluguel, preço público, entre outros), como também, segundo tais Estados, não configuram a derivada (fruto, em especial, dos tributos).

A grande verdade é que tais receitas estatais necessitam ter fundamento em algum tipo de atuação autorizada pelo texto constitucional, não podendo ser uma via estranha à esta permissão. E, diante deste aspecto, nos parece que, evidentemente, o Poder Público, driblando ou, melhor dizendo, “fraudando” a Constituição, notadamente, a estrutura rígida de competência tributária estabelecida, criou um tributo travestido de “contribuição” facultativa exatamente para não se submeter aos limites jurídicos postos. Algo grave e que não pode passar despercebido, como, ainda, na atualidade, tem ocorrido.

São, deveras, “tributos ocultos”, que tomam por base e estrutura nitidamente o ICMS e promovem a cobrança de um adicional, em detrimento inclusive do que estabelece o artigo 3º, do Código Tributário Nacional. Com todo respeito, afirmar que existe uma opção ou faculdade (voluntariedade) no recolhimento de tais contribuições a fim de afastar a natureza de tributo, somente pode ser completo desconhecimento da prática cotidiana de quem sofre esta exação ou tamanha inocência que foge ao razoável.

Ora, tais exações são imposições, decorrentes de lei, mediante coerção/coação do Estado a fim de obter receita, impondo ao administrado — contribuinte — a obrigação de recolhimento. Uma efetiva compulsoriedade, pois, na prática, não existe verdadeira opção ou escolha, já que a única alternativa viável para a continuidade do exercício da atividade, inclusive, em condições de igualdade e livre iniciativa, somente se dá a partir do gozo de tais regimes. E o pior: como onerar a cadeia do agronegócio, como já dito, criando uma condição onerosa, quando o propósito do texto constitucional é exatamente o oposto?

A voluntariedade, em si, não retira a natureza jurídica tributária, vejamos o próprio exemplo, do Simples Nacional, ou mesmo, decisão do próprio Supremo Tribunal Federal que reconheceu à Taxa da Suframa, como requisito para o gozo de incentivos na Zona Franca, a natureza tributária [4].

Justificativa pouco aceitável

A justificativa da facultatividade fica ainda menos aceitável quando a contrapartida é exatamente o próprio cumprimento da Constituição quanto à exoneração das exportações. Isto porque, poderia o Estado condicionar o gozo da imunidade tributária? Ora, a imunidade tributária é um direito objetivo e incondicionado, não havendo liberdade ao legislador, muito menos, dos estados, de estabelecer restrições e dificuldades ao seu gozo, de tal sorte que não há aderência argumento no sentido de que seria o pagamento da contribuição uma “sanção premial”.

É certo que o STF, de forma açodada e sem discutir, com profundidade, todos os vícios e problemas de tais contribuições, já chegou a julgar constitucional o Fundersul [5] e, recentemente, após reconhecer a inconstitucionalidade do FET [6], dada a falta de habilidade do Estado de Tocantis de não “camuflar” sua cobrança como “contribuição facultativa”, fazendo somente recentemente pela Lei nº 4.303/2023, além de extinguir Ações Diretas de Inconstitucionalidades ajuizadas impugnando o Fundeinfra [7], restando, porém, em andamento, a ADI quanto ao Fethab para as exportações [8].

O ponto central deste texto é exatamente, diante de todo este contexto de vícios e problemas jurídicos relacionados às “contribuições estaduais”, que oneraram, indevidamente, a cadeia do agronegócio, compreender o advento do artigo 136, da ADCT, a partir da Emenda Constitucional n. 132/2023, que prescreve:

Art. 136. Os Estados que possuíam, em 30 de abril de 2023, fundos destinados a investimentos em obras de infraestrutura e habitação e financiados por contribuições sobre produtos primários e semielaborados estabelecidas como condição à aplicação de diferimento, regime especial ou outro tratamento diferenciado, relativos ao imposto de que trata o art. 155, II, da Constituição Federal, poderão instituir contribuições semelhantes, não vinculadas ao referido imposto, observado que:     (Incluído pela Emenda Constitucional nº 132, de 2023)

I – a alíquota ou o percentual de contribuição não poderão ser superiores e a base de incidência não poderá ser mais ampla que os das respectivas contribuições vigentes em 30 de abril de 2023;     (Incluído pela Emenda Constitucional nº 132, de 2023)

II – a instituição de contribuição nos termos deste artigo implicará a extinção da contribuição correspondente, vinculada ao imposto de que trata o art. 155, II, da Constituição Federal, vigente em 30 de abril de 2023;     (Incluído pela Emenda Constitucional nº 132, de 2023)

III – a destinação de sua receita deverá ser a mesma das contribuições vigentes em 30 de abril de 2023;     (Incluído pela Emenda Constitucional nº 132, de 2023)

IV – a contribuição instituída nos termos do caput será extinta em 31 de dezembro de 2043.     (Incluído pela Emenda Constitucional nº 132, de 2023)

Parágrafo único. As receitas das contribuições mantidas nos termos deste artigo não serão consideradas como receita do respectivo Estado para fins do disposto nos arts. 130, II, “b”, e 131, § 2º, I, “b”, deste Ato das Disposições Constitucionais Transitórias.    (Incluído pela Emenda Constitucional nº 132, de 2023)

O artigo 136 dos ADCTs atribui uma ‘nova” competência tributária para alguns e específicos estados que, em 30 de abril de 2023, tinham fundos para a investir em obras de infraestrutura e habitação, cujo financiamento era constituído da arrecadação de contribuições facultativas sobre produtos primários e semielaborados, como condição ao gozo de regimes especiais ou diferenciados de ICMS.

Em síntese: aquelas contribuições tidas como de natureza não tributaria, até então, ressurgem, por meio do artigo 136, dos ADCTs, a partir de uma autorização constitucional, podendo ser reeditadas, agora como um tributo.

De antemão, apesar do jogo formal e de palavras, soa obvio e ululante o reconhecimento de que tais contribuições estaduais sempre tiveram, apesar de falta de autorização da Constituição, a natureza de tributo. Somente se evitava o efetivo reconhecimento, pois, nitidamente haveria a inconstitucionalidade.

Aliás, entre os princípios republicanos estampados no texto constitucional está a moralidade [9], que exige do Poder Público, inclusive, legislativo — mesmo no poder de reforma — o seu respeito[10]. Isto porque, nos parece totalmente contrário a um comportamento ético e lastreado pela boa-fé objetiva, em total contradição ao que até então se afirmava, reconhecer, por meio de emenda, uma natureza tributária de tais contribuições (“vedação do “venire contra factum próprio”). Soa estranho, provocador, sem respeito à ética e boa-fé que a moralidade exige do Poder Público, mesmo na edição de emendas à constituição. [11]

Daí porque, esta alteração somente reforça e confirma que, desde sempre, tais contribuições tinham natureza tributária e, por conseguinte, seriam inconstitucionais. Isto, inclusive, gera uma grande celeuma, pois, assim sendo, poderia a emenda constitucional convalidar uma contribuição inconstitucional? Nos parece que não haveria convalidação das leis inconstitucionais, o que, inclusive, é o posicionamento da jurisprudência do Supremo, impedindo a constitucionalidade superveniente. [12]

E, por conseguinte, sendo inconstitucionais as contribuições editadas em 30 de abril, não haveria o cumprimento da condição inicial para uma posterior edição da “nova” contribuição, como autorizado pelo artigo 136 dos ADCTs. Neste sentido, tal impossibilidade já se torna mais que sacramentada ao Tocantis, diante da inconstitucionalidade do FET declarada pelo STF. [13]

Independentemente desta problemática, nos parece que referida emenda é inconstitucional, pois, mesmo o poder de reforma da constituição tem limites. [14]

Falta de isonomia

O primeiro problema a ser enfrentado é a completa falta de isonomia à luz do federalismo, quanto aos Estados que não estariam autorizados a editar tais contribuições. Seria possível a criação de uma competência tributária exclusiva a alguns estados da federação em detrimento de outros? Nos parece uma grave violação ao federalismo, principalmente, quando não se encontra justificativa jurídica e, principalmente, no texto constitucional para se dar este tratamento diferenciado e favorecido para alguns específicos Estados, já conhecidos de antemão, quando da edição da emenda constitucional.

