Empresas vão indenizar casal por uso de imagem além do prazo contratual

A 3ª Turma Recursal dos Juizados Especiais do Tribunal de Justiça do Distrito Federal condenou duas empresas a indenizar um casal pela veiculação da imagem depois do término do contrato, reconhecendo que houve o uso indevido das imagens.

Os autores relatam que, em maio de 2023, eles e os filhos participaram de um trabalho de fotos e vídeos para uma empresa de decoração e paisagismo, intermediado por uma agência. Informam que o contrato tinha vigência de um ano e que eventual prorrogação do uso das imagens dependeria de negociação prévia.

O casal conta que, em novembro de 2024, soube por amigos que suas imagens ainda estavam sendo exibidas em academias do DF. Eles afirmam ter entrado em contato com as rés para comunicar o uso indevido, e que as empresas teriam se comprometido a resolver o problema e a pagar pelo uso indevido das imagens, o que não ocorreu. Por isso, pediram indenização.

Em sua defesa, a agência alegou que apenas atuou como intermediária entre os autores e a empresa responsável pela campanha publicitária. Sustentou ainda que o contrato de cessão de imagem não possuía prazo determinado e que não obteve vantagem econômica com a veiculação posterior.

A decoradora, por sua vez, afirmou desconhecer que as imagens continuavam sendo divulgadas e disse que, depois de ser notificada, propôs pagar um valor justo pelos nove meses excedentes da publicidade. Ambas as rés sustentaram que não houve dano indenizável.

O 1º Juizado Especial Cível de Águas Claras (DF) concluiu pela responsabilidade civil das rés e as condenou ao pagamento de indenização por danos materiais e morais ao casal. As duas empresas recorreram, pedindo a improcedência dos pedidos.

Ao analisar os recursos, a turma observou que, com base nas provas, ficou demonstrada a veiculação da imagem dos autores e de seus filhos menores depois do prazo previsto em contrato. O colegiado manteve a sentença que reconheceu a responsabilidade das rés.

Quanto aos valores, a turma entendeu ser necessária a readequação da indenização por danos materiais. O colegiado observou que o contrato original previa o pagamento de R$ 1.300 pelo período de um ano e que a veiculação indevida durou nove meses.

“Tem vez a redução do quantum indenizatório para R$ 2 mil , considerando-se o tempo de veiculação e eventuais acréscimos decorrentes da mora em realizar a recomposição aos autores, pois entendo que essa quantia melhor atende aos princípios da razoabilidade, proporcionalidade e vedação ao enriquecimento sem causa”, afirmou o relator.

Em relação aos danos morais, a turma decidiu manter o valor fixado na sentença, destacando que houve “exposição indevida de imagens dos autores e de seus filhos menores em ambiente comercial, o que configura violação aos direitos da personalidade e enseja reparação”.

Assim, a turma deu provimento parcial ao recurso da decoradora para fixar em R$ 2 mil a indenização por danos materiais. As rés deverão, de forma solidária, pagar ao casal também R$ 5 mil a título de danos morais.

A decisão foi unânime. Com informações da assessoria de imprensa do TJ-DF.

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Processo 0704221-79.2025.8.07.0020

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Deputada comemora avanços para evitar violência contra vítimas em processos judiciais; ouça

 

Em entrevista à Rádio Câmara nesta terça-feira (18), a deputada Alice Portugal (PCdoB-BA) fez um balanço dos quatro anos da Lei Mariana Ferrer. A norma é oriunda do Projeto de Lei 5096/20, de autoria da deputada Lídice da Mata (PSB-BA), aprovado pela Câmara com parecer favorável de Alice Portugal.

“Para além da luta contra os crimes de violência contra a mulher, nós temos que legislar sobre a revitimização”, desabafou a relatora. “É importante que possamos fazer essa revisita e dizer às mulheres: ‘Não aceitem revitimização durante os julgamentos e usem a lei'”, pediu a deputada.

Também nesta terça, a Câmara dos Deputados fará uma sessão para homenagear os quatro anos da lei.

O que mudou com a lei
Com a nova norma, o juiz está obrigado a zelar pela integridade da vítima em audiências de instrução e julgamento sobre crimes contra a dignidade sexual. Assim, fica proibido o uso de linguagem e informações que ofendam a dignidade da vítima ou de testemunhas.

Avanços
Quatro anos depois da aprovação da lei, Alice Portugal aponta mudanças na rotina dos tribunais. “Podemos dizer com certeza que o acolhimento mudou. O acolhimento, evitando processos de revitimização, tem outra tonalidade.”

Ela lembrou que também o Supremo Tribunal Federal proibiu o uso da vida pregressa da vítima como argumento para processos de violência sexual.

Papel do Congresso
Alice Portugal ressaltou ainda o papel do Parlamento no debate sobre revitimização. “Apesar de tantos problemas que ainda temos na nossa jovem e imperfeita democracia, nós também temos produzido legislações importantes para a proteção da mulher e da cidadania.”

Ela lembrou a demora na luta para que o feminicídio não fosse considerado um crime contra a honra. “A mulher sempre foi julgada, não é? Foi agredida, violentada… E quando conseguiu ir ao tribunal, muitas vezes foi condenada pela agressão que sofreu”, lamentou a parlamentar.

Fonte: Câmara dos Deputados

STF e Conitec: o critério da evidência científica na judicialização da saúde

Atuação do Judiciário passa a se fundamentar na medicina baseada em evidências

A judicialização da saúde criou um desafio ao Sistema Único de Saúde (SUS) de como equilibrar a garantia do acesso individual a tratamentos sem desorganizar a política pública e comprometer a sustentabilidade do sistema. Por muito tempo, a falta de provas robustas nas ações judiciais levou à concessão de tratamentos não incorporados ao SUS.

Tais decisões, fundamentadas majoritariamente apenas nos relatórios médicos, acabavam direcionando recursos públicos para tratamentos de alto custo, sem eficácia comprovada e sem avaliação técnico-científica adequada.

Contudo, em 2024, esse cenário começou a mudar com os julgamentos dos Temas 6 (RE 566.471) e 1234 (RE 1.366.243) da Repercussão Geral pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que levaram à edição das Súmulas Vinculantes 60 e 61.

Mais do que uma simples mudança jurisprudencial, os julgamentos consolidaram um novo paradigma que busca garantir que o acesso a medicamentos seja, ao mesmo tempo, fundamentado cientificamente e universalmente viável.

