Por que há tantos Habeas Corpus no STF?

O ministro Flávio Dino disse há poucos dias que o STF terá que restringir o manejo de Habeas Corpus pelas partes. Exemplificou a questão pontuando que o tráfico privilegiado, que é um dos temas mais comuns em concessões de Habeas Corpus no STF, é “matéria de fatos e provas”.

“Será que nós vamos ficar examinando milhares e milhares de Habeas Corpus para deles não conhecer? Dizendo que, por exemplo, tráfico privilegiado é matéria de fatos e provas e que não seremos nós que vamos infirmar a conclusão das instâncias ordinárias? De que serve isso? Para que serve isso?”, questionou.

Algumas questões exsurgem da declaração do ministro. Primeiro, se há pedidos de Habeas Corpus no STF (e no STJ) é porque algo não funcionou nas duas instâncias do sistema. Não adianta reclamar das águas do rio se as margens é que o oprimem. Quem examinar minimamente o cotidiano das práticas jurídicas verá o quão dura é a realidade no chão da fábrica. Gente presa por qualquer coisa. Não há uma conscientização no primeiro grau para o não recebimento de acusações sem justa causa. Não há um rigor com as provas ilícitas e com as nulidades processuais. Não há obediência dos precedentes do STF e STJ (lembremos das queixas do ministro Salomão e agora do ministro Dino). É fácil determinar prisões por meio de temporária ou preventiva. Ou negar recorrer em liberdade. Mormente se o réu é pobre. Ainda não conseguimos superar De La Torre Rangel, que dizia: La ley es como la serpiente; solo pica al descalzos.

Se o STF tem de examinar Habeas de furto de pastéis ou caramelos, é porque alguém prendeu mal ou condenou erradamente. E o fiscal da lei deveria ter cuidado disso com mais precaução. Os exemplos são incontáveis. Há até furto de baldes de água que foi parar no STF. Conto o caso: em novembro de 2021, a ConJur noticiou Habeas Corpus deferido pelo ministro Alexandre de Moraes liberando uma mulher do estado de Minas presa há quatro meses por ter furtado água. Emblemáticos. Assim:

1) Um juiz mineiro decretou a preventiva,

2) o Tribunal de Minas considerou a prisão regular,

3) o Superior Tribunal de Justiça negou o HC por ela ser, além de tudo, perigosa e, finalmente,

4) o STF teve que entrar em campo para dizer o óbvio: prender alguém por esse tipo de crime deixaria Sir Coke de cabelos em pé (falo em Coke porque foi citado no belo voto do ministro Alexandre de Moraes).

Bem recentemente há um caso que ilustra melhor ainda o que estou dizendo:

1) sujeito foi condenado à pena de regime semiaberto, com prisão preventiva decretada, portanto, sem direito a recorrer em liberdade (afinal, para essa pena nem cabe preventiva, segundo o STF);

2) TJ-SP negou Habeas Corpus;

3) STJ negou Habeas Corpus:

4) o ministro André Mendonça não conheceu do HC, mas concedeu ordem de ofício (uma jabuticaba , mas, enfim, muito útil). O ministro disse que o Supremo já reconheceu a incompatibilidade da imposição ou manutenção da prisão preventiva se o réu for condenado a uma pena diferente do regime fechado.

5) portanto, se havia precedente (atenção, aqui de novo, o que é isto – um precedente?), por qual razão não é aplicado?

6) sob o império do precedentalismo, cabe perguntar: se o objetivo dos tribunais superiores é fixar teses que se prestam a coisas futuras, qual é a razão de essas coisas futuras se repetirem à exaustão no “sistema”?

Eis as margens do rio (sistema) que comprimem o curso da água (STF e, também, STJ).

Mas, vejamos também a violência das águas.

Com efeito, há uma profunda questão estrutural no sistema de administração da justiça. Como segundo ponto lembro que não basta, em breve, o STF decidir em um determinado caso que, a partir de então, não mais aceitará determinados pedidos de HC (não sei como faria isso, de todo modo). Lembremos do passado (2016): por meio do HC 126.292, de Itapecerica da Serra, o STF fez uma virada na presunção da inocência, da noite para o dia. E isso durou até 2019.

Receio que o STF faça algo desse tipo, ao ler nas entrelinhas a fala do ministro Dino. E disso surge um terceiro ponto: os tribunais superiores não têm o poder de alterar a legislação por meio de julgamentos dos quais extraem-editam uma tese, depois chamada de precedente. Teses não são precedentes (ver aquiaqui, aqui e aqui).