Ao buscar estruturar a regra matriz de incidência de tais contribuições, soa estranho o critério material, pois, em tese, o verbo mais complemento, estaria vinculado ao “gozar” de condição à aplicação de diferimento, regime especial ou outro tratamento diferenciado quanto ao ICMS. Seria possível adotar tal critério material para a instituição de um tributo? O que nos parece ainda mais grave, ao ser critério material o gozo do direito à imunidade tributária nas exportações. Gozar de imunidade tributária pode ser critério material de tributo? Nos parece que não.

Interessante ainda notar, que, não obstante a causa que leva à edição de tais contribuições ser o gozo de tais regimes diferenciados, estes serão extintos em 2032, ao passo que a exigência irá perdurar até 2043.

Sem pretensão de esgotar o tema, como de costume, tal competência tributária é facultativa, até porque o texto afirma que “poderão instituir contribuições”. Mas existe algum prazo para o exercício desta competência? Somente a instituição da nova contribuição gera a extinção das anteriores contribuições facultativas? Ou já estariam sem fundamento de validade, diante da Emenda Constitucional 132/2023?

Para encerrar, é preciso lembrar que a inclusão deste artigo 136 dos ADCTs se deu, de forma açodada, sorrateira, sem debate, em total descompasso e harmonia com o projeto de “emenda constitucional”, que cuidava da reforma tributária sobre o consumo.

De última hora, incluiu-se uma contribuição, sem qualquer conexão com a reforma do consumo em matéria tributária, pois tem características completamente contrárias aos fundamentos daquele projeto, que visa tributar o consumo, por meio de tributos com não cumulatividade plena e que objetiva a exoneração das exportações. Ora, tais contribuições são cumulativas e oneram as exportações. Um verdadeiro jabuti no devido processo legislativo de reforma da constituição, que poderia até mesmo, embora não seja comum, levar à inconstitucionalidade por caracterizar um contrabando legislativo.

Sem qualquer pretensão de esgotar o tema, são algumas reflexões iniciais a respeito de tais contribuições recriadas, a partir da Emenda Constitucional 132/2023, a onerar indevidamente o agronegócio e as exportações.

_____________________________

[1] Pautada para julgamento na ADI 7407/DF no plenário virtual para 07/06/2024 a 14/06/2024.

[2] Julgada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal: “EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ARTIGOS 6º, VI, 7º (REDAÇÃO ORIGINAL E AQUELA DADA PELA LEI ESTADUAL 4.029/2022) E 8º DA LEI 3.617/2019 DO ESTADO DO TOCANTINS. CONTRIBUIÇÃO AO FUNDO ESTADUAL DO TRANSPORTE – FET INCIDENTE SOBRE O VALOR DAS OPERAÇÕES COM PRODUTOS DE ORIGEM VEGETAL, MINERAL OU ANIMAL, INCLUSIVE OS DESTINADOS À EXPORTAÇÃO. LEGITIMIDADE ATIVA AD CAUSAM. ENTIDADE REPRESENTATIVA DOS PRODUTORES DE SOJA. PERTINÊNCIA TEMÁTICA. EXAÇÃO QUE CARACTERIZA ADICIONAL DO ICMS COM RECEITA VINCULADA. USURPAÇÃO DA COMPETÊNCIA DO SENADO FEDERAL PARA ESTABELECER AS ALÍQUOTAS DO ICMS APLICÁVEIS ÀS OPERAÇÕES INTERESTADUAIS (ARTIGO 155, § 2º, IV, DA CRFB/1988). IMPOSSIBILIDADE DE VINCULAÇÃO DA RECEITA DE IMPOSTO SEM AUTORIZAÇÃO CONSTITUCIONAL (ARTIGO 167, IV, DA CRFB/1988). OFENSA À IMUNIDADE TRIBUTÁRIA DAS OPERAÇÕES QUE DESTINAM MERCADORIAS AO EXTERIOR (ARTIGO 155, § 2º, X, “A”, DA CRFB/1988). AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE CONHECIDA E JULGADO PROCEDENTE O PEDIDO. (ADI 6365, Relator(a): LUIZ FUX, Tribunal Pleno, julgado em 14-02-2024, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n  DIVULG 21-02-2024  PUBLIC 22-02-2024)

[3] CALCINI, Fabio Pallaretti. DIREITO DO AGRONEGÓCIO. Inconstitucionalidade da ‘contribuição’ do Fundeinfra pelo governo de Goiás. Conjur. 14/04/2023. https://www.conjur.com.br/2023-abr-14/direito-agronegocio-fundeinfra-inconstitucionalidade-contribuicao/

[4] STF, RE 556854, relator(a): CÁRMEN LÚCIA, Tribunal Pleno, julgado em 30/06/2011, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-195 DIVULG 10-10-2011 PUBLIC 11-10-2011 RT v. 100, nº 914, 2011, p. 430-446.)

[5] “Ação Direta de Inconstitucionalidade. Artigos 9º a 11 e 22 da Lei nº 1.963, de 1999, do Estado do Mato Grosso do Sul. 2. Criação do Fundo de Desenvolvimento do Sistema Rodoviário do Estado de Mato Grosso do Sul (Fundersul). Diferimento do ICMS em operações internas com produtos agropecuários. 3. A contribuição criada pela lei estadual não possui natureza tributária, pois está despida do elemento essencial da compulsoriedade. Assim, não se submete aos limites constitucionais ao poder de tributar. 4. O diferimento, pelo qual se transfere o momento do recolhimento do tributo cujo fato gerador já ocorreu, não pode ser confundido com a isenção ou com a imunidade e, dessa forma, pode ser disciplinado por lei estadual sem a prévia celebração de convênio. 5. Precedentes. 6. Ação que se julga improcedente” (STF, ADI 2056, relator (a): GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 30/05/2007, DJe-082 DIVULG 16-08-2007  PUBLIC 17-08-2007 DJ 17-08-2007 PP-00022  EMENT VOL-02285-02 PP-00365 RTFP v. 15, nº 76, 2007, p. 331-337.).

[6] STF, ADI 6365, Relator(a): LUIZ FUX, Tribunal Pleno, julgado em 14-02-2024, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n  DIVULG 21-02-2024  PUBLIC 22-02-2024.