A atuação do Judiciário – e, consequentemente, da Advocacia Pública – passa a se fundamentar na medicina baseada em evidências e nas decisões técnicas da Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (Conitec).

É importante reconhecer a angústia de quem aguarda um tratamento para uma doença real e legítima, e o direito de buscar a tutela judicial. Mas as Súmulas Vinculantes 60 e 61 não buscam negar ou impedir esse acesso, mas qualificá-lo por meio de critérios que garantam que todos – e não apenas quem judicializa – tenham acesso a tratamentos comprovadamente eficazes.

Nesse sentido, a Súmula Vinculante 61 determina que a concessão judicial de medicamentos não incorporados deve observar as teses do Tema 6[1]. Este, por sua vez, estabeleceu que o fornecimento judicial de medicamentos registrados na Anvisa, mas não incorporados ao SUS, deve ocorrer de forma excepcional.

Para isso, é necessário que o autor da ação comprove, cumulativamente, alguns requisitos, dentre eles a inexistência de alternativa terapêutica incorporada, a imprescindibilidade clínica do tratamento e, principalmente, a eficácia e segurança do medicamento com evidências científicas de alto nível (ensaios clínicos randomizados, revisões sistemáticas ou meta-análises). Ou seja, os relatórios médicos isolados não bastam.

Já a Súmula Vinculante 60 determinou que a judicialização deve observar os acordos firmados no Tema 1234[2]. Este, além de tratar da organização colaborativa entre os entes federativos e da competência da Justiça Federal, também reforçou que o juiz, ao analisar pedidos desse tipo, deve obrigatoriamente considerar a decisão administrativa da Conitec e a negativa do fornecimento pela via administrativa. Quer dizer que é necessário demonstrar que a opinião do médico encontra fundamento em ciência robusta, conforme já alertava a STA 175-AgR[3].

A Conitec foi criada pela Lei 12.401/11 com a função de assessorar o Ministério da Saúde na incorporação, exclusão ou alteração de tecnologias em saúde no SUS, além de elaborar e atualizar protocolos clínicos e diretrizes terapêuticas. Para isso, a Comissão analisa as melhores evidências científicas disponíveis sobre eficácia, efetividade, acurácia e segurança dos medicamentos, além de avaliar estudos econômicos dessas tecnologias sob a perspectiva do SUS.

Isso significa comparar o novo tratamento com as alternativas já disponíveis, verificar se os benefícios justificam os custos e, principalmente, garantir que há ciência sustentando seu uso[4].

Um aspecto importante é que qualquer pessoa ou instituição pode solicitar a análise de uma tecnologia pela Conitec, ou seja, não há restrições quanto ao tipo de demandante. No entanto, a solicitação precisa preencher requisitos documentais específicos, conforme o Decreto 7.646/2011.

O prazo para avaliação é de 180 dias, prorrogáveis por mais 90 e, antes do parecer final, os relatórios são submetidos à consulta pública por 20 dias, permitindo que cidadãos, profissionais de saúde e associações contribuam. Vale ressaltar que a Conitec não tem a palavra final, pois cabe ao Secretário de Ciência, Tecnologia e Inovação e do Complexo Econômico-Industrial da Saúde (Sectics/MS) decidir pela incorporação ou não da tecnologia.

Um estudo que analisou 5.831 pedidos de medicamentos (em 13.263 decisões judiciais) revelou que, em 68% das vezes em que o tribunal determinou o fornecimento de tratamentos não incorporados ao SUS, a prescrição médica foi a única prova mencionada para justificar a decisão[5]. E, embora relatórios da Conitec tenham sido citados pelos litigantes em 1.130 julgamentos, apenas 26 decisões efetivamente usaram a análise técnica da Comissão como fundamento.

A nova orientação do STF traz uma mudança importante nesse cenário. Agora, a avaliação técnico-científica deixa de ter papel secundário e passa a ter um peso mais relevante como critério jurídico. O Supremo reconhece o papel fundamental que a medicina baseada em evidências e a avaliação tecnológica em saúde devem ter nas decisões judiciais, colocando a Conitec no centro desse novo modelo institucional.

Esse rigor metodológico da Conitec, que antes era ignorado ou visto apenas como mera orientação pelo Poder Judiciário, passa a ser reconhecido como garantia de decisões técnicas sólidas. Para a Advocacia Pública, essa mudança é um convite para uma atuação mais estratégica e especializada, uma vez que a defesa do ente público deixa de se apoiar em argumentos como “reserva do possível”, “separação de poderes” ou de “limitações orçamentárias” para se fundamentar nos relatórios da Conitec e em evidências científicas.

Na prática, isso significa que uma contestação bem fundamentada deve trazer não apenas a informação de que o medicamento não foi incorporado ao SUS, mas fundamentos completos explicando as razões técnicas da decisão Conitec – seja pela ausência de evidências robustas, pela existência de alternativas com melhor custo-efetivo ou pelos riscos identificados.

Para o SUS, essa nova orientação funciona como uma forma de proteger o sistema contra decisões judiciais isoladas e fragmentadas que geram impactos que vão além do caso individual, pois comprometem o planejamento da política pública e da distribuição de recursos, além de criar um sistema paralelo de acesso baseado em litigância.

Assim, as mudanças promovidas pelos Temas 6 e 1234 inauguram um modelo mais exigente de judicialização, reconhecendo que decisões judiciais desprovidas de critérios técnicos não protegem, de fato, o direito à saúde.

No entanto, o sucesso dessa mudança não será automático, sendo necessário um esforço coletivo que inclui a capacitação contínua de magistrados na análise de evidências científicas, o fortalecimento institucional da Conitec e, sobretudo, a atuação proativa da Advocacia Pública em difundir, defender e fiscalizar a aplicação dessa  nova abordagem.

É importante construir uma visão de que o verdadeiro avanço no acesso à saúde não se mede apenas pela vitória judicial individual, mas na consolidação de um modelo que assegure que o direito à saúde seja exercido por tratamentos de comprovada eficácia, seguros, viáveis e acessíveis a toda coletividade.


