Guardas municipais querem mais acesso a recursos da União

“O dinheiro da União não chega às guardas municipais”, afirma Reinaldo Monteiro, guarda municipal na cidade de Barueri (SP) há mais de 20 anos, e presidente da Associação Nacional de Guardas Municipais. Segundo ele, quando o Ministério da Justiça e Segurança Pública lança um edital para repasse de valores a projetos de estados e municípios, a maioria das cidades não chega a participar porque não tem corpo técnico para elaborar o projeto.

“Um município pequeno não tem um corpo técnico especializado em segurança pública para desenvolver um projeto de proteção e defesa da mulher, para desenvolver um projeto de proteção e defesa da criança e adolescente, proteção ambiental”, assinala Reinaldo Monteiro. Cerca de dois a cada três municípios são cidades com menos de 20 mil habitantes, segundo o Censo 2022.

O presidente da Associação Nacional de Guardas Municipais pede auxílio aos governadores. “Eles têm que entender que os municípios precisam trabalhar aquilo que é o básico na segurança, e liberar os seus policiais para o combate aos crimes de maior potencial ofensivo.”

A secretária executiva de Segurança Pública, Projetos e Convênios de Paudalho, município da Zona da Mata de Pernambuco, Rebeca Figueiredo, também critica a burocracia do processo. “Para atender as demandas burocráticas que eles pedem, os projetos têm que ser feitos por um PhD”, descreve

Rebeca Figueiredo e Reinaldo Monteiro participam nesta terça-feira (11), em Brasília, do Encontro de novos prefeitos e prefeitas, promovido pelo governo federal. Entre as políticas públicas em debate está a segurança dos moradores dos municípios.

Criado em 2018 (Lei 13.675), o Sistema Único de Segurança Pública prevê a integração de órgãos de segurança pública, “com a finalidade de preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, por meio de atuação conjunta, coordenada, sistêmica e integrada dos órgãos de segurança pública e defesa social da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, em articulação com a sociedade.”

Uma proposta de emenda constitucional em elaboração no governo federal e em debate com os governos estaduais eleva o Sistema Único de Segurança Pública ao status constitucional. 

De acordo com o IBGE, há guarda municipal em um de cada quatro municípios, com um efetivo de 102 mil pessoas.

Fundo a fundo 

Reinaldo Monteiro defende que o Fundo Nacional de Segurança direcione recursos diretamente aos municípios, “transferências fundo a fundo”, como desde a década de 1990 acontece com o Fundo Nacional de Saúde e também ocorre entre a União e os estados e o Distrito Federal para a segurança.

No ano passado, o Fundo Nacional de Segurança Pública repassou cerca de R$ 2,5 para os estados e o Distrito Federal. Não foram distribuídos recursos aos municípios. Do total, R$ 1,124 bilhão foi repassado transferência obrigatória (para os fundos estaduais e distrital). O restante, R$ 1,428 bilhão, financiou as atividades da Secretaria Nacional de Segurança Pública (Senasp) e projetos específicos. Para este ano, a previsão é de repassar diretamente R$ 1.166 bilhão.

Para Rebeca Figueiredo, o Sistema Universal de Segurança Pública (Susp) deveria ter mecanismo de repasse de verbas como o Sistema Único de Saúde (SUS). “O SUS tem recursos voltados para as unidades básicas. Por que a gente não tem no Susp uma unidade básica de segurança?”

Polícia de proximidade 

Na avaliação dela, a guarda municipal desenvolve trabalho fundamental para o sistema. “Somos o que há de mais moderno na segurança pública. Nós somos uma polícia de proximidade. Nós conhecemos os nossos munícipes pelo nome, conhecemos as nossas ruas, sabemos que hora abre e fecha o nosso comércio – diferente das polícias militares, que atendem todo o estado e estão hoje num município e amanhã estão em outro.”

“A Guarda Municipal atua dentro do município, conhece todo mundo, conhece tudo e a gente não é utilizado da maneira correta. Nós podemos ser uma polícia também de inteligência, dar informação aos outros órgãos”, diz Rebeca Figueiredo, que defende a transformação das guardas municipais em polícias municipais, como prevê a proposta de emenda constitucional (PEC) 57 em tramitação na Câmara dos Deputados. 

Reinaldo Monteiro é a favor de que haja mais articulação e vê complementaridade entre os trabalhos das guardas nacionais e das demais polícias. “A ideia é a gente organizar a base do Sistema Único de Segurança Pública a partir do município.” 

Levantamento

O Ministério da Justiça e da Segurança Pública, por meio da Senasp, e em parceria com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) e com a Universidade Federal de Viçosa, está fazendo um levantamento com os comandantes das guardas municipais para conhecer as capacidades operacionais e administrativas das corporações. Os comandantes têm até o dia 7 de março para responder a pesquisa.

Fonte: EBC

Profissionais do Direito devem pensar nas consequências econômicas de seus atos, diz advogado

Advogados, magistrados e demais profissionais da área jurídica devem usar a análise econômica do Direito em sua atividade profissional. É essencial que meçam as consequências das medidas para a sociedade e para o mercado, de forma a preservar a segurança jurídica e o fluxo de dinheiro. É o que afirma Luiz Roberto Ayoub, sócio do escritório Galdino, Pimenta, Takemi, Ayoub, Salgueiro, Rezende de Almeida Advogados e desembargador aposentado do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro.

 

“Eu, por exemplo, fiquei praticamente 30 anos no TJ-RJ, mas comecei a trabalhar muito cedo, fui engenheiro, aprendi a ter uma visão prática das coisas. Eu olho qual é a decisão, qual é a melhor decisão para a sociedade, para a economia, para a política. E depois dou a roupagem jurídica. Isso para mim é fazer Justiça. O resto é obsolescência”, aponta.

Especialista em Direito Empresarial, Ayoub foi o juiz do processo de recuperação judicial da Varig, a primeira após a entrada em vigor da Lei 11.101/2005, que inseriu o instituto no ordenamento jurídico. Foi um caso difícil, em que faltou colaboração para ajudar a companhia aérea a se reestruturar, avalia. Nos 20 anos da norma, porém, agentes do mercado, advogados e magistrados entenderam que o principal é buscar salvar as empresas viáveis — e, com isso, preservar empregos e renda.