[7] “ Agravo regimental em ação direta de inconstitucionalidade. Direito tributário. Contribuição destinada ao Fundo Estadual de Infraestrutura do Estado de Goiás (FUNDEINFRA). Modificação substancial no contexto dos parâmetros de controle. Prejudicialidade. 1. A jurisprudência da Corte é firme quanto ao reconhecimento da prejudicialidade da ação direta quando se verifica inovação substancial no parâmetro constitucional de controle, orientação que se aplica ao presente caso. 2. Agravo regimental ao qual se nega provimento.” (ADI 7363 AgR, Relator(a): DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, julgado em 09-04-2024, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n  DIVULG 17-04-2024  PUBLIC 18-04-2024).

[8] STF, ADI 6420, Rel. Min. Gilmar Mendes.

[9] CALCINI, Fabio Pallaretti. Princípio da Moralidade administrativa. In: Princípios de Direito Administrativo. MARRARA, Thiago (org.). São Paulo: Atlas, 2012. P. 180 e ss.

[10] Na ADI n. 2.661/MA, o Ministro relator Celso de Mello invoca o princípio da moralidade para realizar o controle de validade das normas infraconstitucionais, razão pela qual afirma: “A atividade estatal, qualquer que seja o domínio institucional de sua incidência, está necessariamente subordinada à observância de parâmetros ético-jurídicos que se refletem na consagração constitucional do princípio da moralidade administrativa. Esse postulado fundamental, que rege a atuação do Poder Público, confere substância e dá expressão a uma pauta de valores éticos sobre os quais se funda a ordem positiva do Estado. O princípio constitucional da moralidade administrativa, ao impor limitações ao exercício do poder estatal, legitima o controle jurisdicional de todos os atos do Poder Público que transgridam os valores éticos que devem pautar o comportamento dos agentes e órgãos governamentais. A ratio subjacente à cláusula de depósito compulsório, em instituições financeiras oficiais, das disponibilidades de caixa do Poder Público em geral (CF, art. 164, § 3º) reflete, na concreção do seu alcance, uma exigência fundada no valor essencial da moralidade administrativa, que representa verdadeiro pressuposto de legitimação constitucional dos atos emanados do Estado” (STF, ADI n. 2.661/-5/MA, Rel. Min. Celso de Mello, Pleno, j. 05/06/2002, DJ23/08/2002.)

[11] DONIAK, Jr. Jimir. A boa-fé objetiva nas relações jurídico-tributárias: os deveres do Poder Público. São Paulo: Quartier Latin, 2024.

[12] STF, ADI 2189, Relator(a): DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, julgado em 15-09-2010, DJe-247 DIVULG 15-12-2010 PUBLIC 16-12-2010 EMENT VOL-02452-01 PP-00040; STF, RE 390840, Relator(a): MARCO AURÉLIO, Tribunal Pleno, julgado em 09-11-2005, DJ 15-08-2006 PP-00025   EMENT VOL-02242-03 PP-00372 RDDT n. 133, 2006, p. 214-215)

[13] STF, ADI 6365, Relator(a): LUIZ FUX, Tribunal Pleno, julgado em 14-02-2024, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n  DIVULG 21-02-2024  PUBLIC 22-02-2024

[14] CALCINI, Fábio Pallaretti. Limites ao Poder de Reforma da Constituição. Campinas: Millennium, 2008.

O post ‘Contribuições e fundos estaduais’, reforma tributária e agronegócio apareceu primeiro em Consultor Jurídico.

Processo criminal no país depende de provas frágeis, diz instituto

A plataforma Prova sob Suspeita, lançada nesta semana pelo Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD) e que reúne informações sobre provas criminais no país, revela uma dura realidade do sistema de Justiça brasileiro. “A falta de provas confiáveis faz com que o processo criminal no país falhe em entregar à Justiça vítimas e pessoas acusadas, em especial da população negra”, afirma a advogada Marina Dias, diretora executiva do IDDD.

Com diversas publicações sobre o tema, o site contribui para o entendimento de como as abordagens, o testemunho policial e o reconhecimento de suspeitos, contaminados pelo racismo, podem resultar em condenações injustas.

O IDDD ressalta que, em grande medida, isso ocorre porque atualmente o processo criminal no país depende de provas escassas e frágeis, produzidas com base na memória e marcadas pelo racismo. A entidade acrescenta que, em muitos casos, a palavra de uma única pessoa – em geral, da vítima ou do policial – ou um reconhecimento fotográfico irregular. como no caso dos álbuns de suspeitos, é suficiente para embasar a condenação.  

Segundo Marina, a consolidação da plataforma pretende colocar uma lupa nas questões estruturais do sistema de Justiça criminal, como o racismo, além de disseminar conhecimento. “Temos uma produção e valoração da prova que é muito frágil, com uma série de deficiências, tanto do ponto de vista técnico como também contaminada de ilegalidades. A ideia é justamente que possamos compartilhar essa informação, dar visibilidade, trazer questões importantes, para o maior número de pessoas.”

Além disso, magistrados desconsideram evidências científicas e regras processuais para a produção de provas, e ajudam a movimentar sentenças que têm como maior alvo a população negra e periférica. “O Judiciário tem responsabilidade muito grande ao chancelar ilegalidades cometidas pela polícia, ao aceitar provas que foram produzidas de forma ilegal, ao repetir essas provas perante o processo penal”, disse.

A advogada explica que, quando um reconhecimento é feito de maneira ilegal – com exibição de apenas uma fotografia ou apenas de uma pessoa, por exemplo -, ele já contamina a memória da testemunha ou da vítima. “Se isso aconteceu, a chance de ela confirmar esse reconhecimento, que já foi feito de maneira ilegal, [perante o juiz] é tremenda.” 

No contexto da reparação, ela aponta a importância da responsabilização do Judiciário em casos de injustiças. “Temos o caso Paulo, do IDDD, em que o rapaz foi acusado em 62 processos, todos por reconhecimentos fotográficos, sendo que ele nenhuma vez foi chamado à delegacia para ser reconhecido. É um caso em que o STJ [Superior Tribunal de Justiça] reconheceu uma violação sistêmica. Precisamos pensar em como reparar uma pessoa que ficou presa mais de três anos em razão de uma violação absolutamente tremenda do sistema de Justiça Criminal”.

Para evitar a repetição das violações, Marina cita capacitações e formações para juízes, promotores, policiais, delegados, além de melhores condições para a investigação policial com objetivo de desmantelamento do crime, em vez do foco em policiamento ostensivo. “Temos uma política criminal e de segurança pública totalmente focada no policiamento ostensivo no Brasil. Grande parte dos processos criminais começa a partir de uma prisão em flagrante, que se dá normalmente no policiamento ostensivo”, disse.

Ela explica que essa abordagem é extremamente autoritária e acaba recaindo sobre corpos negros. “São as pessoas negras as mais abordadas, então se existe sobrerrepresentação no sistema criminal de pessoas negras, muito se dá em razão do fato de que são elas as mais abordadas pelas polícias”, enfatizou.

A advogada ressalta que são diversos os elementos que compõem essa fragilidade das provas. “Tem a questão do testemunho policial, por exemplo, que tem peso gigantesco, principalmente nos crimes tipificados na lei de drogas. Existe uma ideia dos juízes, uma crença na versão do policial, de que eles estão no cumprimento do dever legal, então têm fé pública”, observa.