[1] https://portal.stf.jus.br/jurisprudenciaRepercussao/verAndamentoProcesso.asp?incidente=2565078&numeroProcesso=566471&classeProcesso=RE&numeroTema=6

[2] https://portal.stf.jus.br/jurisprudenciaRepercussao/verAndamentoProcesso.asp?incidente=6335939&numeroProcesso=1366243&classeProcesso=RE&numeroTema=1234

[3] https://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticianoticiastf/anexo/sta175.pdf

[4] https://www.gov.br/conitec/pt-br/acesso-a-informacao/perguntas-frequentes

[5] https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0277953620306201

Fonte: Jota

Quem salva uma vida, salva toda a humanidade: o perigo da indiferença

“Quem salva uma vida, salva toda a Humanidade” — este princípio, nascido da sabedoria talmúdica e reafirmado no coração da tradição judaica, alcança sua dimensão mais dramática quando confrontado com as grandes tragédias históricas em que vidas humanas foram sistematicamente destruídas.

Cada vida é um universo singular, dotado de memória, destino, vocação e dignidade; e quando se atenta contra uma existência, não se elimina apenas um indivíduo: interrompe-se a possibilidade inteira de um mundo.

À luz da “Shoah”, compreende-se que a destruição nazista não visou apenas eliminar corpos, mas aniquilar existência, apagando nomes, culturas, genealogias e futuros. Cada criança assassinada em Auschwitz representava uma futura escola não aberta, um lar que não se formaria , um Shabat que não se celebraria, um futuro que jamais aconteceria.

Mas a lição ética que se extrai dessa tragédia não pertence apenas ao povo judeu: ela se projeta como advertência universal e permanente, pois onde uma vida é destruída, toda a humanidade é ferida.

Essa verdade dolorosa também ressoa nos extermínios, perseguições e massacres vividos por outros povos e nações ao longo da história. Em cada uma dessas tragédias humanas, uma vida eliminada é também um universo destruído; um povo atingido é uma ferida aberta na história do mundo.

A memória da “Shoah” — assim como a memória de todos os genocídios e perseguições humanas — exige um compromisso: não negar, não relativizar, jamais esquecer!

Por isso, a frase “Quem salva uma vida, salva toda a Humanidade” é hoje mais do que sabedoria espiritual ou mandamento religioso: é fundamento ético, político e civilizatório. Ela nos lembra que a humanidade não se destrói apenas quando morre uma multidão. A humanidade começa a morrer quando se permite que uma única vida deixe de ser reconhecida como portadora de infinito valor!

Salvar alguém da morte, da fome, da violência, da escravidão, da miséria, da perseguição, do racismo, da humilhação, do abandono ou do ódio é reafirmar que o ser humano é inviolável, e que nenhum projeto — nacional, ideológico, econômico, étnico ou religioso — pode reivindicar o direito de eliminar o outro.

Assim, a memória de cada tragédia humana nos conclama a uma só tarefa: salvar a vida, proteger a dignidade, honrar o futuro.

Salvar uma vida é restaurar o mundo; proteger um povo é proteger a humanidade.

Entendo que as considerações preliminares ora expostas guardam inteira pertinência com o tema discutido no excelente texto da jornalista DORRIT HARAZIM (“Indiferença ao Mal”), que trata , com grande propriedade, de questão da mais elevada sensibilidade e importância , referente ao grave problema da omissão e indiferença perante o mal !

A respeito desse precioso artigo, corretíssimo em suas observações, pareceu-me oportuno formular , a título de reflexão, algumas considerações de ordem pessoal.

A história da humanidade, em suas páginas mais sombrias, tem nos advertido, de modo eloquente e dramático, que o mal não necessita, para triunfar, apenas da ação dos perversos, dos tiranos ou dos que se deixam dominar pela sedução autoritária do poder. Não. Para que o mal prevaleça — como lúcidamente advertiu Edmund Burke — basta que os homens e as mulheres de bem se omitam, silenciando diante da afronta, acomodando-se à injustiça ou afastando-se, por covardia moral, do dever de resistir.

A indiferença, em sua frieza moral e em sua insidiosa passividade, converte-se na mais grave enfermidade espiritual das sociedades democráticas. Ela representa a falência do compromisso ético que deve animar a vida civilizada, pois, como recordou Hannah Arendt ao tratar da “banalidade do mal”, a tirania não se sustenta apenas pela vontade criminosa dos que mandam, mas pela abdicação intelectual, moral e política daqueles que, podendo erguer a voz, preferem não pensar, não ver e não agir.

O silêncio cúmplice — seja ele motivado pelo medo, pela indolência, pelo cálculo pessoal ou pela apatia — transforma o espectador em coautor moral do agravo à dignidade humana. É por isso que Dante Alighieri, com rigor poético e visão profética, reservou, na “Divina Comédia”, lugar de reprovação não apenas aos ímpios, mas também aos neutros, àqueles que, diante dos conflitos essenciais do espírito humano, se recusaram a tomar posição, tornando-se indignos até mesmo do inferno….

O pensamento republicano, desde Cícero, recorda que a virtude pública consiste na defesa intransigente do justo e do bem. A ética kantiana, por seu turno, ensina que nenhuma conveniência pode suplantar o dever moral. E o testemunho sofrido de Elie Wiesel , Primo Levi e Viktor Frankl , todos sobreviventes do Holocausto , demonstra que o terrível século XX não foi, lamentavelmente, apenas obra dos que oprimiram, exterminaram e degradaram, mas também dos que — vendo — nada fizeram.

A indiferença, pois, constitui perigosa forma de deserção cívica. Ela nega a solidariedade, afronta o princípio da fraternidade humana, despreza o mandamento ético revelado pelo rosto do Outro e compromete, de maneira profunda, o próprio sentido da democracia, regime político que não admite espectadores morais, mas exige participantes responsáveis.

Impõe-se , portanto , proclamar, com firmeza e sem ambiguidades, que não há neutralidade possível diante do mal, seja este exercido contra a pessoa, contra a sociedade, contra as instituições ou contra a ordem constitucional. Quem se omite, colabora; quem desvia o olhar, abdica da condição de sujeito moral da história.

Que jamais nos falte coragem, portanto — essa forma superior de lucidez ética — , para resistir ao mal, denunciá-lo e enfrentá-lo, como imperativo que se impõe à consciência, à Constituição e à dignidade da pessoa humana.

Há a considerar, ainda, a questão pertinente à responsabilização de quem – Estado , sociedade ou indivíduo – se omite perante o mal ou a ele se mostra indiferente.