Ayoub também atua em casos envolvendo clubes esportivos. Ele diz ser positiva a criação da figura das sociedades anônimas do futebol (SAFs), dizendo que elas ajudaram bastante o seu time de coração, o Botafogo — que venceu o Campeonato Brasileiro e a Libertadores em 2024.

Quanto às apostas esportivas, o advogado diz que elas podem ajudar a gerar renda para o mercado de futebol. Porém, defende que as bets inescrupulosas sejam banidas.

Leia a seguir a entrevista:

ConJur — Até que ponto as transações com os precatórios influenciam no mercado ou na economia?Luiz Roberto Ayoub — Direito e Economia são áreas do saber que devem dialogar. O Direito precisa da Economia, assim como a Economia precisa do Direito. Os precatórios são importantes porque, se o dinheiro não gira, a roda da economia também não gira. Quando um determinado valor autorizado pela Justiça não fica dormitando, pode ser injetado ou negociado no mercado, movimentando a economia. Em nosso escritório, sempre temos a preocupação de analisar a higidez dos documentos, para que não haja nenhuma surpresa, porque, apesar de o risco ser inerente a qualquer negócio, nós buscamos minimizá-los. Então, fazemos um double check sobre o que é possível, o que é remoto, o que é provável de acontecer. Nós chegamos a avaliar a possibilidade ou não de uma ação rescisória, para calibrar o deságio dos precatórios e chegar a um preço interessante para comprador e vendedor.

ConJur — O regime de pagamento de precatórios não é muito demorado? Seria possível e positivo acelerar os pagamentos?
Luiz Roberto Ayoub — O tempo é o fator que mais causa malefícios ao Direito e à sociedade. A dinâmica social não compactua com a lentidão. O fator tempo corrói o bom direito. Como mudar isso é um grande desafio, porque temos uma sociedade que é tradicionalmente formada para litigar. Enquanto houver essa cultura do litígio, nós sempre vamos conviver com o fator tempo. O Código de Processo Civil buscou reduzir a chamada “prodigalidade recursal”. É a quantidade de recursos, incidentes, que fazem com que um bom direito possa se tornar um bom direito, mas corrupto pelo tempo. Como resolver isso? Os hábitos legislativos existem, mas o comportamento humano depende de cada um.

ConJur — Como advogados, magistrados e integrantes do MP devem usar a análise econômica do Direito em suas atividades?
Luiz Roberto Ayoub — Eu sou um consequencialista. Eu sempre segui a linha do ministro Luiz Fux [de defender o uso da análise econômica do Direito]. O artigo 20 da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (Decreto-Lei 4.657/1942) fala que profissionais do Direito — magistrados, advogados e outros — devem sempre analisar os impactos do que se pede e do que se decide. Eu, por exemplo, fiquei praticamente 30 anos no TJ-RJ, mas comecei a trabalhar muito cedo, fui engenheiro, aprendi a ter uma visão prática das coisas. Eu olho qual é a decisão, qual é a melhor decisão para a sociedade, para a economia, para a política. E depois dou a roupagem jurídica. Isso para mim é fazer Justiça. O resto é obsolescência.

ConJur — Como avalia as alterações ao Direito Empresarial feitas no anteprojeto do novo Código Civil?Luiz Roberto Ayoub — Eu ainda estou estudando o projeto. Em uma análise muito precoce, eu diria que o Direito Empresarial, conforme o anteprojeto de lei do Código Civil, pretende, como todas as outras áreas do Direito, seguir o dinamismo social. A sociedade tem o seu dinamismo, e o Direito não pode ficar estagnado. A necessidade de editar normas legais a todo instante significa, em última análise, reconhecer uma insegurança jurídica, porque não sabe o que está previsto, o que vem amanhã. Hoje a sociedade é uma, amanhã é outra. Os fatos que estão acontecendo nesse exato momento que eu estou conversando com você merecem um tratamento jurídico. Amanhã será outro, porque a dinâmica social nos impõe que haja uma interpretação que esteja coadunada com a realidade econômica. Mas há boas intenções por trás do anteprojeto. E cabe aos tribunais uniformizar as interpretações e os entendimentos.

ConJur — O crescimento da procura pela recuperação judicial tem sido persistente desde 2021, na saída da crise provocada pela crise de Covid-19. E o número de pedidos de recuperação vem superando os de falências. Isso significa que o instituto da recuperação tem sido eficaz em recuperar empresas?
Luiz Roberto Ayoub — “Recuperação judicial” peca pela nomenclatura. “Recuperação” nos remete a algo que não é melhor. Mas a recuperação judicial salva, ela não mata. O problema é saber fazer. A recuperação judicial é um procedimento que se caracteriza por uma ampla negociação entre devedores e credores, por um prazo de 180 dias, que pode ser renovado por igual período, desde que não seja imputada a demora à empresa devedora, ao agente econômico devedor que postou a recuperação judicial. Então, na recuperação, há um potencial imenso.

Agentes econômicos passam por crises. Isso foi intensificado durante a epidemia de Covid-19, mas acontece sempre. A Lei de Recuperações e Falências (Lei 11.101/2005) foi recentemente atualizada pela Lei 14.112/2021, eu participei do grupo que ajudou a aperfeiçoar a norma. Hoje ela já precisa de outro aperfeiçoamento. Aí eu repito o que disse anteriormente: é melhor que os tribunais firmem entendimentos que atualizem a aplicação da norma do que ficar editando atos normativos a toda hora. E essas decisões devem ser seguidas, em nome da segurança jurídica, da economia e do ambiente de negócios.

ConJur — Como avalia a reforma da Lei 11.101/2005 pela Lei 14.112/2021?
Luiz Roberto Ayoub — A reforma é muito positiva em diversos pontos. Ela aperfeiçoa muito a figura do financiamento, cria a figura da insolvência transacional. Quando eu comecei a advogar, há 37 anos, as empresas eram majoritariamente locais, nacionais. Hoje não, são conglomerados que se espalham por todo o país, por todo o mundo. Então, o que acontece em um país tem consequências em outros. A figura da insolvência transnacional já vinha sendo admitida pela jurisprudência, mas é positivo positivá-la.