“Há uma crença também de que eles não têm interesse na prisão de pessoas inocentes, de que têm um saber [técnico] ali por estarem nas ruas. Tudo isso contribui para uma prova que é parcial, porque é óbvio que o policial tem interesse no desdobramento daquela operação que ele fez. E o policial, como qualquer outra pessoa, também é afetado pela depreciação da memória”, afirma Marina.

A plataforma contempla textos e vídeos com entrevistas de especialistas do Brasil e do exterior, referências na problemática das provas dependentes da memória; histórias reais de pessoas impactadas por condenações injustas e arbitrárias; artigos e entrevistas em texto com especialistas e vozes relevantes do direito e da sociedade civil; pesquisas e relatórios que colocam o processo de produção de provas no centro da agenda.

O projeto Prova sob Suspeita, que teve início em 2018, tem o objetivo de contribuir para o aprimoramento na produção e na análise de provas, a fim de reduzir os riscos de decisões judiciais equivocadas e arbitrárias. A plataforma sistematiza a produção de conteúdo sobre o tema, mas a entidade já promove ações desde o começo do projeto. As frentes de atuação do projeto são formação e sensibilização dos atores do sistema de Justiça; aprimoramento da legislação brasileira e litígio estratégico, para criação de nova jurisprudência sobre a matéria.

Fonte: 

Logo Agência Brasil

Compromisso arbitral de atleta depende de previsão em acordo coletivo, diz TST

Havendo norma específica regulando o contrato de trabalho, não é possível aplicar dispositivo da CLT que contraria a lei especial, em respeito ao princípio da especialidade.

A decisão é da 5ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho, que declarou a invalidade de cláusula compromissória de arbitragem firmada no contrato de um jogador de futebol por entender que a medida contraria o artigo 90-C da Lei 9.615/1998, que institui normas gerais sobre esportes e recebeu o apelido de “Lei Pelé”.

Caso envolve jogador de futebol e Ponte Preta – Fernando Torres/CBF

O caso chegou ao TST após o Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região aplicar a regra contida no artigo 507-A da CLT. O dispositivo estabelece cláusula de arbitragem em contratos de empregados hipersuficientes, que recebem salário maior que duas vezes o limite dos benefícios da Previdência.

Nesses casos, diz a regra, pode ser pactuada cláusula compromissória de arbitragem, por iniciativa do empregado ou mediante sua concordância expressa. O contrato analisado contava com a cláusula.

 

Embora mais recente, o trecho da CLT contraria o artigo 90-C da Lei 9.615/1998, que também permite a arbitragem para a resolução de litígios, mas diz que a medida deve constar também em acordo ou convenção coletiva de trabalho, o que não ocorreu no caso concreto

A disputa envolve o clube Ponte Preta e o ex-jogador Roberto César. O atleta atuou no time em 2018.

Transcendência jurídica

A disputa envolvendo verbas salariais e rescisórias foi parar no TST após o TRT-15 extinguir o caso sem resolução de mérito, entendendo que há cláusula arbitral, nos termos da CLT.

O TST discordou, entendendo que deve ser aplicada ao caso a lei específica, levando em conta o princípio da especialidade, segundo o qual normas específicas se sobrepõem a leis gerais.

A 5ª Turma reconheceu a transcendência jurídica do tema, levando em conta que a aplicação do artigo 507-A da CLT ao atleta profissional ainda não foi suficientemente enfrentada no âmbito do TST.

O relator do caso, ministro Breno Medeiros, pontuou, no entanto, que a 1ª Turma do TST já se pronunciou sobre o tema, entendendo que o artigo 507-A, incluído na CLT com a reforma trabalhista, por ser regra de abrangência mais ampla, não revoga o artigo 90-C da Lei 9.615, que exige o acordo coletivo para que ocorra a arbitragem.

Relator concorda

O ministro relator entendeu em sentido semelhante ao da 1ª Turma. Para ele, havendo norma específica a regular o contrato de trabalho especial do atleta, não é possível aplicar o dispositivo da CLT, já que a norma geral “contraria o regramento da lei de desporto”.

“Tal constatação deflui da própria regra de colmatação de lacunas e antinomias do sistema jurídico, segundo a qual a lei especial prevalece sobre a lei geral quando ambas possuem comandos conflitantes, sendo esse exatamente o caso dos autos”, disse o ministro.

Segundo ele, como a reforma trabalhista não modificou a lei específica, não pode o Judiciário deixar de aplicar o regramento especial que rege o contrato do jogador de futebol.

“Conhecido o recurso, a consequência lógica é o seu parcial provimento para, reformando o acórdão regional, declarar a invalidade da cláusula compromissória de arbitragem firmada no contrato profissional do reclamante, determinando-se o retorno dos autos ao Regional, a fim de que julgue o recurso ordinário no mérito, como entender de direito”, concluiu o relator.

Clique aqui para ler a decisão
Processo 11748-91.2019.5.15.0043

O post Compromisso arbitral de atleta depende de previsão em acordo coletivo, diz TST apareceu primeiro em Consultor Jurídico.

Nova fase da reforma tributária preocupa ainda mais

Realizado na semana passada, em merecidíssima homenagem ao emérito e querido professor baiano Edvaldo Brito, o III Congresso Internacional de Direito Tributário do IAT, presidido pelo professor Tácio Lacerda Gama, teve entre uma de suas principais plenárias dedicada ao tema “O Novo Federalismo Fiscal”.

Essa plenária foi sede de intensos e calorosos debates sobre a reforma tributária do consumo e sobre o primeiro projeto de lei complementar enviado pelo governo ao Congresso Nacional: o PLP 68/24, pelo qual se propõe a instituição do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) e do Imposto Seletivo (IS).

O encontro se deu no deslumbrante anfiteatro do espaço L’Occitane, em Trancoso (BA), e contou com a participação de Fernando Facury Scaff, Suzy Hoffmann, Mary Elbe Queiroz, Eduardo Maneira, Lina Santin e Raquel Preto. A mim, coube a condução e o fomento dos debates.

Na plateia, tivemos a satisfação de contar com a presença do professor Eurico de Santi, um dos principais idealizadores da PEC 45/19. A sua determinação e resiliência na condução do projeto lhe renderam merecida salva de palmas ao final do evento.

Prós

Como nas edições anteriores desse já tradicional congresso de Trancoso, a experiência de vivenciar o confronto de ideias ocorrido nesse painel teve o condão de sedimentar, ainda mais, a minha convicção sobre diversos aspectos positivos e negativos dessa reforma, cuja regulamentação se encontra em andamento.

Os aspectos positivos estão, em sua grande maioria, relacionados à ampliação da regência axiológica de todo o Sistema Tributário Nacional, bem como à sensível melhora das regras relativas ao cumprimento de obrigações acessórias por parte dos sujeitos passivos dos tributos cuja instituição se propõe.

De fato, traz grande amparo jurídico ao Sistema Tributário Nacional a menção expressa que a EC 132/23 fez inserir no texto constitucional quanto à necessária observância dos princípios da simplicidade, transparência, justiça tributária, neutralidade, cooperação e defesa do meio ambiente.

No que diz respeito às novas regras relativas ao cumprimento de obrigações acessórias, o PLP 68/24 propõe excelentes inovações, tais como o cadastro único de contribuintes, a unificação das notas fiscais, o preenchimento automático de declarações (com a ressalva de que, diversamente do que dispõe o PLP,  a utilização dos documentos assim preenchidos dependerá de expressa anuência por parte do contribuinte), a possibilidade de centralização da apuração e compensação de créditos e débitos centralizada em um único estabelecimento do contribuinte.