Ou, em outras palavras, haverá punição para quem se omite e se mostra indiferente ao mal ?

A questão da responsabilidade pela omissão e pela indiferença diante do mal atravessa a história da ética, da filosofia e do Direito. Embora nem sempre o ordenamento jurídico consiga punir, de modo formal, a omissão moral de quem assistiu ao mal sem reagir, a tradição filosófica, a consciência ética das civilizações e determinados sistemas jurídicos afirmam que a omissão pode, sim, configurar culpa , corresponsabilidade ou até mesmo participação indireta no mal praticado.

No plano da Filosofia Moral, desde Aristóteles, já se reconhecia que a virtude não consiste apenas em evitar o mal, mas em praticar o bem, pois a ética é ação, não neutralidade.

Mais tarde, Kant consideraria moralmente reprovável toda conduta que, por comodidade ou interesse próprio, negue o dever de agir: quem pode impedir o mal e não o faz, viola o imperativo categórico, pois trata o próximo como meio descartável, e não como fim.

Hannah Arendt analisou de modo dramático essa omissão em seu conceito de “banalização do mal”, demonstrando que o mal extremo não precisa de monstros, mas de funcionários obedientes e espectadores indiferentes. A ausência de indignação, para ela, é uma forma de derrota ética.

No campo fenomenológico, o filósofo e pensador judeu, naturalizado francês, Emmanuel Lévinas , detido pelos nazistas – e cujos irmãos, além do seu próprio pai, foram vítimas durante a “Shoah”, assassinados pela SS – afirma, ao formular seu pensamento fundado na “ética da alteridade” (“responsabilidade radical do eu para com o “Outro”), que o rosto do “outro” nos convoca moralmente, e negar essa convocação — ou seja, recusar-se a agir quando o outro sofre — é uma transgressão do dever ético fundamental da responsabilidade pelo próximo.

A História , por sua vez, mostra que a omissão coletiva pode conduzir a consequências trágicas, e que a responsabilidade moral recai também sobre os que se calaram.

No Holocausto (“Shoah”) , por exemplo, tanto Elie Wiesel quanto Primo Levi e Viktor Frankl denunciaram que milhões morreram não apenas pela ação monstruosa dos nazistas, mas pela omissão de sociedades inteiras, muitas das quais permaneceram indiferentes à marca do ódio e aos horrores perpetrados pelos totalitários nazistas nos campos de extermínio !!!

Durante os regimes totalitários do século XX, como o nazismo, o stalinismo e o franquismo, grande parte das violências se perpetuou pela passividade e pelo medo social.

Nelson Mandela, refletindo sobre o “apartheid”, afirmou que não é o ódio do opressor que mais prolonga a injustiça, mas o silêncio dos que dizem amar a justiça.

A punição histórica, nesses casos, manifesta-se como vergonha coletiva e legado moral condenatório, que se perpetuam por gerações.

Alguns sistemas jurídicos, de outro lado, reconhecem expressamente a responsabilidade por omissão. No Direito Penal contemporâneo, existe a figura da “comissão por omissão”, quando o agente, podendo e devendo agir, não impede o resultado ilícito.

Tribunais internacionais também reconheceram, no pós-guerra, que governantes e autoridades não podem alegar neutralidade ou obediência burocrática. Exemplo emblemático foi o Tribunal de Nuremberg, que fixou o princípio de que “obedecer não é desculpa moral nem jurídica”.

Hoje, a jurisprudência internacional discute a responsabilidade por omissão estatal diante de genocídios, limpeza étnica, desastres humanitários e violações massivas de direitos.

A indiferença , desse modo , pode – e deve – ser moralmente punida, filosoficamente condenada, historicamente lembrada e juridicamente responsabilizada !!!

Em suma : a omissão perante o mal não pode escapar ilesa.
Mesmo quando não alcançada pelo castigo penal, ela é julgada pela consciência, pela história, pela filosofia e pela memória dos povos.

O mal precisa da neutralidade para prosperar; a omissão, portanto, não é ausência de ação — é uma forma disfarçada de participação!!!

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Natureza das multas aduaneiras: está na hora de criarmos um teste

O Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o Tema 1.293, definiu:

1. Incide a prescrição intercorrente prevista no art. 1º, § 1º, da Lei 9.873/1999 quando paralisado o processo administrativo de apuração de infrações aduaneiras, de natureza não tributária, por mais de 3 anos. 2. A natureza jurídica do crédito correspondente à sanção pela infração à legislação aduaneira é de direito administrativo (não tributário) se a norma infringida visa primordialmente ao controle do trânsito internacional de mercadorias ou à regularidade do serviço aduaneiro, ainda que, reflexamente, possa colaborar para a fiscalização do recolhimento dos tributos incidentes sobre a operação. 3. Não incidirá o art. 1º, § 1º, da Lei 9.873/99 apenas se a obrigação descumprida, conquanto inserida em ambiente aduaneiro, destinava-se direta e imediatamente à arrecadação ou à fiscalização dos tributos incidentes sobre o negócio jurídico realizado.

Por anos, havia um consenso de que o Direito Aduaneiro era um ramo autônomo e, como tal, podia viver tranquilamente sem investigação da finalidade das suas multas, se administrativa ou tributária. O STJ, porém, não pensou dessa maneira e, com o julgamento do REsp nº 2.147.578/SP, representativo da controvérsia, nos obrigou a repensarmos as multas aduaneiras para enquadrá-las em dois subgrupos: multas de direito administrativo e multas de direito tributário.

Concordando ou não com a inovação daquele tribunal superior, que reescreveu tudo o que sabíamos sobre Direito Aduaneiro, somos obrigados, agora, a achar pelo menos uma multa aduaneira que tenha caráter tributário, sob pena de descumprirmos o que decidido no repetitivo e considerarmos erradas as premissas daquele órgão julgador.

Para analisarmos a natureza das multas aduaneiras, nada melhor do que um teste de subtração, que consista em verificar-se se a fiscalização de tributos seria afetada, na hipótese de revogarmos a previsão legal de sua aplicação.

Funcionamento dos testes

1º caso: vejamos a multa isolada que foi analisada no REsp nº 2.147.578/SP, que é prevista no artigo 107, IV, ‘e’, do DL 37/66, no valor de R$ 5 mil, incidente nos casos em que se deixa de prestar informação sobre veículo ou carga transportada, na forma e no prazo definidos, aplicada à empresa de transporte internacional.