Portanto, a restrição ao direito do Habeas Corpus não pode ser feita sem a intervenção do legislador, locus da discussão genuíno (embora o parlamento “não se ajude muito” nos últimos tempos). A comunidade jurídica não pode simplesmente analisar o problema apenas na ponta de cima. Urge que discutamos os dois andares da jurisdição. A forte jurisprudência defensiva acaba também gerando mais pedidos de Habeas Corpus. De fato, o sistema está em um impasse:

1) existe uma jurisprudência defensiva pelo qual a vagueza da Súmula 7 (STJ) e 279 (STF) permite uma espécie de katchanga real, servindo para admitir ou inadmitir recursos;

2) quando há a inadmissão no tribunal de REsp ou RE, vem a Súmula 182 para ceifar liberdades (lembremos que a Súmula 182 é fruto de julgamento de cédula rural);

3) a Súmula 691 é outro obstáculo – hoje ilegal, mas que continua sendo usada (ler aqui artigo meu com Bheron);

4) outro fator é o número de RHCs, decorrentes de indeferimentos dos tribunais de segunda instância e também do STJ;

5) E o Tema 339/STF – que, em linhas gerais, permite ao julgador a exposição sucinta das razões decisórias – que simplesmente obsta todo e qualquer recurso extraordinário que tenha por objetivo levantar discussão sobre violação ao artigo 93, inciso IX, da Constituição (aí é fácil, certo?). Perceba que este enunciado talvez seja o maior obstáculo dentre todos aqueles nominados. Isso porque, além de, no mais das vezes, ser decidido no próprio tribunal de origem (nem subindo o recurso extraordinário ao seu destinatário final – o STF), trata da cláusula de accountability do Poder Judiciário e da democracia. A forma como se nota, na práxis, a utilização de tal tema praticamente estiola qualquer possibilidade de se levar ao conhecimento do Supremo questões atinentes à violação do dever de fundamentação;

6) Há um acúmulo de processos e um aumento da demanda, mas não há o aumento estrutural do número de ministros e servidores – preferindo o sistema apostar em inteligência artificial, tornando o direito das partes dependente de máquinas.

Dentre estes elencados acima, tantos outros poderiam ser citados para demonstrar que a existência do Habeas Corpus – e a sua ampla veiculação perante os tribunais superiores – em verdade soa como um importante instrumento para superar as barreiras intransponíveis da jurisprudência, que, em nome de uma pretensa eficiência, suprime cada vez mais os direitos fundamentais dos cidadãos.

Há um provérbio latino — Ne nuntium necare (“não mate o mensageiro”) — usado para ilustrar a atitude comum de reis e autoridades da Antiguidade que, ao receberem más notícias, em vez de enfrentarem a realidade ou lidarem com ela, ordenavam a execução do mensageiro. Restringir ainda mais o manejo de habeas corpus pelas partes é fechar os olhos para os sintomas do sistema de administração de justiça criminal brasileiro. É matar o mensageiro.

Voltando à metáfora do rio e das margens que o oprimem, vê-se que não são apenas as margens as responsáveis pela violência das águas; o próprio rio tem o seu grau de responsabilidade.

Portanto, não nos tirem o último bastão do direito, que, aliás, foi o primeiro (tragam-me o corpo, por isso Habeas Corpus). Por isso o chamamos de Remédio Heroico. Deve haver um bom motivo, pois não?

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Representação comercial: avanço da jurisprudência e impactos para empresas

A representação comercial sempre desempenhou um papel relevante no ambiente de negócios brasileiro, servindo, historicamente, como importante força externa de vendas. Há décadas, empresas que atuam no mercado de distribuição, no setor de serviços, no atacado, e em determinados segmentos da indústria, têm utilizado este modelo diante de suas vantagens estratégicas, que vão desde a capilaridade logística, que garante o maior acesso a clientes em localidades diversas, sem a necessidade de uma estrutura própria em cada região, até a capacidade técnica do representante para comercializar produtos e/ou serviços que exigem conhecimento especializado, além, é claro, da redução de custos quando em comparação com a manutenção de uma equipe de vendas interna, lastreada em mão de obra própria.

Apesar da relevância prática, esse protagonismo sempre conviveu com uma legislação peculiar que regulamenta a matéria. A Lei de Representação Comercial, nº 4.886/1965, foi elaborada sob forte influência da legislação trabalhista e, por muitos anos, foi interpretada pelos tribunais sob a premissa de que o representante comercial seria sempre a parte hipossuficiente na relação com a empresa representada e, como tal, dependia com frequência da interferência do Judiciário para reequilibrar as dinâmicas contratuais, o que acabou por conferir ao instituto uma rigidez excessiva e uma proteção desproporcional ao representante, muitas vezes desestimulando a adoção de negócios mais modernos.