Contras

Se esses aspectos da reforma trazem alento aos contribuintes, há outros que são geradores de indesejada perplexidade ou, no mínimo, de intensa preocupação.

O primeiro desses aspectos diz respeito à forma inadequada como as discussões dessa disruptiva reforma da tributação do consumo estão se dando, tanto no Congresso quanto no Ministério da Fazenda.

No Congresso, já tivemos oportunidade de demonstrar neste espaço o mais absoluto açodamento com que a PEC 45/19 foi examinada e votada na Câmara dos Deputados, sob a presidência do deputado Arthur Lira.

Essa injustificada precipitação deu no que vimos: a aprovação de uma emenda constitucional (EC 132/23) marcada por equívocos, com a criação de:

(a) normas desestruturadas e topograficamente confusas, com regras sobre um mesmo tema (regimes especiais, por exemplo) sendo reguladas ora no texto constitucional (regimes específicos de tributação), ora no âmbito da EC 132/23 (regimes diferenciados), ora em ambos os textos (regimes favorecidos);

(b) normas tecnicamente equivocadas, como aquela que condiciona os créditos de não cumulatividade ao pagamento do imposto pelo elo anterior da cadeia; e

(c) normas inusitadas, como aquela cuja introdução no texto da PEC 45/19 ocorreu já no curso da sua votação na Câmara dos Deputados, conferindo competência aos estados para, por meio de uma esdrúxula contribuição, tributar produtos primários e semielaborados, entre eles o feijão, que integra a cesta básica…

Grupos de trabalho

A regulamentação das novas regras está sendo, agora, elaborada no âmbito do Ministério da Fazenda, por 19 grupos de trabalho (GTs), de cuja composição participaram exclusivamente representantes das Fazendas dos três níveis da Federação. Apesar de solicitações nesse sentido, não foram admitidos nesses GTs quaisquer representantes da sociedade civil ou das diversas categorias de contribuintes, dos mais variados setores.

Não fossem os debates ocorridos no âmbito dos denominados GTs paralelos, criados pela Frente Parlamentar do Empreendedorismo (FPE) e da União das Frentes Parlamentares, com o indispensável apoio do grupo Mulheres no Tributário, a sociedade civil não teria tido qualquer espaço de fala para manifestar-se sobre os seus anseios, no que diz respeito às novas regras de tributação.

Essa ausência de diálogo culminou com a apresentação de projetos ao Congresso Nacional, tanto pelo governo quanto pelas frentes parlamentares.

Split payment

O projeto entregue pelo governo (PLP 68/24), além de conter espantosa quantidade de dispositivos (499 artigos) — absolutamente incompatível com a eliminação da complexidade que antes se prometia —, deixa muito a desejar no que tange à clareza das suas disposições. Senão, vejamos a forma pouquíssimo clara com que o artigo 50 conceitua o tão controvertido “split payment”:

Art. 50. O arranjo de pagamento que disciplina serviço de pagamento baseado em instrumento de pagamento eletrônico deverá estipular que, nas transações de pagamento relacionadas a operações com bens ou com serviços, haja vinculação entre as informações da transação e os documentos fiscais relativos às operações e, quando for o caso, os valores do IBS e da CBS.

Complicado, não?

split payment nada mais é do que o procedimento eletrônico pelo qual o pagamento de valores pelo adquirente ao fornecedor, em cada elo da cadeia de circulação de mercadorias e serviços, é realizado de forma dividida, a fim de que o montante correspondente ao preço da mercadoria ou serviço seja direcionado ao seu fornecedor, e o montante correspondente ao tributo por ele devido seja, de imediato, recolhido ao órgão responsável pelo registro dos créditos e débitos inerentes a cada operação, bem como pelo controle de saldos devedores e/ou credores formados em cada período de apuração.

Essa técnica foi testada na Europa, não de forma abrangente como se pretende aplicá-la no Brasil, mas somente em algumas operações e/ou setores específicos.  E, mesmo assim, a experiência foi malsucedida. De fato, em estudo encomendado à Deloitte no âmbito da União Europeia, restou evidenciada a desvantajosa relação custo/benefício decorrente da sua implementação. Tanto assim, que países como a Polônia e a Bulgária, entre outros, desistiram da sua adoção.

Ademais, esse sistema, além de prejudicar o fluxo financeiro das empresas envolvidas, impõe-lhes o pagamento do tributo, mesmo que não concordem com a sua legalidade.  Com efeito, caso o contribuinte discorde da respectiva incidência, seja por que motivo for, só lhe restará repetir o indébito. É a adoção do indesejado solve et repete como forma exclusiva de discussão da legalidade das cobranças feitas. Os autos de infração relacionados aos dois tributos criados serão instrumentos esvaziados nesse novo modelo.

Doações

Outro aspecto causador de preocupação no PLP do governo são as previsões nele constantes de que doações passarão a ser tributadas pelo IBS/CBS, numa flagrante invasão da competência privativa dos estados para fazer incidir o Imposto sobre a Transmissão Causa Mortis e Doações (ITCMD) nesses negócios jurídicos.

De fato, a competência compartilhada entre estados e municípios para a cobrança do IBS não permite que qualquer deles possa, por meio do novo imposto, tributar negócios jurídicos originariamente atribuídos exclusivamente à competência do outro.

O que se compartilha é tão somente a competência relativa à incidência do IBS, e não a competência tributária outorgada a ambos os entes políticos de forma indiscriminada.

No que concerne à CBS, a invasão perpetrada pela União Federal é ainda mais flagrante.

Eliminar os equívocos

Enfim, são múltiplas e variadas as preocupações e perplexidades que o texto desse PLP nos traz. Certamente, nós nos ocuparemos delas em diversas outras ocasiões neste espaço.

Por ora, resta-nos buscar convencer os parlamentares da necessidade de que sejam eliminados os equívocos cometidos, para que, no futuro, não tenhamos que recorrer ao Judiciário com a mesma finalidade.

Fonte: Conjur

Repetitivo discute se habilitação de sucessores da parte falecida no processo está sujeita à prescrição

A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça afetou os Recursos Especiais 2.034.210, 2.034.211 e 2.034.214, de relatoria do ministro Humberto Martins, para julgamento pelo rito dos repetitivos.

A controvérsia, cadastrada como Tema 1.254, está em definir se “ocorre ou não a prescrição para a habilitação de herdeiros ou sucessores da parte falecida no curso da ação”.

O colegiado determinou a suspensão da tramitação dos processos, individuais ou coletivos, que tratem da mesma questão jurídica, nos quais tenham sido interpostos recurso especial ou agravo em recurso especial e que estejam em segunda instância ou no STJ.

Ausência de previsão legal para a habilitação dos sucessores

No REsp 2.034.210, a Universidade Federal do Ceará recorre de decisão do Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF5) que manteve a habilitação de um sindicato como sucessor de uma servidora para requerer o recebimento de crédito concedido a ela em primeira instância. A servidora faleceu no curso do processo de conhecimento, antes da fase de execução.