ConJur — Que mudanças ainda poderiam ser feitas na Lei 11.101/2005?
Luiz Roberto Ayoub — Há diversos pontos que poderiam ser aperfeiçoados. Por exemplo, nós encerramos a recuperação da Light, que foi um procedimento bastante complexo. Afinal, se a companhia falisse, o impacto social seria enorme, diversas pessoas iriam ficar sem luz no estado do Rio de Janeiro. Na prática, percebi que havia algumas lacunas na lei, alguns pontos que poderiam estar positivados, mas os tribunais cumpriram o seu papel.

Então, há lacunas, sempre haverá. Mas editar atos normativos a todo tempo é algo tóxico, porque gera mais insegurança. O investidor que estuda a legislação e, no dia seguinte, vê que ela mudou, não vai mais querer aplicar os seus recursos no país. É melhor deixar os tribunais suprirem essas lacunas.

ConJur — Pouco se fala da recuperação extrajudicial. Ela é um bom meio de reestruturar empresas?
Luiz Roberto Ayoub — Sim — eu inclusive estou começando uma recuperação extrajudicial agora. Atuei na recuperação extrajudicial de um clube de futebol sem a lei, mas baseada no princípio do agente econômico, da atividade econômica no passado. Hoje está previsto na lei a possibilidade de um grupo de futebol fazer recuperação extrajudicial. São agentes econômicos, geram riquezas. Não se pode pensar que um grupo de futebol hoje seja apenas lazer. Isso foi no passado. A recuperação extrajudicial originalmente prevista pela Lei 11.101/2005 carecia de maior aperfeiçoamento, enquanto àqueles que dela deveriam e poderiam se utilizar, faltava um maior conhecimento. A Lei 14.112/2020 deu uma grande força à recuperação extrajudicial. E ela ainda vai ser impulsionada com o esforço interpretativo dos tribunais. A recuperação extrajudicial já começou a mostrar a que veio.

ConJur — Como foi ser o juiz do processo de recuperação judicial da Varig?
Luiz Roberto Ayoub — Foi um desafio imenso, foi muito difícil, muito desgastante. Mas, ao mesmo tempo, muito enriquecedor. Se você não for ousado com responsabilidade, se não for inovador, buscando tirar da letra da lei o que você pretende, focado nos princípios constitucionais, não irá gerar resultados que acompanhem o dinamismo político, econômico e social do país.

O processo da Varig iniciou-se logo após a Lei 11.101/2005 entrar em vigor. Era uma lei totalmente desconhecia e muito interdisciplinar, exigia conhecimento de diversas áreas do saber. Por isso, os administradores judiciais devem ter equipes interdisciplinares, não serem meros fiscais do processo. No caso da Varig, eu fiz com que o administrador judicial fosse um auxiliar do juízo, com atribuições baseadas no rol exemplificativo do artigo 22 da Lei 11.101/2005. Isso enriqueceu o processo.

Uma grande dificuldade foi a falta de colaboração entre os juízos e órgãos administrativos. Hoje é um princípio do Código de Processo Civil, e nem precisava estar positivado. Diversos órgãos atuavam pela salvação da Varig. Mas faltou colaboração para ajudar a recuperação da empresa. Recuperação não é um lugar de litígio, mas de ampla negociação. Caso contrário, o resultado será a falência.

E mesmo a falência havia recebido, da Lei 11.101/2005, uma finalidade totalmente diferente da que tinha sob o Decreto 7.661/1945, que previa a liquidação e venda dos ativos, se fosse possível vender, porque tinha um procedimento mais demorado. Hoje o objetivo principal é salvar a empresa. Só não se salva quando a empresa não é viável. Mas dizer que uma empresa falida não é viável é uma conclusão precipitada e equivocada. Porque empreender, principalmente no Brasil, é muito difícil. Às vezes, uma pequena crise pode tirar do empreendedor a possibilidade de empreender, mesmo ele sendo um bom empreendedor. Agora, se é uma pessoa que não respeita as leis, ela tem que ser banida do meio empresarial e punida. Punir o empresário não é punir a empresa.

Hoje, falência não é quebra com a alienação de ativos para pagamento dos credores. Tanto recuperação como falência visam salvar a atividade econômica. Entre os elementos que decorrem nesse salvamento está o pagamento dos credores, dentro do possível. Porque pior do que receber menos é ter o desaparecimento de uma empresa. Isso é negativo para a nação. Não existe nação sem empresa, não existe emprego sem empresa, não existe salário sem empresa, não existe dignidade sem salário.

ConJur — Qual é o impacto das sociedades anônimas do futebol (SAFs) no setor esportivo e na economia brasileiros?
Luiz Roberto Ayoub — Agora que vamos começar a sentir o impacto. Eu inclusive estou atuando em uma recuperação que ainda não sabemos se seguirá o caminho da judicialidade ou extrajudicialidade aqui no Rio de Janeiro [do Vasco da Gama]. Eu comecei nessa área com a recuperação extrajudicial do Figueirense, sem a lei, não como agente econômico. Agora os grandes clubes, que são grandes empresas, podem assumir essa forma econômica. Eles lidam com direitos de imagem, bilheteria de jogos, patrocínios. Tudo isso movimenta a economia, é um mercado muito grande. Eu sou botafoguense, já fui muito mais sofredor do que sou hoje. O trabalho brilhante de Thairo Arruda [CEO do Botafogo], com John Textor [dono da SAF do Botafogo], mostrou o que pode ser feito e o que pode ser melhorado. Eles fizeram uma recuperação extrajudicial com muita responsabilidade. Não há recuperação sem dinheiro novo. Não há recuperação sem ativos para monetizar o procedimento de reorganização de um agente econômico.

ConJur — As empresas de apostas esportivas estão cada vez mais ligadas a times de futebol. Como isso impacta o mercado de futebol?
Luiz Roberto Ayoub — Bom, primeiro é preciso fazer uma separação entre aqueles que são profissionais sérios, corretos, e aqueles que não são. Se forem promovidas com responsabilidade, com olhar na lei, nos princípios constitucionais, as apostas podem gerar um benefício muito grande, não só para as associações esportivas, não só para as SAFs, mas para a economia em geral. Se há dinheiro rodando, há injeção de recursos na economia. Mas as bets que têm propósitos desvirtuados devem ser banidas.

ConJur — Como seria uma regulamentação razoável das apostas esportivas?
Luiz Roberto Ayoub — Não tenho capacidade para responder. Mas, por enquanto, deve haver uma cooperação entre os tribunais e os órgãos envolvidos no setor esportivo, como CBF, Fifa e Banco Central.