Curiosamente, essa rigidez nem sempre beneficiou o próprio representante. Não foram poucos os episódios em que modelos contratuais inovadores, que poderiam trazer ganhos mútuos, deixaram de ser implementados pelo receio das empresas representadas em atrair litígios ou pesadas condenações, de modo que estas empresas, por muito tempo, preferiam não inovar na formatação dos contratos de representação.

O resultado foi uma espécie de congelamento das práticas negociais, em prejuízo tanto das empresas quanto dos representantes.

Atualização nas relações comerciais

Nos últimos anos, contudo, sem prejuízo das regras pétreas da Lei nº 4.886/66, sobre as quais é vedado às partes disporem de forma diversa, ainda que em comum acordo, como por exemplo a obrigatoriedade de pagamento da comissão sobre o valor integral da nota fiscal, considerados inclusive os impostos incidentes, e a vedação de alteração contratual unilateral em prejuízo à média comissional dos últimos seis meses, a jurisprudência tem exercido uma função essencial na atualização das relações contratuais entre empresas e representantes.

Os tribunais têm reconhecido que, em determinados casos, o representante não se enquadra na condição de hipossuficiente, especialmente quando possui estrutura empresarial própria e assessoria jurídica para negociar condições equilibradas. Nessas hipóteses, a jurisprudência vem privilegiando a autonomia privada, permitindo a adoção de dinâmicas contratuais mais adequadas à realidade de cada negócio, conforme assim ajustadas em comum acordo entre as partes. Esse ponto é relevante pois, no passado, era comum que representantes assinassem contratos ou aditivos com condições customizadas e, posteriormente, buscassem a anulação desses documentos sob o argumento de terem sido forçados a aceitar os termos. Hoje, os juízes têm rejeitado esse tipo de alegação quando há elementos que demonstram que o representante tinha efetiva capacidade de negociação no momento da assinatura destas avenças.

Inscrição em conselho regional

Em paralelo, a jurisprudência recente vem consolidando outro entendimento importante. Em litígios envolvendo contratos de representação comercial, os tribunais estaduais vêm reforçando posição já firmada pelo Superior Tribunal de Justiça, que considera que, quando o agente de negócios não estiver inscrito no Conselho Regional de Representantes Comerciais correspondente, a ele não se aplicará o regime jurídico especial da Lei nº 4.886/66, hipótese na qual a relação de agenciamento será regulada pelas regras gerais do Código Civil.

Esse tema é especialmente relevante, pois, com base nessa diferenciação, muitas empresas têm identificado a possibilidade de migrar de modelos tradicionais de representação comercial para outros contratos atípicos, mas que guardam semelhanças com essa mesma estrutura de vendas, sem, contudo, submetê-la à lei especial. Isso amplia a liberdade de negociação, reduz riscos jurídicos e permite que as partes estruturem modelos mais modernos e ajustados às particularidades de cada negócio.

Esse avanço jurisprudencial possui impacto direto na mitigação de riscos e na formatação de contratos mais modernos. Ele afasta a aplicação da indenização legal obrigatória prevista na lei especial em casos de rescisão imotivada pela empresa, garante maior segurança jurídica para a adoção de novos modelos comerciais e estimula a construção de relações negociais mais flexíveis e aderentes à realidade do mercado.

Aproximação da lei com a realidade do mercado

Em um cenário de negócios cada vez mais competitivo, essa evolução abre espaço para que empresas e agentes de negócios possam adotar arranjos contratuais tailor made, ajustados às especificidades de cada setor, sem a insegurança jurídica que antes limitava a inovação.

A jurisprudência tem cumprido papel relevante ao aproximar a lei de representação comercial da realidade do mercado, preenchendo a lacuna deixada pela inércia legislativa. Para as empresas, o momento é propício para revisitar contratos de representação e de agenciamento, avaliando a possibilidade de desenhar modelos mais seguros, modernos e vantajosos.

Para os representantes, a evolução jurisprudencial também traz benefícios ao reconhecer sua capacidade empresarial e de negociação, o que amplia sua autonomia na definição das condições contratuais e possibilita relações mais equilibradas e sustentáveis, além de abrir novas oportunidade de negócios.