Para a recorrente, a pretensão executória estaria prescrita, porque o sucessor deveria ter requerido sua habilitação em até cinco anos após o trânsito em julgado da sentença exequenda, havendo também transcorrido o mesmo prazo prescricional desde a expedição da requisição de pagamento.

O ministro Humberto Martins explicou que o TRF5 fundamentou sua decisão no fato de que a morte de uma das partes leva à suspensão do processo, razão pela qual, na ausência de previsão legal sobre prazo para a habilitação dos respectivos sucessores, não há prescrição intercorrente.

De acordo como o relator, a matéria tem potencial de multiplicidade: foram localizados 37 acórdãos e 1.939 decisões monocráticas proferidas por ministros da Primeira e da Segunda Turmas a respeito de questão semelhante.

Recursos repetitivos geram economia de tempo e segurança jurídica

O Código de Processo Civil regula, nos artigos 1.036 e seguintes, o julgamento por amostragem, mediante a seleção de recursos especiais que tenham controvérsias idênticas. Ao afetar um processo, ou seja, encaminhá-lo para julgamento sob o rito dos repetitivos, os ministros facilitam a solução de demandas que se repetem nos tribunais brasileiros.

A possibilidade de aplicar o mesmo entendimento jurídico a diversos processos gera economia de tempo e segurança jurídica. No site do STJ, é possível acessar todos os temas afetados, bem como saber a abrangência das decisões de sobrestamento e as teses jurídicas firmadas nos julgamentos, entre outras informações.

Fonte: STJ

Congresso mantém veto a dispositivo que criminalizava a disseminação de fake news em eleições

O Congresso Nacional (sessão conjunta da Câmara e do Senado) manteve nesta terça-feira (28) o veto do ex-presidente Jair Bolsonaro aos crimes contra o Estado Democrático de Direito, como fake news em campanhas eleitorais. Esses crimes estavam previstos no Projeto de Lei 2462/91, que revogou a antiga Lei de Segurança Nacional e alterou o Código Penal, na parte relativa aos crimes contra o Estado Democrático de Direito.

Sessão do Congresso Nacional
Senador Rodrigo Pacheco preside sessão do Congresso para análise de vetos – Zeca Ribeiro/Câmara dos Deputados

Assim, permanecem vetados e fora da lei sancionada, entre outros pontos:

  • crime de disseminação de fake news em campanhas eleitorais, que poderia ser punido com reclusão de 1 a 5 anos;
  • crime de impedir, com violência ou ameaça grave, o exercício pacífico e livre de manifestação de partidos políticos, movimentos sociais, sindicatos, órgãos de classe ou demais grupos políticos, associativos, étnicos, raciais, culturais ou religiosos, que seria punível com reclusão de 1 a 4 anos ou 2 a 12 anos se disso resultar lesão grave ou morte;
  • agravantes em todos os crimes contra o Estado de Direito quanto ao emprego de violência ou grave ameaça exercidas com emprego de arma de fogo e perda de cargo por funcionário público ou militar.

Para o deputado Hildo Rocha (MDB-MA), os vetos deveriam ter sido derrubados. “Nós somos a favor da derrubada desse veto, porque queremos punir com prisão as pessoas que promovem fake news, que têm mesmo de ir para a cadeia, pegar cinco anos de prisão. Além disso, queremos fortalecer os partidos políticos na ausência do Ministério Público Eleitoral”, disse.

Já o deputado Cabo Gilberto Silva (PL-PB) defendeu a manutenção dos vetos. “O PL tem responsabilidade com o ordenamento jurídico brasileiro, tem responsabilidade com a liberdade de expressão, com o trabalho de segurança pública estabelecido no artigo 144 da Constituição”, afirmou.

Fonte: Zeca Ribeiro/Câmara dos Deputados

Simplificação da linguagem no Legislativo é medida urgente e necessária

O acesso à informação é um direito fundamental do cidadão, consagrado na Constituição de 1988. No Brasil, porém, esse direito se vê comprometido pela linguagem muitas vezes complexa e inacessível utilizada na redação legislativa. Leis, decretos e outras normas jurídicas, muitas vezes elaboradas em jargões técnicos, dificultam a compreensão por parte da população, criando barreiras à participação social e à efetividade do Estado democrático de Direito.

Nesse contexto, a simplificação da linguagem no Legislativo brasileiro surge como um desafio urgente e necessário, visando tornar as leis mais claras, concisas e compreensíveis para o cidadão comum, permitindo que ele acompanhe o processo legislativo, exerça seus direitos e cobre dos seus representantes o cumprimento das leis.

Boas práticas

Como alento, dentro da esfera pública, é notável o avanço do Executivo com bem-vindos exemplos de como uma redação mais breve e acessível pode tornar o diálogo entre o cidadão e o Estado mais alcançável

O Portal Brasil oferece conteúdos em linguagem simples e acessível, com informações sobre serviços públicos, direitos do cidadão e legislação. O portal conta com recursos como glossários, FAQs e vídeos explicativos, facilitando a busca e compreensão das informações.

Já a Lei nº 14.129/2017 estabelece diretrizes para a comunicação pública clara, concisa e acessível dentro do contexto do Governo Digital. Aplicável a todos os órgãos e entidades da administração pública federal, ela tem como princípio basilar o uso da linguagem simples e direta em seus documentos, portais eletrônicos e serviços de atendimento ao cidadão, como forma de se aumentar a eficiência pública.

Por sua vez, a Lei nº 13.926/2019, conhecida como Lei da Simplificação da Linguagem, estabelece diretrizes para a comunicação pública clara, concisa e acessível. A lei aplica-se a todos os órgãos e entidades da administração pública federal, obrigando-os a utilizar linguagem simples e direta em seus documentos, portais eletrônicos e serviços de atendimento ao cidadão.

O Laboratório do Ministério da Gestão e Inovação em Serviços Públicos LA-BORA! gov, criado em 2019 por servidoras públicas, é um que visa impulsionar a inovação e aprimorar a experiência dos servidores. Por meio de um ambiente colaborativo e experimental, o laboratório empodera os servidores como cocriadores de soluções, promovendo o bem-estar, o engajamento e a produtividade no serviço público, tudo isso com foco na geração de valor público e na melhor experiência para o cidadão.

Exemplos internacionais

Ainda dentro das boas práticas trazidas sobre simplificação da linguagem quando da elaboração legislativa, algumas inspirações internacionais se destacam pela robustez e impacto. Diversos países membros da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) já implementaram iniciativas exitosas de simplificação da linguagem jurídica. No Canadá, por exemplo, o Canada.ca Content Style Guide, constantemente atualizado, estabelece princípios e diretrizes para a redação de leis em linguagem acessível, incluindo a utilização de vocabulário simples, frases curtas e estrutura lógica clara.

A Nova Zelândia, por sua vez, possui o Plain Language Act de 2023, que também busca tornar as leis mais compreensíveis, utilizando linguagem cotidiana e evitando termos técnicos desnecessários, alcançando também a pessoa do agente público, além do conteúdo por si só.

Para sair um pouco da tradição anglófona e francófona, já expoentes consolidados no movimento de plain language, e apresentar uma contribuição mais próxima da realidade brasileira em termos linguísticos, Portugal, com o Decreto-Lei n° 135/1999 estabelece medidas para a simplificação da linguagem administrativa, incluindo a utilização de linguagem clara, concisa e direta, a organização lógica dos textos e a eliminação de jargões técnicos, além do Decreto-Lei 97/2019 que aplicou os mesmos princípios dentro dos tribunais portugueses, favorecendo uma comunicação, em todos os seus atos, mais acessível às partes envolvidas.