O simples fato de essa multa ser aplicada à empresa de transporte, e não ao contribuinte, já demonstra que sua finalidade não é combate à sonegação, mas sim a fiscalização do transporte internacional. Pelo teste de subtração, sua revogação não atrapalharia a atividade de fiscalização de tributos, tendo implicações apenas administrativas.

Parece que nosso teste funcionou. Mas seria importante “testar” o teste de subtração mais uma vez, para verificar se ele funcionaria na identificação de multas com finalidade de fiscalização tributária.

2º caso: vejamos, então, a multa substitutiva de perdimento (artigo 23 do Decreto-Lei nº 1.455/1976) e multa por cessão de nome (artigo 33 da Lei 11.488/2007), que são consideradas multas por interposição fraudulenta de terceiros, que ocorre a partir do momento em que o real importador se oculta, inserindo um importador ostensivo nas operações de comércio exterior.

Tais multas, apesar da natureza aduaneira, buscam coibir uma prática fiscal de elisão consistente na blindagem patrimonial e na quebra de cadeia de tributos incidentes na importação, como o IPI, PIS/Cofins-importação. Ela é tão importante para fiscalização de tributos que o artigo 81 da Lei nº 9.430/1996 determina a perda de CNPJ das empresas envolvidas na fraude.

A interposição ocorre da seguinte maneira. Quando o importador quer reduzir os tributos aduaneiros, interpõe uma empresa (importador ostensivo), que recolhe os tributos aduaneiros. Depois disso, é emitida uma nota fiscal de saída (que inclui basicamente o valor aduaneiro, muitas vezes subvalorado, e uma pequena ou nula margem de lucro) para a transferência da mercadoria para o real importador (importador oculto).

Esse real importador, com essa prática elisiva, pode comercializar o produto, agora com a agregação de seu valor real, mas sem a incidência de IPI ou de PIS/Cofins-importação, pois formalmente conseguiu disfarçar sua condição de importador, quebrando a cadeia desses tributos.

Além da quebra da cadeia, em muitos casos há a blindagem patrimonial, com a interposição de uma importadora ostensiva “laranja”, que passa a acumular um passivo tributário enorme que nunca será recolhido aos cofres públicos, já que a empresa não possui liquidez financeira. Ocorre, assim, a evasão fiscal de tributos federais e do ICMS.

A multa por interposição fraudulenta de terceiros, portanto, apesar de em alguns casos não levar a um lançamento tributário, foi criada, em especial, como norma antielisiva e antievasiva, com uma especial atenção para a necessidade de se evitar a blindagem patrimonial com vistas à sonegação dos tributos aduaneiros e a quebra da cadeia dessas exações.

Exemplos após acórdãos do Carf

Para que se tenha uma visão prática de como essas práticas acontecem, e de como a Receita Federal procede às autuações, veremos exemplos de casos que se tornaram públicos a partir da publicação de acórdãos do Carf.

No primeiro exemplo (Acórdãos nº 3401-013.657, 3201-011.563, 3201-011.564), uma das maiores varejistas do país sofreu multa substitutiva de perdimento e multa por cessão de nome. Posteriormente, verificou-se que essa interposição permitiu quebrar a cadeia, evitando, dessa forma, sua equiparação a industrial, que ocorreria com base nos artigos 9º, II, III e IX, e 24, III, do RIPI/2010 (Decreto nº 7.212/2010). Isso levou ao lançamento por quebra de cadeia do IPI, em diversas autuações decorrentes e conexas, que também citamos de forma exemplificativa, o Acórdão Carf nº 3201-012.195.

No segundo exemplo, podemos citar uma empresa, importadora e industrial do setor de produtos de higiene pessoal, que foi inicialmente multada pela interposição fraudulenta (Acórdãos Carf nº 3401-013.675 e 3301-013.818). Sabendo-se que a prática da interposição na importação é uma forma de evasão e elisão fiscais, o segundo passo foi, como de praxe, investigar os tributos sonegados a partir dessa fraude.

Verificou-se que a empresa sonegava de duas formas: simulando uma compra e venda entre a empresa ostensiva e a oculta para deixar de recolher PIS e Cofins (Acórdão Carf nº 3301-014.025); simulando compra e venda entre elas para reduzir a tributação de IPI ou quebrando a cadeia para ocultar a interdependência das empresas e, assim, deixar de cumprir a regra de Valor Tributável Mínimo do IPI (Acórdão Carf nº 3202-001.962).

Cabe destacar que nos dois casos os lançamentos dos tributos foram decorrentes e basearam-se completamente no arcabouço probatório e legal da investigação fiscal que aplicou a multa aduaneira.

Fiscalização tributária inviabilizada

Parece que, aqui, o teste de subtração também funciona perfeitamente. Se, em situação hipotética, fosse revogada a multa aduaneira por interposição fraudulenta de terceiros, a fiscalização tributária ficaria inviabilizada. Seria como procurar uma agulha (simulação) em um palheiro (as milhares de importações e exportações diariamente realizadas).

Partindo do pressuposto de que o STJ entendeu pela existência de multas aduaneiras com finalidade de fiscalização tributária, perguntamos: se a multa por interposição fraudulenta não o for, então qual será? Realmente, não consigo imaginar.

Em conclusão, podemos dizer que duas afirmativas precisam ser consideradas um mantra, neste momento:

1) precisamos estabelecer um teste que permita identificar a natureza da multa aduaneira;

2) Uma, ao menos uma multa aduaneira, teremos que enquadrar como de natureza tributária, em respeito ao Superior Tribunal de Justiça.

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O STF e o futuro do setor imobiliário

Os novos rumos do ITBI na integralização de capital

A controvérsia sobre a incidência do Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis (ITBI) em operações de integralização de capital social de pessoas jurídicas, especialmente aquelas cuja atividade preponderante está ligada ao mercado imobiliário, tem sido uma fonte persistente de insegurança jurídica e um catalisador de inúmeros litígios. O cerne dessa discussão repousa na interpretação de um dispositivo constitucional que, por sua redação, abriu margem para interpretações diversas, gerando um ambiente de incerteza que clamava por uma definição da mais alta corte do país.