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Banco Central lança oficialmente a Pesquisa Firmus após fase-piloto

​O Banco Central (BC) anunciou hoje, durante o Encontro Firmus 2025, realizado em São Paulo, a conclusão da etapa-piloto e o lançamento oficial da Pesquisa Firmus. A iniciativa busca coletar e divulgar projeções dos participantes para diferentes variáveis macroeconômicas – como inflação, PIB e câmbio – em diversos horizontes. Também levanta expectativas quanto ao reajuste dos preços finais e à evolução das margens de resultado. Além das projeções econômicas, a pesquisa contempla temas conjunturais relevantes, como a percepção das empresas brasileiras sobre os impactos da política comercial dos Estados Unidos.

O questionário, inspirado em experiências de outros bancos centrais, foi projetado para ser conciso, permitindo que as empresas respondam sem grande custo de tempo. O levantamento é realizado trimestralmente, com coletas em fevereiro, maio, agosto e novembro. Os resultados são, geralmente, divulgados até o final do mês subsequente à coleta. As respostas são tratadas de forma agregada, garantindo a confidencialidade das informações individuais.

Saiba mais sobre a Pesquisa Firmus neste link.

De acordo com o Presidente do BC, Gabriel Galípolo: “qualitativamente, a Pesquisa Firmus já vem nos oferecendo informações muito valiosas que estão sendo incorporadas na formulação da política monetária. O BC pode contar com esse conjunto de informações mais rico, mais diverso, vindo de quem está com o dedo no pulso da economia e realmente sabendo o que está acontecendo no dia a dia. É muito valioso para a autoridade monetária, e vai sim dar um retorno para a sociedade”.

Na sequência, o Diretor de Política Econômica, Diogo Guillen, ressaltou a importância da Pesquisa Firmus: “A Pesquisa Firmus representa uma aproximação do Banco Central com o setor não financeiro. Nasce da ideia de se ter uma pesquisa de percepção do setor empresarial e representa subsídio muito valioso para a política econômica. Ao ser comparada com o (boletim) Focus, tendo perguntas semelhantes, a gente tenta entender se os setores financeiro e não financeiro têm expectativas semelhantes”.

O evento contou com a presença de representantes de empresas do setor não financeiro, fortalecendo a parceria entre o BC e as participantes da pesquisa.

Os resultados da etapa-piloto indicam que as expectativas de inflação das empresas brasileiras apresentam dinâmica semelhante às projeções medianas divulgadas no Relatório Focus, sugerindo a influência deste na formação das expectativas. Ao mesmo tempo, a Firmus oferece informações que vão além das projeções numéricas, incluindo percepções sobre a situação econômica, expectativas de custos, preços e margens, além de questões especiais sobre temas conjunturais. Esse conjunto de dados amplia a visão oferecida pelo Focus e enriquece o monitoramento da conjuntura econômica.

Veja aqui como foi o Encontro Firmus 2025 no canal do BC no YouTube.

Divulgação dos resultados da etapa-piloto no site do BC
No início desta manhã (29/9), antes da abertura do evento, a instituição disponibilizou os resultados da pesquisa referentes ao terceiro trimestre de 2025, que marcou o encerramento da fase-piloto. 

Uma análise detalhada dos principais resultados consta no boxe Pesquisa Firmus – expectativas e percepções das empresas brasileiras, publicado no Relatório de Política Monetária de setembro de 2025 (disponível aqui).

Representação comercial: avanço da jurisprudência e impactos para empresas

A representação comercial sempre desempenhou um papel relevante no ambiente de negócios brasileiro, servindo, historicamente, como importante força externa de vendas. Há décadas, empresas que atuam no mercado de distribuição, no setor de serviços, no atacado, e em determinados segmentos da indústria, têm utilizado este modelo diante de suas vantagens estratégicas, que vão desde a capilaridade logística, que garante o maior acesso a clientes em localidades diversas, sem a necessidade de uma estrutura própria em cada região, até a capacidade técnica do representante para comercializar produtos e/ou serviços que exigem conhecimento especializado, além, é claro, da redução de custos quando em comparação com a manutenção de uma equipe de vendas interna, lastreada em mão de obra própria.

Apesar da relevância prática, esse protagonismo sempre conviveu com uma legislação peculiar que regulamenta a matéria. A Lei de Representação Comercial, nº 4.886/1965, foi elaborada sob forte influência da legislação trabalhista e, por muitos anos, foi interpretada pelos tribunais sob a premissa de que o representante comercial seria sempre a parte hipossuficiente na relação com a empresa representada e, como tal, dependia com frequência da interferência do Judiciário para reequilibrar as dinâmicas contratuais, o que acabou por conferir ao instituto uma rigidez excessiva e uma proteção desproporcional ao representante, muitas vezes desestimulando a adoção de negócios mais modernos.