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Sem melhora na saúde do interditado, não é possível substituir curatela por tomada de decisão apoiada

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou provimento ao recurso apresentado por um homem que pretendia substituir a curatela de seu pai pelo mecanismo da tomada de decisão apoiada (TDA). O colegiado se baseou na constatação das instâncias ordinárias de que não foi provada a melhora no quadro de saúde do interditado para permitir essa alteração.

O recurso ao STJ teve origem em ação ajuizada pelo curatelado, representado por seu filho, para levantar a curatela e substituí-la pela TDA. O requerimento foi negado em primeiro grau e pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), pois a prova pericial produzida no processo demonstrava que as razões da curatela ainda persistiam.

O interditado sofreu um acidente vascular cerebral em 2015e, por conta dos seus desdobramentos, foi interditado no ano seguinte, com curatela quanto à prática de atos negociais e patrimoniais.

Levantamento da curatela exige fim ou mitigação dos motivos da interdição

Segundo a relatora do recurso no STJ, ministra Nancy Andrighi, para o levantamento da interdição e da curatela, deve haver o desaparecimento ou a mitigação das circunstâncias que justificaram a medida.

A ministra explicou que o encerramento da curatela, quando provado o fim da causa que a determinou, pode levar ao reconhecimento de que a pessoa está novamente apta a praticar quaisquer atos da vida civil; ou, se houver melhora significativa do quadro clínico, pode levar à adoção de uma medida menos gravosa do que a interdição, como a TDA (artigo 1.783-A do Código Civil).

A relatora ponderou a respeito da importância dessa investigação nas situações em que o requerimento não puder ser formulado diretamente pelo interditado, como no caso em análise.

Decisão não pode ser à revelia do principal interessado

“Conquanto, na hipótese sob julgamento, o requerimento de levantamento de curatela e de substituição por tomada de decisão apoiada tenha sido realizado formalmente em nome do interditado, fato é que ele está sendo processualmente representado pelo seu filho em virtude da inviabilidade de, autonomamente, contratar advogado para manifestar propriamente o seu desejo, justamente em razão da curatela anteriormente deferida, que restringiu a prática de atos negociais e patrimoniais”, ressaltou.

Para a ministra, não é possível saber se é do interesse do interditado ter um rol de apoiadores – necessário na TDA –, bem como se seu filho seria uma pessoa indicada e idônea para desempenhar esse papel. “Não se pode implementar a medida compulsoriamente e à revelia dos interesses do potencial beneficiado”, comentou.

Ainda que a doença do interditado seja uma das admitidas para a TDA, a ministra verificou que, no caso, a sentença e o acórdão do TJSP foram categóricos em afirmar que não houve evolução clínica do seu quadro – que não é de enfermidade apenas motora, mas também mental.

O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.

Fonte: STJ

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Mais segurança no acesso ao Registrato e ao SVR

O acesso ao Sistema de Valores a Receber (SVR) e ao Registrato, sistemas do Banco Central (BC), será ainda mais seguro a partir de 13 de fevereiro. Ele continuará a ser realizado com conta gov.br nível prata ou ouro, mas será permitido apenas para contas que tiverem a verificação em duas etapas habilitada. 

Para habilitar essa verificação, o cidadão deve instalar no celular o aplicativo gov.br (disponível na Google Play e na App Store). Após a habilitação, o cidadão usará um código único para autenticar cada acesso que fizer aos serviços que usam a conta gov.br. 

O próprio aplicativo orienta a forma de habilitar a verificação em duas etapas. No primeiro acesso, o dispositivo usado será vinculado à conta gov.br do cidadão.

“Poderá haver somente um dispositivo vinculado por vez. Também será necessária a realização da validação facial para configuração da verificação em duas etapas. Assim, o código de acesso será gerado apenas neste dispositivo”, disse Maria Clara Haag, Chefe de Subunidade no Departamento de Atendimento Institucional (Deati) do BC.  

As mudanças entram em vigor no próximo dia 13. No entanto, quem tiver dificuldade no assunto pode, desde já, acessar este link para obter mais informações. Além da verificação em duas etapas, a página auxilia no processo de elevação do nível da conta para prata ou ouro. 

“O Registrato permite a consulta de informações pessoais. Essa medida visa ao fortalecimento da confiança do cidadão no uso dos serviços do BC de forma segura”, disse Maria Clara Haag, Chefe de Subunidade no Departamento de Atendimento Institucional (Deati) do BC.  

Serviço relevante

Há cinco relatórios que ajudam os cidadãos a acompanharem sua vida financeira de forma rápida e simples: de Contas e Relacionamentos (CCS), de Empréstimos e Financiamentos (SCR), de Chaves Pix, de Cheques sem Fundo (CCF) e de Câmbio e Transferências Internacionais. 

Em 2024, o número de relatórios emitidos pelos usuários do Registrato ficou próximo a 28 milhões. O recorde mensal aconteceu em outubro passado: foram mais de 3 milhões de relatórios emitidos no mês. 

Sistema de Valores a Receber (SVR) 

A autenticação em duas etapas também passará a ser necessária para acessar o Sistema de Valores a Receber (SVR) e para solicitar a devolução de valores, independentemente da faixa. Haag lembra que hoje ela já é exigida para devoluções acima de R$100. 

A consulta pública ao SVR, que permite ao cidadão verificar se tem valores a receber, não muda. Nesse caso, basta informar o CPF e a data de nascimento da pessoa física ou o CNPJ e a data de criação da pessoa jurídica. 

Cerca de R$8,7 bilhões ainda podem ser solicitados por meio do SVR. Saiba mais aqui

Fonte: BC

STF adia conclusão de julgamento sobre revista íntima em presídios

O Supremo Tribunal Federal (STF) adiou nesta quinta-feira (6) a decisão sobre a legalidade da revista íntima vexatória nos presídios para evitar a entrada de drogas, armas e celulares.

Os ministros iniciaram a discussão sobre a questão, mas após os votos dos ministros Edson Fachin e Alexandre de Moraes, o presidente do STF, Luís Roberto Barroso, suspendeu o julgamento, que será retomado na quarta-feira (12). Faltam os votos de nove ministros.