O dispositivo em questão é o artigo 156, §2º, inciso I, da Constituição Federal de 1988 (CF/88), o qual estabelece que o ITBI: “não incide sobre a transmissão de bens ou direitos incorporados ao patrimônio de pessoa jurídica em realização de capital, nem sobre a transmissão de bens ou direitos decorrente de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica, salvo se, nesses casos, a atividade preponderante do adquirente for a compra e venda desses bens ou direitos, locação de bens imóveis ou arrendamento mercantil;”.

A dúvida capital que se impôs por anos foi se a ressalva final — “salvo se, nesses casos, a atividade preponderante do adquirente for a compra e venda desses bens ou direitos, locação de bens imóveis ou arrendamento mercantil” — se aplicaria a ambas as hipóteses de não incidência previstas (integralização de capital e reorganizações societárias) ou exclusivamente à segunda. Historicamente, muitos municípios, ávidos por receita, defendiam a aplicação irrestrita da ressalva, resultando na tributação dessas operações de capitalização, o que gerou um cenário desfavorável para o desenvolvimento e a capitalização de empresas.

Este embate de interpretações está, neste momento, sob a análise do Supremo Tribunal Federal (STF), no âmbito do Recurso Extraordinário (RE) 1.495.108, que tramita sob o regime da Repercussão Geral (Tema 1348). A decisão a ser proferida terá, portanto, efeito vinculante para todo o Poder Judiciário brasileiro, colocando um ponto final nas incertezas.

O cenário que se desenha no julgamento, até o momento, aponta para uma possível vitória dos contribuintes. O Min. Edson Fachin, relator do caso, proferiu um voto técnico e abrangente que tem sido acompanhado por outros membros da Corte, posicionando-se pela imunidade incondicionada do ITBI na integralização de capital social. A sua fundamentação se alicerça em pilares sólidos de interpretação constitucional.

Em primeiro lugar, o Min. Fachin empreendeu uma meticulosa interpretação gramatical e sistemática do dispositivo constitucional. O ministro ressaltou a presença da expressão “nesses casos” na redação de 1988, argumentando que a escolha do constituinte ao inserir este adjunto adverbial de condição não foi aleatória. Essa expressão, ao ser analisada detidamente, demonstra que a ressalva da atividade preponderante se refere exclusivamente à segunda parte do dispositivo, ou seja, às operações de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica.

Consequentemente, a primeira parte, que trata da “transmissão de bens ou direitos incorporados ao patrimônio de pessoa jurídica em realização de capital”, estabelece uma imunidade plena e incondicionada, desvinculada do objeto social da empresa. Essa análise é corroborada pela evolução histórica do dispositivo em constituições anteriores, onde a ausência de um termo delimitador semelhante ao “nesses casos” de fato permitia uma aplicação mais ampla da ressalva, contexto que foi alterado pela redação atual da CF/88.

Ademais, o Min. Fachin conectou a presente discussão à ratio decidendi do Tema 796 da Repercussão Geral (RE 796.376). Embora o Tema 796 tenha se focado primariamente na incidência do ITBI sobre o valor dos bens que excede o capital social a ser integralizado – tese já consolidada de que o imposto incide sobre o excedente –, o relator destacou que a ideia subjacente da incondicionalidade da imunidade para a integralização de capital já estava presente naquele julgamento. O ministro fez menção expressa ao voto do Min. Alexandre de Moraes, que já afirmava, ainda que em obiter dictum, que a exceção da atividade preponderante “nada tem a ver com a imunidade referida na primeira parte” do Art. 156, §2º, I. Essa análise reforça que a incondicionalidade não é uma novidade, mas um aprofundamento de um entendimento preexistente na jurisprudência do STF.

O Ministro também não deixou de lado a teleologia da norma, ou seja, o propósito subjacente à criação da imunidade. O Art. 156, §2º, I, visa a incentivar o empreendedorismo, facilitar o fluxo de bens para a capitalização de pessoas jurídicas e promover o desenvolvimento econômico do país. Tributar operações essenciais de constituição ou capitalização, sob o pretexto da atividade preponderante da empresa, criaria um obstáculo desnecessário à livre iniciativa e ao investimento, frustrando a própria finalidade constitucional da norma. Nas palavras de Fachin, “a razão de ser da imunidade – e nada surge sem causa, princípio lógico e racional do determinismo – é facilitar o trânsito jurídico de bens, considerado o ganho social decorrente do desenvolvimento nacional, objetivo fundamental da República“.

Por fim, o voto de Fachin abordou a questão da não recepção dos artigos 36 e 37 do Código Tributário Nacional (CTN) pela CF/88. Ele esclareceu que, naquilo que esses dispositivos condicionam a imunidade do ITBI à não preponderância da atividade imobiliária para a hipótese de integralização de capital social, eles não foram recepcionados pela nova ordem constitucional, prevalecendo, assim, a norma hierarquicamente superior e sua interpretação mais moderna e alinhada ao espírito de fomento econômico.

Até o momento, o julgamento foi suspenso por um pedido de vista do Ministro Gilmar Mendes. Antes dessa interrupção, o placar já contava com os votos favoráveis dos Ministros Edson Fachin, Alexandre de Moraes e Cristiano Zanin.

As implicações para o ambiente de Negócios e a urgência de ações estratégicas

A potencial consolidação do entendimento pela imunidade incondicionada do ITBI na integralização de capital social representa um divisor de águas para o ambiente de negócios brasileiro. Para empresas de todos os portes, mas especialmente para o setor imobiliário – que abrange incorporadoras, loteadoras, construtoras e fundos de investimento que operam com imóveis como principal ativo –, as implicações são vastas e profundamente positivas.

Preveem-se uma economia tributária substancial, uma vez que a não incidência do ITBI sobre a integralização de imóveis no capital social, sem a restrição da atividade preponderante, desonerará significativamente os processos de capitalização e as reestruturações societárias. Haverá também um incremento notável na segurança jurídica e previsibilidade, pois a pacificação de uma discussão tão litigiosa, com a chancela do STF, permitirá um planejamento tributário mais robusto e assertivo. Por fim, espera-se um estímulo ao investimento e ao desenvolvimento, à medida que a remoção de um entrave tributário direto encorajará novos aportes no setor imobiliário e a capitalização de empresas, alinhando-se diretamente à teleologia da norma constitucional de fomentar a livre iniciativa e o crescimento econômico.