Curiosamente, essa rigidez nem sempre beneficiou o próprio representante. Não foram poucos os episódios em que modelos contratuais inovadores, que poderiam trazer ganhos mútuos, deixaram de ser implementados pelo receio das empresas representadas em atrair litígios ou pesadas condenações, de modo que estas empresas, por muito tempo, preferiam não inovar na formatação dos contratos de representação.

O resultado foi uma espécie de congelamento das práticas negociais, em prejuízo tanto das empresas quanto dos representantes.

Atualização nas relações comerciais

Nos últimos anos, contudo, sem prejuízo das regras pétreas da Lei nº 4.886/66, sobre as quais é vedado às partes disporem de forma diversa, ainda que em comum acordo, como por exemplo a obrigatoriedade de pagamento da comissão sobre o valor integral da nota fiscal, considerados inclusive os impostos incidentes, e a vedação de alteração contratual unilateral em prejuízo à média comissional dos últimos seis meses, a jurisprudência tem exercido uma função essencial na atualização das relações contratuais entre empresas e representantes.

Os tribunais têm reconhecido que, em determinados casos, o representante não se enquadra na condição de hipossuficiente, especialmente quando possui estrutura empresarial própria e assessoria jurídica para negociar condições equilibradas. Nessas hipóteses, a jurisprudência vem privilegiando a autonomia privada, permitindo a adoção de dinâmicas contratuais mais adequadas à realidade de cada negócio, conforme assim ajustadas em comum acordo entre as partes. Esse ponto é relevante pois, no passado, era comum que representantes assinassem contratos ou aditivos com condições customizadas e, posteriormente, buscassem a anulação desses documentos sob o argumento de terem sido forçados a aceitar os termos. Hoje, os juízes têm rejeitado esse tipo de alegação quando há elementos que demonstram que o representante tinha efetiva capacidade de negociação no momento da assinatura destas avenças.

Inscrição em conselho regional

Em paralelo, a jurisprudência recente vem consolidando outro entendimento importante. Em litígios envolvendo contratos de representação comercial, os tribunais estaduais vêm reforçando posição já firmada pelo Superior Tribunal de Justiça, que considera que, quando o agente de negócios não estiver inscrito no Conselho Regional de Representantes Comerciais correspondente, a ele não se aplicará o regime jurídico especial da Lei nº 4.886/66, hipótese na qual a relação de agenciamento será regulada pelas regras gerais do Código Civil.

Esse tema é especialmente relevante, pois, com base nessa diferenciação, muitas empresas têm identificado a possibilidade de migrar de modelos tradicionais de representação comercial para outros contratos atípicos, mas que guardam semelhanças com essa mesma estrutura de vendas, sem, contudo, submetê-la à lei especial. Isso amplia a liberdade de negociação, reduz riscos jurídicos e permite que as partes estruturem modelos mais modernos e ajustados às particularidades de cada negócio.

Esse avanço jurisprudencial possui impacto direto na mitigação de riscos e na formatação de contratos mais modernos. Ele afasta a aplicação da indenização legal obrigatória prevista na lei especial em casos de rescisão imotivada pela empresa, garante maior segurança jurídica para a adoção de novos modelos comerciais e estimula a construção de relações negociais mais flexíveis e aderentes à realidade do mercado.

Aproximação da lei com a realidade do mercado

Em um cenário de negócios cada vez mais competitivo, essa evolução abre espaço para que empresas e agentes de negócios possam adotar arranjos contratuais tailor made, ajustados às especificidades de cada setor, sem a insegurança jurídica que antes limitava a inovação.

A jurisprudência tem cumprido papel relevante ao aproximar a lei de representação comercial da realidade do mercado, preenchendo a lacuna deixada pela inércia legislativa. Para as empresas, o momento é propício para revisitar contratos de representação e de agenciamento, avaliando a possibilidade de desenhar modelos mais seguros, modernos e vantajosos.

Para os representantes, a evolução jurisprudencial também traz benefícios ao reconhecer sua capacidade empresarial e de negociação, o que amplia sua autonomia na definição das condições contratuais e possibilita relações mais equilibradas e sustentáveis, além de abrir novas oportunidade de negócios.