Caso

A Corte julga um recurso do Ministério Público para reverter a absolvição de uma mulher flagrada tentando entrar em um presídio de Porto Alegre com 96 gramas de maconha enrolados em um preservativo e acondicionados na vagina.

Na primeira instância, ela foi condenada, mas a Defensoria Pública recorreu ao Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS), que a absolveu, por entender que o procedimento de revista íntima foi ilegal.

O ministro Fachin, relator do caso, reconheceu a ilegalidade das revistas íntimas vexatórias. No entendimento do ministro, durante a visita de parentes ou amigos de presos nas penitenciárias, não poderá ocorrer a retirada de roupas íntimas para inspeção das cavidades corporais sem justificativa.

Procedimento

A revista manual poderá ocorrer, mas não poderá ser vexatória. O procedimento deve ocorrer somente quando houver indícios de entrada ilegal de objetos ou drogas. As suspeitas deverão ser apuradas a partir do uso de aparelhos eletrônicos (scanners e raio-x), informações de inteligência ou comportamento suspeito.

Pelo voto do relator, caso a determinação do Supremo não seja cumprida, as provas obtidas contra pessoas acusadas de entrar com objetos ilegais nos presídios serão invalidadas.

Fachin também determinou prazo de 24 meses para os presídios comprarem equipamentos de scanners e de raio-x.

Divergência

Em seguida, o ministro Alexandre de Moraes abriu a divergência. Para o ministro, a revista íntima pode ser realizada, mas só diante da falta de equipamentos de raio-x e com a concordância do visitante. A revista ainda deverá ser realizada obrigatoriamente por agentes do mesmo sexo. Se houver recusa na visita, a administração do presídio poderá impedir a entrada.

Moraes também disse que as revistas superficiais de visitantes não têm efeito. O ministro afirmou que o número de apreensões de drogas, celulares, armas brancas e de fogo nos presídios do país chegou a 625 mil nos últimos dois anos. 

“Esse material jamais é pego por revistas superficiais, quem vai visitar não coloca na bolsa, na cintura. Todas essas apreensões são realizadas ou embaixo das roupas íntimas ou nas cavidades do corpo. Revistas superficiais não servem para nada”, afirmou.

Moraes também destacou que a decisão da Corte pode gerar a suspensão de visitas em presídios que não possuem raios-x. 

“Ao gerar uma apreensão quase geral, nós vamos gerar uma sequência de rebeliões. Se tem algo que gera rebelião é quando se impede a visita”, concluiu. 

Fonte: EBC

AGU pede celeridade no julgamento sobre responsabilização das redes

A Advocacia-Geral da União (AGU) pediu nesta sexta-feira (7) ao Supremo Tribunal Federal (STF) celeridade na retomada do julgamento sobre a responsabilização das redes sociais pelos conteúdos ilegais postados pelos usuários.

O julgamento foi suspenso em dezembro do ano passado após um pedido de vista do ministro André Mendonça. A data para retomada ainda não foi marcada.

Na petição enviada ao STF, a AGU afirma que o tema deve ser tratado como prioridade diante do anúncio da Meta (controladora do Instagram, Facebook e Whatsapp) de novas regras que podem flexibilizar o combate aos discursos de ódio.

Para o órgão, o novo modelo dos termos de uso das plataformas permite a disseminação de mensagens com teor racista, xenofóbico, misógino e homofóbico.

“Alterações promovidas pela recorrente em seus termos de uso, notadamente quanto à maior permissividade para o discurso de ódio contra grupos vulneráveis, violam o conjunto de fundamentos e soluções até aqui delineadas por essa Suprema Corte para o deslinde da controvérsia constitucional em relação a práticas criminosas”, argumenta a AGU.

A AGU também pediu ao Supremo a juntada do documento que reúne as contribuições recebidas pelo órgão durante a audiência pública realizada em janeiro deste ano para debater a proteção dos direitos fundamentais nas redes sociais.

Entenda

O plenário do STF julga dois processos que discutem a constitucionalidade do Artigo 19 do Marco Civil da Internet.

Na ação relatada pelo ministro Dias Toffoli, o tribunal discute a validade da regra que exige ordem judicial prévia para responsabilização dos provedores por atos ilícitos. O caso trata de um recurso do Facebook para derrubar decisão judicial que condenou a plataforma por danos morais pela criação de perfil falso de um usuário.

No processo relatado pelo ministro Luiz Fux, o STF julga se uma empresa que hospeda um site na internet deve fiscalizar conteúdos ofensivos e retirá-los do ar sem intervenção judicial. O recurso foi protocolado pelo Google.

Até o momento, três votos já foram proferidos no julgamento.

Fonte: EBC

Mendes rejeita recursos sobre descriminalização do porte de maconha

O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribuna Federal (STF), rejeitou, nesta sexta-feira (7), dois recursos feitos pelo Ministério Público do Estado de São Paulo (MPSP) e pela Defensoria Pública do Estado de São Paulo (DPESP), que pediam esclarecimentos sobre a decisão do plenário segundo a qual o porte de até 40 gramas (g) de maconha não é crime. 

O tema voltou a julgamento no plenário virtual, em que os ministros depositam seus votos de forma remota. A análise começou na manhã desta sexta e segue até as 23h59 da próxima sexta-feira. Relator do processo, Mendes foi o único a votar até o momento. 

O ministro rejeitou ponto a ponto o que seriam obscuridades e omissões apontadas pelos órgãos paulistas na decisão. Nos recursos, do tipo embargos de declaração, foram feitos cinco questionamentos principais pelo Ministério Público e dois pela Defensoria Pública.

Em tese, os embargos de declaração não seriam capazes de alterar o resultado do julgamento, mas somente esclarecer pontos da decisão, ainda que existam casos nos quais esse tipo de recurso acaba resultando na alteração do resultado final. 

Mendes nega, por exemplo, que haja margem para a interpretação de que a decisão “abrangeria outras drogas além da Cannabis sativa”. O MPSP queria que o Supremo fosse mais assertivo nesse ponto, por entender que a tese final de julgamento não havia ficado clara o bastante. 

Mesmo nos casos envolvendo quantidades maiores que 40g de maconha, Mendes considera ter ficado claro na decisão do Supremo que “o juiz não deve condenar o réu [por tráfico de drogas] num impulso automático”.