Possíveis repercussões

O que percebemos com essas práticas são benefícios mensuráveis e replicáveis no contexto brasileiro da simplificação, considerando as devidas adaptações necessárias à realidade do país. Dentre estes benefícios, podemos citar:

  • Maior acesso à informação: os cidadãos teriam mais facilidade para compreender as leis, seus direitos e deveres, o que lhes permitiria participar mais ativamente da vida pública e cobrar dos seus representantes o cumprimento das leis.
  • Maior transparência: a linguagem clara e acessível tornaria o processo legislativo mais transparente, permitindo que a população acompanhe as discussões e decisões dos parlamentares de forma mais dialógica e equilibrada.
  • Maior efetividade das leis: normas mais compreensíveis teriam maior chance de serem cumpridas, uma vez que os atores da sociedade brasileira teriam mais clareza e segurança os sobre seus direitos e deveres.
  • Redução de litígios: a linguagem clara e precisa nas leis poderia reduzir o ativismo judicial, considerando o potencial para diminuição de dúvidas sobre a interpretação normativa.
  • Melhoria da imagem e aumento da confiança institucional: a simplificação da linguagem contribuiria para melhorar a imagem do Poder Legislativo junto à população, tornando-o mais próximo e acessível aos cidadãos, que ainda têm como referência máxima de governabilidade o Executivo.

Dentre os percursos a serem trilhados dentro do Brasil, ainda assim é importante ressaltar que a liberdade de expressão, atributo inerente à linguagem e à aplicação prática da lei, encontra-se em momento de ascensão, como trazido pelo Global Expression Report de 2024. Vindo de um contexto de liberdade mais restrita para aberto, o Brasil, junto com Fiji, Níger, Sri Lanka e Tailândia, evoluíram no quesito, o que afirma a importância, dentre vários aspectos considerados, do papel da legislação em um cenário mundial agravado por fake news e desinformação [1].

Obstáculos

Todavia, ainda que os benefícios da simplificação da linguagem repercutam em contextos de maior acessibilidade informativa, e cada vez mais tenhamos sólidos movimentos em prol dessa maior transparência, notadamente no Executivo e no Judiciário, existem alguns desafios a serem superados quanto à simplificação por parte do Legislativo

O primeiro deles, é a resistência à mudança, pois a cultura jurídico-política tradicional é marcada pelo uso de linguagem complexa, cerimonial. Essa forma de comunicação emula a arquitetura parlamentar do plenário com os parlamentares posicionados de frente à Mesa, o que ressalta a sua supremacia. O projeto Parliament já documentou os modelos de plenário no mundo e as consequências sobre a forma da política via interação entre os parlamentares.

Outro obstáculo é a falta de expertise: muitos profissionais do direito não possuem o conhecimento e as habilidades necessárias para redigir textos em linguagem clara e acessível. Essa constatação, evidencia a necessidade de treinamento e o investimento na formação de profissionais especializados em elaboração legislativa clara e simples que considere o contexto de aplicação da lei. A atualização da padronização de normas ( manuais de redação) exige o estabelecimento de normas e diretrizes para a redação de leis em linguagem clara e acessível, com o fim de garantir a uniformidade e a qualidade dos textos.

A outra ação é no sentido de modificar os currículos das Faculdades de Direito com a inclusão de disciplinas sobre elaboração legislativa que considerem o seu aspecto informacional, comunicacional nos diversos cenários existentes na Federação brasileira.

Urgente e necessário

A simplificação da linguagem no Poder Legislativo brasileiro, ainda que tenhamos o marco da Lei Complementar 95/1998, apresenta-se como um desafio urgente e necessário para a construção de uma sociedade mais justa, democrática e participativa. Inspirando-se nas experiências de sucesso de outros países e superando, de forma colaborativa os obstáculos existentes, o Brasil pode dar um passo importante para tornar as leis mais acessíveis à população, fortalecendo o Estado Democrático de Direito. Uma política de boa legislação, um verdadeiro “Pro leg”, “Quali Leg”, asseguraria uma posição mais permanente para o Brasil, no reconhecimento tanto nacional quanto internacionalmente, no cenário de legislações, transparentes, acessíveis e inteligíveis.

E é claro, fortaleceria o espaço republicano, representado pelos Legislativos de toda a federação brasileira.


[1] Importante destacar que a escala usada para avaliar a liberdade de expressão varia de “crise” para “altamente restrita”, “restrita”, “menos restrita” e, finalmente, “aberta”. O Brasil realizou um salto significativo, diferentemente dos outros países que apresentaram melhorias, por saltar a fase “menos restrita”, indo diretamente para “aberta”.

O post Simplificação da linguagem no Legislativo é medida urgente e necessária apareceu primeiro em Consultor Jurídico.

STJ vai definir início dos juros por danos morais a anistiado político

A controvérsia, cadastrada como Tema 1.251 na base de dados do STJ, está em “definir o termo inicial dos juros de mora, nos casos em que reconhecido judicialmente o direito à indenização por danos morais a anistiado político ou seus sucessores, nos termos da Lei 10.559/2002″.

Dinheiro, reais, real, imposto
A 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça afetou dois recursos especiais de relatoria do ministro Afrânio Vilela para julgamento pelo rito dos repetitivos.

O colegiado decidiu suspender o trâmite de todos os processos individuais ou coletivos, na segunda instância ou no STJ, que versem sobre a mesma matéria e nos quais tenha havido a interposição de recurso especial ou de agravo em recurso especial — observada a orientação do artigo 256-L do Regimento Interno do STJ.

Segurança e transparência

No REsp 2.031.813, a União defende que os juros moratórios incidentes na indenização por danos morais, em caso de anistiado político, devem ser contabilizados a partir do arbitramento da condenação. Subsidiariamente, requer a aplicação dos juros a partir da data da citação. Por outro lado, o indenizado pede a incidência dos juros desde a data do evento danoso.

De acordo com o ministro Afrânio Vilela, a Comissão Gestora de Precedentes e de Ações Coletivas do STJ constatou a existência de dois acórdãos e 153 decisões monocráticas sobre o assunto nas turmas que compõem a 1ª Seção.

O relatou verificou ainda que apenas no âmbito do acordo de cooperação entre a Advocacia-Geral da União e o STJ, nos anos de 2021 e 2022, foram distribuídos ao menos 55 processos relacionados à matéria.

“A tese a ser adotada contribuirá para oferecer maior segurança e transparência na solução da questão pelas instâncias de origem e pelos órgãos fracionários desta corte, porquanto o tema ainda não recebeu solução uniformizadora, concentrada e vinculante sob o rito especial dos recursos repetitivos, apesar de ser recorrente na jurisprudência de ambas as turmas que compõem a Primeira Seção do STJ”, disse Afrânio Vilela.

Recursos repetitivos

O Código de Processo Civil regula, nos artigos 1.036 e seguintes, o julgamento por amostragem, mediante a seleção de recursos especiais que tenham controvérsias idênticas. Ao afetar um processo, ou seja, encaminhá-lo para julgamento sob o rito dos repetitivos, os ministros facilitam a solução de demandas que se repetem nos tribunais brasileiros.