Fonte: Conjur

Comissão aprova regulamentação de julgamento de controle de constitucionalidade no STF

A Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ) da Câmara dos Deputados aprovou projeto de lei que regulamenta o regime jurídico das ações de controle concentrado no Supremo Tribunal Federal (STF). Aprovada em caráter conclusivo, a proposta seguirá para o Senado, a menos que haja recurso para análise pelo Plenário da Câmara.

O texto aprovado é a versão do relator, deputado Alex Manente (Cidadania-SP), para o Projeto de Lei 3640/23, do deputado Marcos Pereira (Republicanos-SP). A proposta original foi baseada em anteprojeto de uma comissão de juristas presidida pelo ministro Gilmar Mendes, do STF.

“São importantes e salutares inovações legislativas, que aperfeiçoam o modelo de fiscalização abstrata e concentrada de constitucionalidade”, disse Alex Manente. O relator fez várias mudanças no projeto, incorporando sugestões técnicas e outros ajustes, mas mantendo o objetivo de regulamentar:

• a ação direta de inconstitucionalidade (ADI);
• a ação direta de inconstitucionalidade por omissão (ADO);
• a ação declaratória de constitucionalidade (ADC); e
• a arguição de descumprimento de preceito fundamental (ADPF).

Principais mudanças
Entre outros pontos, o substitutivo aprovado determina que o julgamento desses quatro tipos de ações deverá ocorrer em até 12 meses após a distribuição, com possibilidade de prorrogação justificada.

O texto reforça a exigência de quórum qualificado (2/3 dos ministros) para a modulação dos efeitos das decisões do STF, diferentemente da proposta original, que previa apenas maioria simples.

Outra mudança determina que os ministros do STF deverão justificar as decisões monocráticas (aquelas proferidas por um único integrante da Corte), submetendo o parecer à análise do plenário já na sessão seguinte. Caso contrário, a decisão monocrática se tornará nula.

A proposta também define prazos para manifestações da Advocacia-Geral da União e da Procuradoria-Geral da República, além de critérios para audiências públicas e admissão de amici curiae (outros interessados em um determinado processo).

Alex Manente rejeitou todas as emendas apresentadas, por considerá-las inconstitucionais ou incompatíveis com a técnica legislativa. Apresentaram votos em separado os deputados Laura Carneiro (PSD-RJ) e Hildo Rocha (MDB-MA).

Fonte: Câmara dos Deputados

Enfam promove palestras sobre desafios da Justiça em áreas de fronteira

A Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados (Enfam) vai realizar, no dia 7 de outubro, das 9h às 12h, palestras sobre o tema “Jurisdição em Fronteiras”. O encontro ocorrerá na sede da escola, em Brasília, e será aberto ao público mediante inscrições, disponíveis no EducaEnfam.

O evento marca o segundo encontro presencial da primeira turma do curso de especialização em Jurisdição em Fronteiras, oferecido pela Enfam. O objetivo da formação é capacitar magistrados em competências específicas que lhes permitam oferecer respostas jurisdicionais mais rápidas, justas e adequadas às realidades fronteiriças. Espera-se que, ao final do curso, atuem como multiplicadores de conhecimento e promovam práticas inovadoras em suas respectivas jurisdições, fortalecendo o Estado de Direito e a cidadania nessas localidades estratégicas.

As áreas de fronteira enfrentam desafios multifacetados que impactam diretamente a segurança pública, a economia e os direitos humanos. Questões como criminalidade transnacional, tráfico de drogas e armas, contrabando, fluxos migratórios, disputas por recursos naturais e a proteção de povos originários exigem uma atuação judicial altamente especializada e sensível às particularidades locais. A formação contínua de magistrados sobre esses temas é fundamental para garantir a soberania nacional e proporcionar uma justiça efetiva e acessível para as populações que vivem nessas regiões.

Fonte: STJ

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LIFT Learning aposta em tokenização de ativos sustentáveis no mercado global

Oferecer ao mercado global novas alternativas de investimento em projetos sustentáveis brasileiros é o desafio do LIFT Learning deste ano. As empresas Vert Capital e Gnosis, idealizadores e patrocinadores deste projeto, junto com pesquisadores da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), estudam como desenvolver uma infraestrutura regulatória e tecnológica para a emissão e negociação de ativos reais tokenizados (RWAs) sustentáveis, alinhadas às exigências do mercado internacional.

O grupo realiza a pesquisa desde maio e deve apresentar resultados em novembro. A iniciativa é coordenada pelo Banco Central (BC), orientador regulatório e estratégico, e pela Federação Nacional de Associações dos Servidores do Banco Central (Fenasbac), coordenadora do projeto e do ecossistema do Laboratório de Inovações Financeiras Tecnológicas (LIFT), tendo a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) como participante convidada.