A defensoria paulista havia apontado que, como ficou escrito, a tese final do julgamento poderia dar a entender que cabe à pessoa flagrada com a maconha provar que é usuária e não traficante. O ministro esclareceu que a quantidade de droga “constitui apenas um dos parâmetros que deve ser avaliado para classificar a conduta do réu”. 

“Em síntese, o que deve o juiz apontar nos autos não é se o próprio acusado produziu prova de que é apenas usuário, mas se o conjunto de elementos do art. 28, §2º, da Lei 11.343/2006 permite concluir que a conduta do réu tipifica o crime de tráfico ou o ilícito de posse de pequena quantidade de Cannabis sativa para uso pessoal”, explicou. 

Retroatividade

Outro ponto rejeitado por Mendes trata do efeito temporal da decisão. O MPSP pediu que o Supremo deixasse mais claro se a descriminalização do porte de 40g de maconha se aplicaria ou não aos casos anteriores ao julgamento, até 2006, quando foi publicada a Lei de Drogas (Lei 11.343/2006). 

Mendes frisa que o plenário do Supremo não foi omisso nem obscuro sobre o ponto. “Muito pelo contrário. O acórdão [decisão colegiada] determinou que o CNJ [Conselho Nacional de Justiça] realize mutirões carcerários, a indicar que a decisão impacta casos pretéritos”, escreveu o ministro. 

Dessa maneira, o relator confirma que a decisão beneficia os réus em casos passados, mesmo quando o réu já está cumprindo a pena, que deve ser aliviada. Da mesma maneira, a decisão do plenário em nada impede a participação do Ministério Público nos mutirões carcerários determinados pelo Supremo, outro ponto questionado pelo MPSP, assegura Mendes. 

O ministro ressalta ainda que, pela decisão do Supremo, não é possível impor sanções de natureza criminal aos usuários de maconha, incluindo a pena de serviços comunitários, após o MPSP ter cogitado uma possível aplicação desse tipo de sanção. 

“Conforme já afirmado, a decisão deixou clara a inviabilidade de repercussão penal do citado dispositivo legal em relação ao porte de Cannabis sativa para uso pessoal, razão por que a prestação de serviços à comunidade (inciso II) não deve ser aplicada em tais hipóteses, tendo em conta tratar-se de sanção tipicamente penal”, afirma Mendes. 

Skunk e haxixe

O MPSP questionou ainda se o porte de maconha deixa de ser crime apenas se a droga estiver na forma da erva seca ou se abrangeria “qualquer produto que contenha o THC”, princípio ativo da Cannabis sativa, como o haxixe e do skunk, que podem alcançar concentrações mais fortes de psicoativos.

Mendes também nega que haja algo a esclarecer nesse ponto. “O deslinde da controvérsia se restringiu à droga objeto do recurso extraordinário, e nenhuma manifestação estendeu tal entendimento para os entorpecentes citados pelo embargante (haxixe e skunk)”, escreveu o ministro. 

O julgamento sobre a descriminalização do porte de maconha foi concluído em junho do ano passado, após diversas tentativas de pautar o tema e sucessivos atrasos e pedidos de vista. Ao menos seis ministros, a maioria, votaram no sentido de que o porte de 40g de maconha e o plantio de até seis plantas fêmeas de cannabis sativa não são crime. Alguns ministros, contudo, proferiram votos intermediários, o que dificultou cravar um placar final. 

Pela tese que prevaleceu ao final, em pleno vigor desde a publicação da ata de julgamento, as quantidades de 40g de maconha e seis plantas fêmeas servem como referência até que o Congresso delibere sobre o assunto e eventualmente defina novos parâmetros. 

Fonte: EBC

IBS/CBS sobre locação de temporada por pessoas físicas

Um tema que foi pouquíssimo debatido durante a tramitação da Proposta de Emenda Constitucional nº 45 e do Projeto de Lei Complementar nº 68 foi a incidência do IBS e da CBS sobre fornecimento de bens e serviços por pessoas físicas. Na última década, tornou-se cada vez mais comum a locação de imóveis por temporada, por meio de plataformas digitais. Nosso objetivo neste texto é analisar como a Lei Complementar nº 214/2024 (LC 214) disciplinou a incidência do IBS e da CBS nesses casos.

Incidência ampla

Sabe-se que um dos grandes avanços do IBS e da CBS é a sua base de incidência mais ampla. O modelo de tributação sobre o consumo ainda em vigor permite vácuos de incidência inexplicáveis, como a não tributação de atividades de locação pelo ISS.

Já o IBS e a CBS “incidem sobre operações onerosas com bens ou  com serviços” (artigo 4º da LC 214), sendo que as definições de operação com bens (artigo 3º, I, “a” da LC 214) e de operação com serviços (artigo 3º, I, “b” da LC 214) são amplas o bastante para alcançar as atividades econômicas que conhecemos atualmente, ainda mais considerando que a definição de operação com serviços é basicamente residual, prevendo-se que são operações com serviços todas aquelas que não sejam operações com bens.

Dessa forma, da perspectiva da hipótese de incidência do IBS e da CBS, não parece haver dúvidas quanto ao fato de que ela inclui atividades de locação.

Contribuinte do IBS e da CBS

Os contribuintes do IBS e da CBS estão previstos no artigo 21 da LC 214. Segundo o inciso I deste dispositivo, é contribuinte do IBS e da CBS “o fornecedor que realizar operações: a) no desenvolvimento de atividade econômica; b) de modo habitual ou em volume que caracterize atividade econômica; ou c) de forma profissional, ainda que a profissão não seja regulamentada”.

A utilização da conjunção “ou” ao final da alínea “b” indica que se trata de situações independentes de sujeição passiva, bastando-se que o fornecedor se enquadre em uma dessas situações para que possa ser considerado contribuinte dos tributos em questão.

Dessa forma, em princípio, uma pessoa física atuando na locação de imóveis por temporada poderia ser contribuinte do IBS e da CBS sobre tal fornecimento de bens.

As regras específicas sobre operações com bens imóveis

A LC 214 trouxe algumas regras específicas sobre a incidência do IBS e da CBS sobre operações com bens imóveis, a partir de seu artigo 251. De acordo com este dispositivo, “as operações com bens imóveis realizadas por contribuintes que apurarem o IBS e a CBS no regime regular ficam sujeitas ao regime específico previsto neste Capítulo” (destaque do colunista).