É imperativo, contudo, destacar um aspecto crucial em julgamentos de repercussão geral: a possibilidade de modulação de efeitos. Embora não haja, até o momento, um pedido formal de modulação de efeitos no RE 1.495.108, o STF detém a prerrogativa de limitar a retroatividade de sua decisão. Isso significa que, em tese, a Corte poderia decidir que a imunidade só teria validade a partir da data de publicação da decisão, ou, ainda mais relevante, que beneficiaria apenas as empresas que já tivessem ingressado com ação judicial até determinada data. Essa peculiaridade sublinha uma verdade inquestionável: a urgência para as empresas que buscam garantir seus direitos e reaver valores pagos indevidamente. A proatividade é, nesse contexto, um fator determinante.

Estratégias jurídicas: defesa de patrimônio e otimização das operações

Diante deste cenário promissor, mas que exige cautela e agilidade em razão da modulação de efeitos, é fundamental adotar medidas jurídicas estratégicas e proativas para proteção de interesses e otimização das operações:

Em primeiro lugar, é vital realizar uma revisão de operações passadas e ajuizar ações de restituição. Empresas que, nos últimos cinco anos – período estabelecido para a prescrição tributária –, realizaram integralizações de capital social com bens imóveis e foram compelidas a recolher o ITBI sob a interpretação municipal agora questionada pelo STF, têm o direito de pleitear a restituição desses valores. A via judicial é o instrumento para reaver o imposto pago indevidamente, devidamente corrigido monetariamente. Nesses casos, agir com celeridade é crucial para assegurar esse direito, principalmente se o STF optar por modular os efeitos da decisão.

Em segundo lugar, para o futuro, é essencial incorporar este novo entendimento em um planejamento tributário estratégico. A confirmação da imunidade incondicionada permitirá um planejamento mais eficiente e seguro, transformando a integralização de imóveis no capital social em uma estratégia de capitalização ainda mais atrativa, sempre observando que a imunidade se restringe ao limite do capital social a ser integralizado (conforme já pacificado no Tema 796).

Por fim, e de forma mais importante, a complexidade da matéria e a dinâmica da jurisprudência exigem o suporte de consultoria jurídica especializada. É fundamental contar com especialistas que podem identificar oportunidades, quantificar valores passíveis de restituição, e traçar a estratégia jurídica mais adequada para proteger seus interesses e otimizar sua carga tributária, garantindo a conformidade e a segurança de suas operações.

A decisão final do STF no Tema 1348 está prestes a moldar um novo paradigma para o mercado imobiliário e para as empresas que nele atuam. Contudo, para colher plenamente os benefícios dessa mudança e mitigar os riscos inerentes a um cenário de transição, a ação imediata e estratégica é, sem dúvida, o melhor investimento nesse momento.

Fonte: Jota

Carf mantém IOF sobre operações de gestão de caixa

Holding centralizava os pagamentos do grupo e registrava contabilmente os créditos e débitos mantidos com cada controlada

Por unanimidade, a 3ª Turma da Câmara Superior do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) manteve a incidência de IOF sobre operações de gestão de caixa realizadas entre uma holding e suas controladas. No caso em questão, a holding centralizava os pagamentos do grupo e registrava contabilmente os créditos e débitos mantidos com cada controlada, prática que, segundo a fiscalização, configurava empréstimos com natureza de mútuo destinados a financiar as atividades dessas empresas.

O advogado representante do contribuinte, Eduardo Lucas, do Martinelli Advogados, sustentou que os repasses tinham como finalidade otimizar o fluxo de recursos do grupo econômico, sem expectativa de retorno e nem incidência de juros e, consequentemente, sem caracterizar operação de crédito.

Para o relator, apesar dos contratos de gestão de caixa firmados com as controladas, o fato de a holding realizar pagamentos com recursos próprios para cobrir despesas das controladas, sem previsão de remuneração e sem prazo definido para reembolso, caracterizaria operação de crédito informal. O julgador concordou com o que já havia decidido a turma ordinária.

Outra matéria nesse processo, referente à possibilidade de enquadramento do Aporte para Futuro Aumento de Capital (AFAC) como operação de mútuo, não foi conhecida por unanimidade.

O processo tramita com o número 15586.720565/2016-16 e envolve a Hydria Participações e Investimentos Ltda e a Fazenda Nacional.

Fonte: Jota

Crime organizado demanda articulação nacional, diz procurador do RJ

O procurador-geral de Justiça do Rio de Janeiro, Antonio José Campos Moreira, disse nesta sexta-feira (14) que o enfrentamento ao crime organizado demanda articulação nacional e políticas de Estado, e não de governo, na área de segurança pública. 

“O Estado, sob pena de se deslegitimar, precisa dar uma resposta consistente”, disse durante o Congresso Nacional do Ministério Público, em Brasília.

Moreira destacou que o Ministério Público deve atuar de forma coordenada e integrada, com estrutura adequada, em vez de isoladamente em seus órgãos de execução.

Ao descrever a gravidade do cenário atual, o procurador citou o expressivo volume financeiro movimentado pelas organizações criminosas e, no caso do Rio de Janeiro, o impressionante poderio bélico das facções, que dispõem de verdadeiros exércitos equipados. 

“O que há no Brasil é muito grave. A criminalidade organizada, historicamente subestimada, movimenta quantias vultosas, com enorme poder corruptor, capazes inclusive de desequilibrar a economia formal”, afirmou.

O PGJ esclareceu que o Ministério Público deve agir sempre com prudência, equilíbrio e independência, sem espaço para radicalismos ideológicos. 

“Não podemos aderir nem a discursos que pregam o processo penal mínimo, nem a concepções que propõem a extinção do direito penal”, afirmou.

Fonte: EBC

Saiba mais: projeto aprovado prevê duplo grau de julgamento administrativo em questões fiscais

 

Aprovado pela Câmara dos Deputados, o Projeto de Lei Complementar (PLP) 124/22 cria a obrigatoriedade de duplo grau de julgamento administrativo em questões fiscais. O texto seguirá para nova votação no Senado.

De acordo com o substitutivo do relator, deputado Lafayette de Andrada (Republicanos-MG), as regras do texto serão aplicáveis aos entes federativos com mais de 100 mil habitantes, segundo o último censo.