A representante do BC, Viviane Helena Torinelli, diz que o projeto vem sendo acompanhado por várias unidades da autarquia (departamentos de Informática – Deinf; de Operações Bancárias e de Sistema de Pagamentos – Deban; de Regulação Prudencial e Cambial – Dereg; de Regulação, Supervisão e Controle das Operações do Crédito Rural e do Proagro – Derop; e a Gerência de Relacionamento com Investidores Internacionais de Portfólio – Gerip).

“A iniciativa do RWA Sustentável está alinhada com outros esforços da instituição, em conjunto com o sistema financeiro e a comunidade de inovação, para estimular a inovação financeira e tecnológica para a sustentabilidade”, disse Viviane Helena Torinelli,  da Gerência de Sustentabilidade e de Relacionamento com Investidores Internacionais de Portfólio (Gerip), do Banco Central (BC).

​O que é o projeto?

O objetivo é desenvolver uma infraestrutura tecnológica e operacional, com respectivas sugestões de ajustes regulatórios, que viabilize a compra dos instrumentos financeiros Cédula de Produto Rural (CPR) e Certificado de Recebíveis do Agronegócio (CRA) verdes tokenizados por investidores estrangeiros, direcionando recursos para projetos rurais sustentáveis.

A meta é que os ativos possam ser emitidos, liquidados e negociados via blockchain pública, com compliance regulatório, rastreabilidade ambiental e interoperabilidade global.

A estruturação dos ativos RWA Sustentável prevê incorporação de práticas reconhecidas mundialmente, como sequestro de carbono e emissões evitadas, certificação e validação de práticas agrícolas sustentáveis e relatórios de impacto ambiental em tempo real.

De acordo com Danielle Teixeira, líder de inovação aberta da Fenasbac: “O projeto foi selecionado por abordar o desafio real de tornar o Brasil mais competitivo no mercado internacional de finanças sustentáveis”.

Segundo ela, ao incluir critérios ambientais reconhecidos internacionalmente na solução desenvolvida de forma estrutural, a pesquisa aplicada da atual edição do LIFT Learning busca proporcionar mais liquidez ao mercado brasileiro e mais competitividade aos ativos nacionais em mercados globais. Um dos efeitos esperados é fortalecer o acesso de produtores rurais sustentáveis ao crédito.

Frentes regulatórias e tecnológicas

O projeto será desenvolvido em dois grupos paralelos: um focado nas discussões tecnológicas e de negócios, e outro nas discussões regulatórias, de governança e sustentabilidade. Nesta frente, os pesquisadores analisam experiências de outros países, como Suíça, Estados Unidos, Singapura, Hong Kong e Emirados Árabes, além das da União Europeia.

A frente tecnológica, explica a líder da Fenasbac, irá explorar a padronização de tokens com critérios de sustentabilidade e a implementação de contratos inteligentes utilizando a infraestrutura da Gnosis (Ethereum). O foco estará na programabilidade de regras ambientais, auditoria automatizada e integração com os padrões do Drex.

Para garantir o alinhamento do desenvolvimento e fazer pontes entre as discussões, pessoas-chave da PUC-Rio, VERT, Gnosis, BCB, CVM e Fenasbac farão parte de ambos os grupos. 

O que é o LIFT?

O LIFT é um laboratório virtual que promove protótipos de inovação financeira e tecnológica, coordenado pela Fenasbac e o BC, com o objetivo de fomentar projetos de pesquisa de inovação relacionados à indústria financeira. O laboratório conta com as seguintes parcerias: Microsoft, IBM, AWS, Cielo, R3, Multiledgers e Instituto Fenasbac.

No LIFT Day 2025, o Presidente do BC, Gabriel Galípolo, lembrou que, em 2019, um ano após a sua criação, o LIFT recebeu o prêmio da Central Bank Banking Publications como a iniciativa de experimentação mais inovadora do mundo. Em 2023, outro reconhecimento: um dos melhores laboratórios de inovação do mundo pela Global Finance Magazine.

“O LIFT Learning vem atuando na capacitação de profissionais e disseminação do conhecimento sobre temas como blockchain, interoperabilidade, privacidade, finanças descentralizadas, inteligência artificial e sustentabilidade, sempre com aplicação prática e visando as necessidades da sociedade”, destacou Galípolo.