Uma expressão chave para compreendermos as regras sobre a tributação de operações com bens imóveis é “contribuintes que apurarem o IBS e a CBS no regime regular”. Este artigo 251 está estabelecendo que, no que se refere a operações com imóveis, a incidência ocorrerá em relação a operações realizadas por contribuintes que apurarem o IBS e a CBS no regime regular. Tanto assim, que o § 1º deste artigo 251 vai delimitar quem são tais contribuintes.

O inciso I do § 1º do artigo 251 da LC 214 trata das operações de locação de bem imóvel realizadas por pessoas físicas. Veja-se a redação deste dispositivo:

“§ 1º As pessoas físicas que realizarem operações com bens imóveis serão consideradas contribuintes do regime regular do IBS e da CBS e sujeitas ao regime de que trata este Capítulo, nos casos de:

I – locação, cessão onerosa e arrendamento de bem imóvel, desde que, no ano-calendário anterior:

  1. a) a receita total com essas operações exceda R$ 240.000 (duzentos e quarenta mil reais); e

b) tenham por objeto mais de 3 (três) bens imóveis distintos; […].”

Ao analisarmos o § 1º, verificamos que ele veicula uma regra inclusiva que visa estabelecer quem está dentro do conjunto “contribuintes do regime regular do IBS e da CBS”. Em outras palavras, somente estarão sujeitos à incidência desses tributos as pessoas físicas que atenderem os requisitos previstos em seus incisos.

Locações feitas por pessoas físicas

Segundo o inciso I do § 1º do artigo 251 da LC 214, uma pessoa física que realize uma operação de locação será considerada um contribuinte no regime regular do IBS e da CBS se (a) a receita total dessas operações, no ano-calendário anterior, exceder R$ 240 mil e (b) tais operações tiverem por objeto mais de três imóveis distintos.

Note-se que se trata de requisitos cumulativos. Ou seja, caso a pessoa física tenha receita superior a R$ 240 mil com a locação de um único imóvel, segundo entendemos, ela não seria considerada contribuinte.

Um aspecto interessante, e que pode gerar discussões, é a utilização do conceito de receita, que não é típico da regulação do IBS e da CBS. É possível que surjam discussões qualificatórias sobre determinado fato econômico configurar, ou não, “receita de locação”. Por exemplo, se o locatário assume o dever de pagar o IPTU e o condomínio de um apartamento, esses valores integrariam a “receita de locação”?

Como vimos, estes requisitos previstos no inciso I do § 1º do artigo 251 da LC 214 referem-se ao ano-calendário anterior. Esta regra é complementada pelo inciso II do § 2º deste mesmo artigo, segundo o qual “também será considerada contribuinte do regime regular do IBS e da CBS no próprio ano calendário, a pessoa física de que trata o caputdo § 1º deste artigo”, em relação à “a locação, cessão onerosa ou arrendamento de bem imóvel em valor que exceda em 20% o limite previsto na alínea “a” do inciso I do § 1º deste artigo”.

Este inciso estabelece que, caso, no próprio ano-calendário, a pessoa física tenha rendimentos decorrentes da locação de bem imóvel em valor 20% superior a R$ 240 mil, ou seja, valor superior a R$ 288 mil, ela também será considerada contribuinte do regime regular do IBS e da CBS, mesmo que não tenha atingido os requisitos em relação ao ano-calendário anterior.

Neste caso, não se fez referência à necessidade de tal receita ser auferida mediante a locação de mais de três imóveis distintos.

Em resumo, parece-nos que o tratamento das operações de locação por pessoas físicas e os casos em que a pessoa física será considerada contribuinte sujeito ao regime regular do IBS e da CBS podem ser sumariadas da seguinte forma:

Ano-Calendário AnteriorAno-Calendário Corrente
– Receita total superior a R$ 240 mil     – Locações que tenham por objeto mais de três imóveis distintos – Receita total superior a R$ 288 mil    

Vale observar que esses valores devem ser atualizados mensalmente pelo IPCA ou por outro índice que venha a substituí-lo, desde a publicação da LC 214 (§ 5º do artigo 251 da LC 214).

Por fim, é interessante destacar que a LC 214 trouxe uma regra de delegação legislativa que transfere para o regulamento o que seriam “imóveis distintos” para fins de aplicação do inciso I do § 1º do artigo 251 da LC 214.

Regras específicas sobre locação por temporada

As regras que analisamos acima referem-se à tributação pelo IBS e pela CBS de locações de bens imóveis em geral por pessoas físicas. Contudo, a  LC 214 trouxe uma regra específica sobre operações de locação por temporada no seu artigo 253, cuja redação é a seguinte:

“Art. 253.A locação, cessão onerosa ou arrendamento de bem imóvel residencial por contribuinte sujeito ao regime regular do IBS e da CBS, com período não superior a 90 (noventa) dias ininterruptos, serão tributados de acordo com as mesmas regras aplicáveis aos serviços de hotelaria, previstas na Seção II do Capítulo VII do Título V deste Livro.” (destaque do colunista)

Vê-se que este artigo trata de situações que estão contidas no conjunto das locações de imóveis por pessoas físicas. O artigo 253 aplica-se apenas a contratos de locação com prazo não superior a 90 dias ininterruptos. Nesses casos, o regime de IBS/CBS aplicável não será o das operações com bens imóveis, mas sim aquele incidente sobre os serviços de hotelaria.

Contudo, e este aspecto é importante, este artigo 253 somente se aplica a “contribuinte sujeito ao regime regular do IBS e da CBS”. Ou seja, se a pessoa física não atende aos requisitos para que seja considerada como tal, o IBS e a CBS seguirão inaplicáveis.

Diferentes situações possíveis

Em linha com os comentários anteriores, podemos cogitar das seguintes situações:

– Receita total no ano-calendário anterior inferior a R$ 240 mil, ou superior, porém decorrente da locação de três imóveis ou menos:

– Se a receita corrente decorrente de operações de locação for inferior a R$ 288 mil, a pessoa física não será considerada contribuinte sujeito ao regime regular do IBS e da CBS e, portanto, estará excluída da incidência do IBS/CBS, independentemente do prazo do contrato.