Após o tributo ser exigido pelo Fisco, o contribuinte terá direito de recorrer por meio de uma impugnação, que suspenderá a exigência do tributo enquanto correr o processo administrativo.

De decisão desfavorável em 1ª instância, caberá recurso à 2ª, tanto para o Fisco quanto para o contribuinte. Se a 2ª instância der decisão diferente sobre o mesmo assunto que outro órgão de 2ª instância, caberá recurso a instância superior, se houver.

Em todos os casos, não poderá haver recurso para secretário de estado, ministro ou qualquer outro integrante do Executivo por causa de decisão definitiva favorável ao contribuinte no processo administrativo fiscal.

Outro tipo de recurso, o embargo de declaração, também será permitido para esclarecer o conteúdo da decisão, preencher omissão ou eliminar contradição ou erro material.

Ação na Justiça
Caberá ao contribuinte informar no processo se o assunto é motivo de ação na Justiça. Caso exista, ele deve renunciar ao poder de recorrer na esfera administrativa.

Efeito vinculante
Com o projeto, passam a produzir efeitos no processo administrativo fiscal (efeito vinculante) pronunciamentos do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Superior Tribunal de Justiça (STJ) com efeito vinculante no âmbito judicial.

Assim, isso se aplica a súmulas vinculantes do STF; a decisões transitadas em julgado no Supremo ou no STJ com repercussão geral ou por recursos repetitivos; e a decisões transitadas em julgado no STF por causa do controle concentrado de constitucionalidade nesse tribunal.

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Brasília - monumentos e prédios públicos - Fachada do Supremo Tribunal Federal - STF - Justiça
Decisões do STF terão efeito vinculante no processo administrativo fiscal

Também deverão ser seguidas nos processos administrativos resoluções do Senado Federal que suspenderem a execução de lei ou dispositivo legal considerados inconstitucionais pelo Supremo; e decisões repetidas e uniformes dos tribunais administrativos no âmbito dos entes federados quando compiladas em súmulas.

A fim de não negar pedidos de restituição ou autuar o contribuinte, por exemplo, o tribunal administrativo deve manter banco eletrônico de dados atualizado com informações sobre os fundamentos determinantes da decisão consolidada em súmula a partir dessas decisões reiteradas.

Suspensão automática
Quando o Supremo ou o STJ tiver determinado a suspensão coletiva de processos judiciais para a resolução da mesma questão jurídica, processos administrativos fiscais sobre essa questão também serão suspensos até a decisão final.

Para simplificar o processo administrativo fiscal, seu trâmite e julgamento poderão ser diferenciados em função do valor do crédito tributário discutido, da devolução do pagamento indevido a pedido do contribuinte ou do porte da pessoa jurídica.

Outros pontos
Confira outros pontos do PLP 124/22:

  • a sentença arbitral favorável ao contribuinte e o cumprimento de acordo de mediação extinguem o crédito tributário;
  • a transação, a mediação e a arbitragem especial não caracterizam renúncia de receita para fins da [[g Lei de Responsabilidade Fiscal]];
  • a indicação de corresponsáveis por dívida ativa dependerá de apuração prévia em processo administrativo ou judicial;
  • prazo de validade de certidão negativa de débitos tributários será de 180 dias, o prazo de emissão passa de 10 dias para 5 dias úteis e valerá para acesso a benefícios fiscais, inclusive se tratar de tributos com exigibilidade suspensa;
  • União, estados e municípios terão dois anos para adotar os critérios sobre processo administrativo com duplo grau de jurisdição;
  • Distrito Federal, estados e municípios terão dois anos para adotar descontos de multas listados no projeto a título de moderação sancionatória e dosimetria de penalidade.

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Fonte: Câmara dos Deputados

Câmara aprova projeto que permite registro de transmissão de bens entre concessionárias de energia

A Câmara dos Deputados aprovou projeto de lei que permite o registro de transmissão dos bens entre as concessionárias de geração de energia elétrica. O texto inclui a regra na Lei dos Registros Públicos (Lei 6.015/73).

De autoria do deputado licenciado Glaustin da Fokus (Pode-GO), o Projeto de Lei 6234/19 foi aprovado nesta terça-feira (11) com substitutivo do relator, deputado Cezinha de Madureira (PSD-SP). A proposta será enviada ao Senado.

Segundo o autor, o projeto procura resolver o problema enfrentado por concessionárias que venceram licitações para explorar o serviço sem que os bens sob posse da concessionária anterior tenham sido revertidos primeiramente à União, por serem bens de propriedade pública, e depois cedidos para exploração à nova empresa concessionária.

De acordo com o texto aprovado, essa transferência deverá ser realizada diretamente entre a empresa cuja concessão expirou e a atual empresa concessionária. Isso vale para os casos em que, ao conceder a outorga, a União não transfere a posse aos licitantes vencedores dos bens (todo um parque gerador hidrelétrico, por exemplo). Os bens reversíveis continuam sendo públicos, mas explorados pela iniciativa privada sob concessão.

O relator explicou que as concessões após a promulgação da Lei 12.783/13 criaram uma situação em que a transferência dos bens reversíveis, diretamente entre concessionárias, não foi possível em razão de ausência de previsão legal na Lei de Registros Públicos.

“Com isso, as concessionárias vencedoras do certame encontram-se em posse e propriedade dos bens de fato, porém os mesmos encontram-se registrados em nome das concessionárias anteriores. Essa situação poderá se replicar em outras concessões do setor energético brasileiro com o final dos contratos ou com a previsão de transferência direta entre concessionárias”, disse Cezinha de Madureira.

Ele afirmou que a situação pode causar insegurança e entraves jurídicos às concessionárias envolvidas em relação a ônus administrativos, ambientais, legais e tributários decorrentes da posse e propriedade desses bens.

Debate em Plenário
Durante o debate em Plenário, o líder do MDB, deputado Isnaldo Bulhões Jr. (AL), destacou que o texto aperfeiçoa a lei e não traz mudanças em tarifas. “Aqui não está alterando tarifa nem agredindo o bolso de consumidor nenhum. Está dando a possiblidade de o concessionário ter sua propriedade registrada”, disse.

Isnaldo Bulhões contestou fala do deputado Bohn Gass (PT-RS) de que a proposta iria acabar aumentando a conta de energia dos consumidores pelo repasse do imposto pago pelas empresas.

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Nota de alerta
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