Fonte: BC

STF julgará vínculo trabalhista de motoristas e entregadores

O Supremo Tribunal Federal (STF) marcou para a próxima quarta-feira (1°) o início do julgamento sobre o reconhecimento de vínculo empregatício entre entregadores e motoristas de aplicativos e as plataformas digitais. A controvérsia é conhecida como uberização das relações de trabalho.

A decisão a ser tomada pela Corte terá impacto em 10 mil processos que estão parados em todo o país à espera do posicionamento do plenário.

Serão julgadas duas ações que são relatadas pelos ministros Edson Fachin e Alexandre de Moraes e chegaram ao Supremo a partir de recursos protocolados pelas plataformas Rappi e Uber.

Contestação

As empresas contestam decisões da Justiça do Trabalho que reconheceram o vínculo empregatício com os motoristas e entregadores.

A Rappi alegou que as decisões trabalhistas que reconheceram o vínculo de emprego com a empresa desrespeitaram posição da própria Corte que entende não haver relação de emprego formal com os entregadores.

A Uber sustentou que é uma empresa de tecnologia, e não do ramo de transportes, e que o reconhecimento de vínculo trabalhista altera a finalidade do negócio da plataforma, violando o princípio constitucional da livre iniciativa de atividade econômica.

Além das defesas das plataformas, os ministros vão ouvir durante o julgamento as sustentações orais de entidades que defendem o reconhecimento do vínculo trabalhista de motoristas e entregadores.

O julgamento sobre a uberização será a primeira pauta do plenário sob o comando do ministro Edson Fachin, que será empossado no cargo de presidente do STF na próxima segunda-feira (29). Ele sucederá o ministro Luís Roberto Barroso, que encerrará mandato de dois anos à frente do tribunal. 

Fonte: EBC

Projeto que torna facultativo o uso de biometria facial é aprovado

A Comissão de Comunicação da Câmara dos Deputados aprovou o Projeto de Lei 2379/25, que garante ao cidadão a escolha de identificação por outro meio que não seja a biometria facial, exceto nos casos obrigatórios por lei.

Pela proposta, a negativa de acesso à biometria facial não poderá ser motivo de recusa do acesso a serviços em ambientes físicos ou digitais, podendo o cidadão se identificar por outras modalidades.

O texto determina ainda que as plataformas digitais deverão apresentar de forma explícita e visível a possibilidade de uso de outros dados biométricos.

O projeto, do deputado Fabio Schiochet (União-SC), foi aprovado por recomendação do relator, deputado Marangoni (União-SP).

O relator observou que a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais veda a imposição de fornecimento de dados sensíveis para acesso a direitos. Esses dados, disse ainda, podem ser utilizados para o cometimento de fraudes.

“O projeto está bem alicerçado ao garantir que, salvo imposição legal expressa, o uso de biometria facial seja facultativo, com possibilidade de um meio alternativo de identificação, essencial para preservar a privacidade e prevenir coação”, defendeu o relator.

Próximos passos
O projeto ainda será analisado, em caráter conclusivo, pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania.

Fonte: Câmara dos Deputados

STJ afasta dois modelos simultâneos de base de cálculo para ICMS

A 1ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu, por unanimidade, que os estados não podem adotar de forma simultânea dois modelos de base de cálculo presumida para o ICMS na sistemática da substituição tributária. O entendimento foi fixado no julgamento de recurso da Ambev S.A. contra auto de infração lavrado pelo fisco paulista para a cobrança de cerca de R$ 258 mil de ICMS relativos ao período de julho a dezembro de 2009.

No caso em discussão, a controvérsia girava em torno da utilização, pela empresa, do Preço Médio Ponderado ao Consumidor Final (PMPF) como base de cálculo presumida. O estado de São Paulo defendia que, quando o valor da operação própria do contribuinte superasse o previsto na tabela estadual, deveria prevalecer a Margem de Valor Agregado (MVA).

Para o relator, ministro Gurgel de Faria, a Portaria CAT 111/2009 extrapolou os limites da Lei Kandir (LC 87/1996), que estabelece as normas gerais para o ICMS. “Não existe autorização na LC para adoção simultânea de dois modelos de base de cálculo presumida em face do preço da mercadoria praticado pelo substituto”, afirmou.

De acordo com o relator, o valor a ser considerado como PMPF “deve espelhar a média ponderada dos preços praticados, de modo que a prática de preços menores ou maiores é o próprio objeto de estudo para fixação desse valor médio, portanto, não pode servir como parâmetro para o afastamento desse modelo”.

O processo tramita como recurso especial (RESp) 2139696/SP.

Fonte: Jota

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