– Se a receita corrente decorrente de operações de locação for superior a R$ 288 mil, a pessoa física será considerada contribuinte sujeito ao regime regular do IBS e da CBS. Neste caso, o prazo do contrato será relevante:

– Se o prazo do contrato for superior a 90 dias, o regime de IBS/CBS aplicável será aquele referente a operações com bens imóveis.

– Se o prazo do contrato for inferior a 90 dias, o regime de IBS/CBS aplicável será aquele referente aos serviços de hotelaria.

– Receita total no ano-calendário anterior superior a R$ 240 mil, decorrente da locação de mais de três imóveis.

– A pessoa física será considerada contribuinte sujeito ao regime regular do IBS e da CBS. Neste caso, o prazo do contrato será relevante:

– Se o prazo do contrato for superior a 90 dias, o regime de IBS/CBS aplicável será aquele referente a operações com bens imóveis.

– Se o prazo do contrato for inferior a 90 dias, o regime de IBS/CBS aplicável será aquele referente aos serviços de hotelaria.

Vale a pena reiterarmos que esses valores estão sujeitos a atualização pelo IPCA ou outro índice que o substitua desde a publicação da LC 214.

Conclusão

Boa parte do debate sobre a reforma tributária foi pautada pelo seu grande objetivo: a simplificação. Esta, de tão relevante, acabou ganhando referência explícita na Constituição, no § 3º do artigo 145. Contudo, simplificação é uma noção comparativa, não absoluta. Algo torna-se mais simples em relação a outra coisa mais complexa, o que não significa que o novo, em si, será simples.

A Emenda Constitucional nº 132 e a LC 214, se podem ser consideradas um passo adiante em direção a um sistema menos complexo, não significam que a tributação se tornará simples. O tema que tratamos brevemente nesta coluna é prova disso, e estamos falando de um grupo restrito de transações. O novo Sistema Tributário Nacional, e toda a sua complexidade, ainda vão se revelar para nós nos próximos anos, e devemos estar preparados.

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Advogados não devem aceitar determinação do Direito por juízes, diz Streck

O advogado, parecerista e professor Lenio Streck afirmou nesta quarta-feira (5/2) que os advogados não devem aceitar a determinação do Direito por juízes, desembargadores e ministros. Para ele, os causídicos ficarão sem função se pensarem “que o Direito é aquilo que os tribunais dizem que é”.

Lenio Streck
Streck participou de seminário promovido pelo escritório Tourinho Leal Drummond de Andrade Advocacia – Conjur

 

Streck fez esse comentário ao avaliar o atual protagonismo “sem critérios” da figura do juiz no sistema de Justiça brasileiro. “Criou-se a ideia, e o Superior Tribunal de Justiça e o Supremo Tribunal Federal compraram essa ideia, de que o Direito é indeterminado. Se o Direito é indeterminado, quem vai determiná-lo são os tribunais. Daí eles se empoderam.”

O jurista classificou esse entendimento como parte de uma postura “cético-realista”. “Se os tribunais dizem o que é o Direito, quem vai poder dizer o que os tribunais não podem dizer do Direito se eles mesmos fazem os seus próprios critérios para dizer o que é o Direito?”, questiona.

Streck defende que o papel dos advogados nesse contexto é apontar os erros cometidos pelas cortes sempre que isso acontecer: “O tribunal precisa se sentir acuado, constrangido (quando errar)“.

Ao fazerem seu trabalho, disse ele, os profissionais precisam “buscar enxergar mais longe” e exigir evidências empíricas para a tomada de decisões. Isso evitaria situações de “gaslighting jurídico” — expressão cunhada por ele mesmo, em texto publicado em sua coluna na revista eletrônica Consultor Jurídico, para se referir a casos em que o Judiciário ignora elementos objetivos ou comete “erros crassos”.

Lenio Streck participou nesta quarta do seminário Jurisprudência Defensiva nas Cortes Superiores, promovido pelo escritório Tourinho Leal Drummond de Andrade Advocacia, em Brasília. O evento foi exclusivo para advogados e executivos.

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Termo de adesão a associação de moradores não vale como título executivo extrajudicial

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que o termo de adesão associativa celebrado entre o proprietário de um terreno e a associação que administra o loteamento não possui natureza jurídica de título executivo extrajudicial.

Na origem do caso, a associação de moradores ajuizou ação de execução para receber valores referentes a taxas ordinárias e extraordinárias de um morador associado. Ao analisar os embargos opostos pelo réu, o juízo extinguiu a execução, sob o fundamento de ausência de título executivo extrajudicial, e declarou inexistente a relação jurídica entre as partes. O tribunal estadual manteve o entendimento.

No recurso especial dirigido ao STJ, a associação sustentou a possibilidade de mover a execução de título extrajudicial com base no termo de adesão firmado entre o proprietário e a entidade.

Títulos executivos extrajudiciais estão previstos na legislação

A relatora, ministra Nancy Andrighi, lembrou que os títulos executivos extrajudiciais surgiram com o objetivo de afastar a obrigação de se passar por todo o processo de conhecimento, permitindo o ajuizamento direto da execução. “A técnica dos títulos executivos extrajudiciais representa verdadeira exceção ao processo de cognição exauriente”, destacou.

A ministra apontou que, diante da gravidade das medidas executivas que poderão recair sobre a parte executada, só podem ser considerados títulos executivos extrajudiciais os previstos na legislação ordinária – especificamente no artigo 784 do Código de Processo Civil (CPC), cuja interpretação deve ser restritiva. Assim, por exemplo, segundo a relatora, o inciso VIII do dispositivo trata do contrato de locação de imóveis, não podendo ser estendido para abarcar o rateio das despesas de uma associação de moradores. 

No mesmo sentido, ela ressaltou que não se pode confundir a associação com o condomínio para efeito de aplicação do inciso X do artigo 784 do CPC, que trata do crédito decorrente de contribuições condominiais.

Interpretação extensiva prejudica a segurança jurídica

A ministra enfatizou que, de acordo com a tipicidade dos títulos executivos, não se pode admitir uma interpretação que amplie o seu âmbito de incidência para alcançar a hipótese de créditos decorrentes do rateio de despesas de associação de moradores.

Para Nancy Andrighi, há prejuízo à segurança jurídica nos casos em que a interpretação ignora a existência de normas jurídicas expressas, devendo o intérprete “evitar ao máximo a incerteza normativa e a discricionariedade”.

Fonte: STJ

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