A possibilidade de aplicar o mesmo entendimento jurídico a diversos processos gera economia de tempo e segurança jurídica. No site do STJ, é possível acessar todos os temas afetados, bem como saber a abrangência das decisões de sobrestamento e as teses jurídicas firmadas nos julgamentos, entre outras informações. Com informações da assessoria de imprensa do STJ.

REsp 2.031.813
REsp 2.032.021

O post STJ vai definir início dos juros por danos morais a anistiado político apareceu primeiro em Consultor Jurídico.

Comissão aprova projeto que disciplina despejo extrajudicial por atraso de aluguel

A Comissão de Defesa do Consumidor da Câmara dos Deputados aprovou projeto de lei que disciplina o despejo extrajudicial de inquilino por atraso no pagamento dos alugueis.

A medida permite a retomada do imóvel sem necessidade de recorrer à justiça. O procedimento será mais rápido, realizado através de cartório de registro de títulos.

Audiência Pública - Microgeração e minigeração de energia elétrica distribuída, Dep, Celso Russomano (REPUBLICANOS - SP)

Russomano: caminhos alternativos para a solução de conflitos são mais céleres e eficazes – Vinicius Loures/Câmara dos Deputados

 

O Projeto de Lei 3999/20, do deputado Hugo Leal (PSD-RJ), foi aprovado com parecer favorável do relator, deputado Celso Russomanno (Republicanos-SP).

Passos
O texto, que ainda será analisado pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ), prevê os passos do despejo extrajudicial. Os principais são:

  • o locador deverá requerer ao cartório a notificação do locatário para desocupar o imóvel ou pagar a dívida no prazo de 15 dias corridos, sob pena de desocupação compulsória;
  • o prazo será contado a partir da certificação da notificação pelo cartório;
  • a notificação deverá ser acompanhada dos alguns documentos, como a planilha dos débitos;
  • a notificação será preferencialmente eletrônica, quando convencionada, ou pessoal;
  • ocorrendo a desocupação, o cartório entregará as chaves ao locador;
  • transcorrido o prazo da notificação sem a desocupação voluntária ou o pagamento total da dívida, o locador poderá requerer na justiça o despejo compulsório;
  • a ordem de desocupação será concedida em caráter liminar para cumprimento em 15 dias, independentemente do tipo de garantia prevista no contrato de aluguel.

A proposta aprovada também disciplina o direito do inquilino de devolver o imóvel, medida que poderá ser feita igualmente por cartório. O locatário poderá usar o expediente, por exemplo, quando houver recusa injustificada do proprietário em receber a casa alugada.

O locador poderá pedir a lavratura de ata notarial para comprovar o estado do imóvel e evitar controvérsias futuras. A devolução do imóvel, no entanto, não afasta eventuais cobranças pelo locador, como contas de água e luz em atraso.

Desjudicialização
O relator elogiou a proposta do deputado Hugo Leal. Segundo Russomanno, o projeto contribui para desafogar a justiça de ações de despejo. “Os caminhos alternativos para a solução de conflitos vêm se mostrando como a forma mais célere e eficaz de se garantir o acesso à Justiça”, disse.

Russomano apresentou um texto substitutivo incorporando sugestões de membros da comissão. Entre outros pontos, reduziu de 30 para 15 dias o prazo para o locatário pagar as dívidas após a notificação. Também permitiu o retorno imediato do imóvel ao locador se o cartório identificar que ele está vazio.

Fonte: Câmara dos Deputados

STJ reconhece que pagamento direto do FGTS foi eficaz, mas assegura à União cobrança de outras parcelas

A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), sob a sistemática dos recursos repetitivos (Tema 1.176), reconheceu a eficácia dos pagamentos a título de Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) feitos diretamente ao empregado após a publicação da Lei 9.491/1997, em decorrência de acordos homologados na Justiça do Trabalho. Embora tais pagamentos diretos contrariem a legislação em vigor, o colegiado entendeu que não há como desconsiderar que eles foram amparados em acordos homologados pelo juízo trabalhista.

No mesmo julgamento, a Primeira Seção garantiu à União e à Caixa Econômica Federal (CEF) a possibilidade de cobrarem do empregador todas as parcelas que deveriam ser incorporadas ao fundo, como multas, correção monetária, juros e contribuições sociais – parcelas que não pertencem ao trabalhador e que ficaram fora do acordo na Justiça do Trabalho.

Com a fixação da tese repetitiva, poderão voltar a tramitar os recursos especiais e agravos em recurso especial, no STJ ou na segunda instância, que estavam suspensos à espera da definição do precedente qualificado.

Acordos são homologados na Justiça por decisão irrecorrível

O ministro Teodoro Silva Santos, relator, explicou que a Lei 8.036/1990, em sua redação original, previa o pagamento de algumas parcelas integrantes do FGTS diretamente ao trabalhador, a exemplo do depósito do mês da rescisão e da indenização de 40% do fundo, no caso de demissão sem justa causa. No entanto, a Lei 9.9491/1997 alterou o artigo 18 da Lei 8.036/1990 para determinar que todas as quantias devidas pelo empregador fossem depositadas na conta vinculada do empregado.

Segundo o ministro, ainda que a lei dispusesse claramente sobre a necessidade de depósito de todas as parcelas devidas do FGTS na conta vinculada, houve muitos acordos em processos trabalhistas que estabeleceram o pagamento direto para o trabalhador, e tais acordos muitas vezes não era comunicado à CEF, o que levava à proposição de execução fiscal contra o empregador para cobrança do fundo.

“Embora realizado em termos contrários ao que dispõe a legislação de regência, não se pode desconsiderar que o acordo foi submetido ao crivo do Judiciário”, afirmou o relator, lembrando que a decisão homologatória do acordo é irrecorrível (artigo 831, parágrafo único, da CLT) e faz coisa julgada material, sujeitando-se apenas à ação rescisória (Súmula 259 do Tribunal Superior do Trabalho), cuja apreciação compete à própria Justiça do Trabalho.

Para ele, não cabe à Justiça Federal nem ao STJ, “à míngua de competência jurisdicional para tanto”, no julgamento de embargos à execução fiscal, ação anulatória, ação declaratória da inexistência do débito ou de qualquer outra via processual, adentrar no mérito da decisão homologatória para corrigi-la ou desconsiderá-la e assim reconhecer a ineficácia do pagamento feito em desacordo com a determinação legal.

União e CEF não participaram do acordo trabalhista e não podem ser prejudicadas

O ministro declarou que esse cenário não afasta a obrigatoriedade do pagamento, pelo empregador, das parcelas do FGTS que devem ser incorporadas ao fundo e que não pertencem ao trabalhador, como multas, correção monetária e juros moratórios, além da contribuição social decorrente da demissão sem justa causa – inclusive porque o titular do crédito (União) e o agente operador do fundo (CEF) não participaram da celebração do acordo na Justiça do Trabalho, não podendo ser prejudicados pelo acerto entre patrão e empregado.

“Destarte, embora não se possa negar, no âmbito da Justiça Federal, a eficácia aos pagamentos homologados pelos magistrados trabalhistas sem prévio corte rescisório do decisum pela própria Justiça especializada, ressalva-se a cobrança das parcelas não alcançadas pelo acordo celebrado e, portanto, não acobertadas pela coisa julgada”, concluiu o ministro.

Fonte: STJ